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ELEIÇÕES 2006/PRESIDÊNCIA
Debate sobre trunfos e debilidades da política econômica é marcado por truques estatísticos
FHC e PT usam dados parciais em disputa sobre a economia
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O recente acirramento do duelo
verbal entre PT e PSDB começa a
pôr em evidência o que deverá
ser, ao lado das acusações mútuas
de corrupção, o mote da campanha eleitoral deste ano: a disputa
pelos resultados da economia, repleta de dados parciais e truques
estatísticos.
O site do PT na internet
(www.pt.org.br) publicou com
destaque um artigo do economista João Felício Quirino, intitulado
"O nosso governo e o deles", comparando as gestões Luiz Inácio
Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso -ou, mais exatamente, comparando o melhor do
primeiro com o pior do segundo.
Do lado tucano, o próprio ex-presidente FHC tratou de torturar
os números em sua entrevista de
anteontem ao programa "Roda
Viva", da TV Cultura, quando
tentou, ao mesmo tempo, assumir os créditos pela política econômica e criticar sua gestão pelos
adversários petistas.
Para os leigos, o embate pode
encobrir o que é óbvio para os
especialistas: as administrações
Lula e FHC adotaram, em sua
essência, os mesmos diagnósticos
e as mesmas diretrizes econômicas da ortodoxia liberal -e, apesar do desconforto com o abandono de teses do passado, não
há sinal de propostas diferentes
para o futuro.
A saída tem sido relegar a segundo plano os debates sobre
modelos econômicos e privilegiar
a comparação de resultados e supostos méritos administrativos de
gestão. E aí o espaço é farto para a
manipulação de números.
"Durante o governo do PSDB, a
carga tributária bruta subiu de
29,5% para 35,5% do PIB, entre
1994 e 2002, ficando em 34,9% em
2003", escreve o petista Quirino,
repetindo a tese do ministro Antonio Palocci (Fazenda) de que a
expansão dos impostos foi freada.
Convenientemente, a comparação não menciona o resultado de
2004, no governo Lula, quando a
carga tributária atingiu o maior
patamar da história -35,9% do
PIB. Sabe-se também que houve
novo crescimento em 2005, embora o dado oficial ainda não tenha sido divulgado.
Também falando das finanças
públicas, rebate FHC: "Nunca se
pagou tanto juro no Brasil: 2,8 vezes do que os meus três [primeiros] anos de governo" -o que só
é verdadeiro numa imprópria
comparação de valores em reais.
Em percentuais do Produto Interno Bruto, não há diferença relevante entre as despesas com juros
de tucanos e petistas.
Cálculo eleitoral
As estratégias dos dois grupos
que encabeçam desde 1994 a disputa pelo poder no país se baseiam no cálculo eleitoral. Pelo lado de Lula, seus aliados contam
com pesquisas que demonstram
o apelo da melhora de indicadores diretamente ligados ao bem-estar da população.
"Em suma, no governo Lula o
país cresceu mais, o desemprego
caiu, criaram-se mais postos de
trabalho formais", prega o texto
do site petista.
"Porque ele copia a minha política. Ele era contra, todo o PT, e fizeram a mesma coisa", respondeu FHC a uma afirmação semelhante, no "Roda Viva".
Ontem, em São Paulo, FHC voltou a dizer que Lula colhe hoje o
que foi plantado na sua administração. "Hoje eles [atual governo]
estão sabendo que os louros que
colhem são aqueles que vêm do
que foi plantado no passado."
Além de bater na tecla do "estelionato eleitoral" de Lula, os tucanos insistem que os dados mais
favoráveis dos últimos anos se devem à continuidade das políticas
que introduziram e a um cenário
internacional mais favorável.
"A economia brasileira cresceu
no ano passado 2,4%, enquanto o
mundo está muito favorável. Eu
peguei o mundo muito negativo.
Esse mundo é muito favorável, e
apesar disso nós não estamos respondendo na velocidade necessária", afirma FHC.
O economista petista, que escreveu seu texto antes da declaração
do ex-presidente tucano, antecipa
a resposta: "Ora, se a conjuntura
internacional favorável diminui
os méritos do atual governo, o
mesmo deveria ser feito em relação à estabilização de preços propiciada pelo Plano Real".
Afinal, argumenta, o Brasil e outros países emergentes se aproveitaram da abundância de capitais
da primeira metade dos anos 90
para valorizar suas moedas e debelar a inflação.
E os dois lados correm o risco de
convencer o eleitor de que os feitos que alardeiam não são mesmo
tão singulares.
Colaborou a Reportagem Local
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