|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Comissão de SP reconhece feto como preso político
João Grabois estava na barriga da mãe torturada em 72 e levou indenização de R$ 22 mil
Decisão foi da Comissão de Ex-Presos Políticos de SP, que aplicou pena mínima;
Grabois recorreu e quer valor máximo, de R$ 39 mil
FLÁVIA MARREIRO
DA REPORTAGEM LOCAL
Pela primeira vez, a Comissão Estadual de Ex-Presos Políticos de São Paulo reconheceu
um feto como preso político e
vítima de tortura pela ditadura
militar (1964-1985).
Trata-se de João Carlos Grabois, filho da ex-guerrilheira
Criméia Grabois. Em dezembro de 1972, depois de voltar da
região do Araguaia, grávida de
sete meses, Criméia foi presa e
levada para o DOI-Codi, em
São Paulo. Segundo relatos de
testemunhas e dela própria, foi
torturada. Em janeiro, foi
transferida para Brasília.
Na próxima terça-feira, 13,
fará 35 anos que, num hospital
militar de Brasília, o filho de
Criméia nasceu. É na terça
também que João Carlos deve
assistir ao julgamento de um
recurso movido por ele na Comissão de Ex-Presos Políticos.
João Carlos pede na ação que
o Estado seja condenado com
"pena máxima" pelas torturas
sofridas por ele -ainda na barriga da mãe-, em reação a uma
decisão da comissão de 2004.
À época, a sentença determinou que João Carlos tinha direito a uma indenização de R$
22 mil, valor mínimo pago pela
comissão. No julgamento da
próxima terça, os integrantes
da instância decidirão se ele
têm direito à indenização máxima, de R$ 39 mil.
"Entendo que o fruto do concepto de sete meses de gestação
deve ser reconhecido como
preso político da ditadura militar e pelas torturas sofridas no
período de sua vida intra-útero
que lhe resultaram transtornos
psicológicos", diz trecho do parecer de 2004, de autoria de
Henrique Carlos Gonçalves, representante do Conselho Regional de Medicina de São Paulo na comissão estadual.
Para Criméia Grabois, o recurso é importante porque toca
no que crer ser um equívoco: o
escalonamento de valores indenizatórios pagos a vítimas.
Para se fixar os valores, leva-se em conta "os resultados lesivos, tais como invalidez permanente ou morte, transtornos
psicológicos, invalidez parcial
ou qualquer tipo de seqüelas".
"Quando a gente valoriza o
que foi mais e o que foi menos
torturado parece estar defendendo a tortura perfeita, do
ponto de vista do Estado, aquela que é mais difícil de provar. É
muito cruel você medir o sofrimento do outro. Não podia haver esse escalonamento. As indenizações deveriam ter valor
único", explica Grabois.
O revisor do caso na comissão, o advogado Idibal Pivetta,
defende, em parecer que apresentará no dia 13, a "pena máxima". "O Estado deve ser condenado no máximo que a lei permite para que essa decisão sirva
de exemplo", escreve ele, que é
do Condeph-SP (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos
da Pessoa Humana).
A Folha tentou falar ontem,
sem sucesso, com João Carlos.
Segundo a mãe, por conta da
prisão dela, ele também ficou
desnutrido. "Eles o traziam para amamentá-lo quando queriam." Como seqüela, ele tem
um "afundamento no peito".
Criméia Grabois relata a participação direta de Carlos Alberto Brilhante, Ustra, hoje coronel reformado do Exército,
na tortura. Ela é uma das cinco
pessoas -todas da mesma família- que movem uma ação
civil contra Ustra. Ele comandou o DOI-Codi de São Paulo
de 1970 a 1974. A ação civil é
declaratória: não implica pena
ou indenização pecuniária.
Ustra nega as acusações e
afirma que, caso de torturas
não chegaram a seu conhecimento. Sobre o caso de Grabois, ele diz que ela teve o filho
em Brasília, com apoio e assistência, e recebeu enxoval de
mulher de um militar.
Texto Anterior: Diplomacia: Brasileiros não terão prazo maior, afirma fisco dos EUA Próximo Texto: Frase Índice
|