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JANIO DE FREITAS
Avanços indefesos
Se for para a desmilitarização do controle aéreo
reproduzir o desastre do Ministério da Defesa, é
melhor que não ocorra até novas circunstâncias
O MINISTÉRIO da Defesa,
velhíssima sugestão
lógica e modernizadora que o Brasil não conseguia
adotar, foi introduzido em
1999 por pressão de militares
e governo dos Estados Unidos, esta última levada a Fernando Henrique Cardoso pelo próprio Bill Clinton. Tal informação, antes sujeita a inevitáveis contestações e vulnerável por falta absoluta de recursos comprovatórios (exceto depoimentos, que no governo passado ninguém daria), recebeu o visto de saída
desde que um brigadeiro reformado, em considerações
sobre a crise atual, fez-lhe
brevíssima e ocasional referência. Além do mais, gravada, embora não se duvide de
que o autor a confirmasse, se
necessário.
Os antecedentes da extinção do anacronismo brasileiro, com quatro ministros militares quando o mundo praticava a eficiente unidade,
projetaram na oficialidade
superior o sentimento duradouro de uma imposição, só
admitida em razão de sua origem. O que daí decorreu foi a
mudança da formalidade, na
aparência inexpressiva dos
organogramas, mas não a da
velha realidade.
Repetem-se, em diferentes
proporções, dois episódios de
resistências: quando da criação do Ministério da Aeronáutica, com a retirada da
aviação do Exército, e, mais
tarde, a mútua recusa da Aeronáutica à aviação da Marinha e, da Marinha, a aviões e
pilotos da FAB no porta-aviões. Muito tempo, muito
dinheiro público e, ainda pior,
muita ilegalidade impune fizeram essa história ainda não
contada. O primeiro caso só
começou a resolver-se por
causa da Segunda Guerra,
nem por isso conseguindo,
porém, evitar que a brilhante
esquadrilha da FAB no front
europeu sofresse até boicotes
montados no Brasil. O segundo caso começou a resolver-se, e a rigor ainda não terminou, por intervenção do general Castello Branco já na ditadura.
O Ministério da Defesa traria nova realidade se houvesse empenho nesse sentido. Os
ministros da pasta não têm
como superar a insubordinação branca se não contarem
com providências do presidente da República. Fernando Henrique e Lula, no entanto, igualam-se também na
preferência por fazer os militares crerem que jamais se
opuseram a eles, sempre
acreditaram no seu patriotismo democrático, consideram
as casernas os alicerces da nação, e tome de condecorações
para lá e para cá. Há três dias,
Lula pespegou mais condecorações nos comandantes, como prosseguimento à série
que, com explicitude menor e
diferente destinação, é idêntica ao ato dos controladores
dirigido à população.
A desmilitarização do controle aéreo segue os casos de
criação dos ministérios da
Aeronáutica e da Defesa. Não
é à toa que o controle civil vigora há muito tempo no exterior com os melhores resultados. Desconectado de particularidades e sigilos da aviação militar, com maior arejamento de concepção e menor
rigidez funcional, o controle
civil é comprovado avanço.
Em considerações restritas
ao caso brasileiro, não são necessárias mais demonstrações de que o desempenho da
FAB no controle, para dizer
pouco, faliu. Faliu, como certos bancos, com escândalo.
Em empreendimento que
historicamente nem foi do
Ministério da Aeronáutica. O
serviço básico de controle aéreo nacional, estações meteorológicas por quase todo o
território, radiofonia e apoio
foi montado pela Panair, à sua
custa, e generosamente aberto, inclusive, para suprir a carência então total da FAB. O
controle atual é prosseguimento do controle e demais
serviços tomados da Panair
na primeira fase da ditadura.
Até que um presidente da
República seja capaz de dar
ao Ministério da Defesa o
sentido que o justifique, os
problemas de insubordinação branca, de despreparo e
de exigências vão continuar
produzindo suas consequências, seja sobre a vida social ou
a institucional. Por isso mesmo, são mal informados e injustos os pedidos de demissão
do ministro Waldir Pires, nos
quais tantos jornalistas insistem. Ele vem lutando para ter
o poder que lhe cabe, mas tem
pela frente barragem audaciosa e, por trás, falta de chão
sólido. Tal como aconteceu ao
primeiro e promissor nomeado para o posto por Lula, o
embaixador José Viegas.
Se for para a desmilitarização reproduzir o desastre do
Ministério da Defesa, é melhor que não ocorra até novas
circunstâncias. Quase diria
que é melhor, para a tranquilidade no céu e na terra, nem
haver esse descontrolado
controle aéreo.
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