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São Paulo, domingo, 08 de junho de 2003

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ÍNDIOS

Líderes indígenas e religiosos criticam proposta que pode tornar obrigatória consulta ao Conselho de Defesa Nacional

Lula estuda mudar demarcação de terras

RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL

O GSI (Gabinete de Segurança Institucional) do presidente Luiz Inácio Lula da Silva formulou uma proposta de alteração do decreto que trata da demarcação de terras indígenas no país tornando obrigatória a consulta ao Conselho de Defesa Nacional antes da decisão presidencial.
A proposta está sendo criticada por indigenistas e líderes indígenas, que a consideram um retrocesso. Lula já vem adotando essa sistemática, hoje facultativa, mas agora surgiu a possibilidade de torná-la obrigatória.
A minuta do decreto foi enviada ao gabinete do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, que deverá dar uma opinião antes do envio ao presidente.
Na exposição de justificativas do decreto, à qual a Folha teve acesso, o Gabinete de Segurança Institucional alega que a mudança é necessária nos processos que envolvam áreas indígenas na faixa de fronteira, para cumprir disposto na Constituição Federal.
Mas, no texto final da minuta, o tema da faixa fronteiriça desaparece, levando a crer que a medida possa ser estendida a todos os outros processos de demarcação de áreas indígenas.
O presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio), Eduardo de Almeida, disse ser contrário à mudança no decreto. "Não vejo necessidade de complicar [o processo de homologação]. Pelo contrário, é preciso facilitá-lo", disse.
O ministro Thomaz Bastos enviou à Funai, para manifestação, a minuta de decreto formulada pelo Gabinete de Segurança Institucional. De acordo com Almeida, a resposta será contrária ao andamento da minuta de decreto.

Direitos indígenas
O Cimi (Conselho Indigenista Missionário) emitiu nota pública classificando a tentativa de alteração das regras atuais de "os caminhos de mais um golpe contra os direitos indígenas".
"É espantoso observar a desfaçatez de tal proposta, sobretudo diante do emperramento das demarcações já provocado pelo decreto 1.775/96 [baixado no governo de Fernando Henrique Cardoso, sob críticas dos indigenistas]", afirma a nota.
O Cimi, que tem cerca de 400 missionários no país, diz que "pelo espírito da proposta, trata-se mesmo de uma volta ao passado, recrudescendo mais ainda as agressões contra os povos indígenas no Brasil".
Se a proposta for aprovada, os processos terão de ser submetidos, para análise e voto, aos integrantes do Conselho de Defesa Nacional, presidido pelo próprio Lula e formado pelo vice-presidente da República, pelos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, pelos ministros da Defesa, da Justiça, do Planejamento e das Relações Exteriores e pelos comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica.

Homologações
Há hoje pelo menos 11 processos de demarcação de área indígena prontos para serem homologados pelo presidente, de acordo com levantamento da organização não-governamental ISA (Instituto Socioambiental).
O mais aguardado é o da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol, de 1,75 milhão de hectares, em Roraima. Tecnicamente, nada impede que Lula assine o decreto. O ministro Thomaz Bastos fará uma viagem à área na terça.
O governador Flamarion Portela, contrário à demarcação na forma pretendida pelos índios (ele defende a demarcação descontínua da área, deixando intocados estradas, fazendas e aglomerados urbanos de não-índios), filiou-se em março ao PT. O presidente do Cimi, dom Gianfranco Masserdotti, acusou-o de vincular a filiação à demora na homologação.



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