São Paulo, sexta-feira, 08 de novembro de 2002

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TRANSIÇÃO

Presidente eleito afirma que Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social não será "clube de amigos"

Problema do país é político, afirma Lula

DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social não será um "clube de amigos". Durante fala a empresários e sindicalistas ontem, disse que o problema brasileiro é "mais político que econômico".
Declarou que se desafiou a montar um ministério em que a imprensa não divulgue nomes antes de ele efetivar as indicações e quis dividir responsabilidades: "Na campanha, eu dizia que não tenho o direito de errar. Agora quero compartilhar isso com vocês: não temos o direito de errar", afirmou. (PLÍNIO FRAGA)

DIMENSÃO DO PACTO - "Possivelmente, nenhum de nós tenha a dimensão exata do que pode significar para o Brasil e para a América do Sul o gesto que estamos iniciando. Pode servir de ensinamento que é possível a convivência democrática na adversidade. Ninguém perguntou a nenhum dos presentes se pertence ou se gosta de partido político. Isso aqui não pode ser considerado um clube de amigos. Pode se transformar numa instituição, mesmo que consultiva, que poderá produzir uma quantidade de soluções que nunca a sociedade teve oportunidade de produzir."

LEIS - "No Brasil, há leis que pegam e que não pegam, principalmente na parte tributária. Os únicos beneficiários de algumas leis são os advogados tributaristas, que ganham muito dinheiro para não permitir que uma lei funcione. Em vez de fazer uma lei assim, é melhor discutir antes."

DÚVIDAS - "Este encontro aqui é mais importante ainda porque as pessoas têm dúvidas. É maravilhoso que tenhamos vindo para esta reunião sem que tivéssemos cada um de nós definido claramente o que fará o conselho, os assuntos que serão discutidos. Porque isso significaria que alguém tinha feito o que já não havia dado certo."

COMPONENTES - "Não sabemos e não vamos nos balizar nas experiências do exterior. Se na França são 231 integrantes, o nosso conselho pode ter 60, 70, 80 ou 90 e, com o tempo, a gente vai descobrir se foi de mais ou de menos."

CONSELHO - "Não podemos transformar o conselho num habituê de reuniões e porque daqui a pouco as pessoas se cansam. Por isso tem de ser chamado apenas em momentos realmente importantes. A iniciativa de convocação pode ser tanto do presidente quanto do conselho. O conselho não deve se confundir com o pacto social. A sabedoria indica que o conselho deve ter uma avaliação da proposta de pacto. Não vamos fazer nenhuma votação e escolher nomes. Vamos escolher nomes, tentando selecionar o que cada um de vocês representa, numa linha plural, com um número razoável de pessoas, para que haja reuniões produtivas. Para evitar algo que se transforme em assembléias permanentes, se não tão pequena, mas não tão grande. Vamos começar a funcionar desde já. Não temos de esperar a posse."

ESPECULAÇÃO DE NOMES - "A imprensa começou a indicar nomes. É engraçado. Se não tomar cuidado, a imprensa monta o governo. Indica ministro, tira ministro. Para evitar isso, resolvemos mudar a equipe de transição. Resolvemos indicar um coordenador e um adjunto, que se cercarão de um agrupamento de técnicos que não têm poder para tomar nenhuma decisão política, mas de apenas tirar radiografia de cada área administrativa do governo."

MINISTÉRIO - "A minha parte não sei se é a mais simples ou a mais complicada. Será a de montar o governo. Estou me desafiando a, pela primeira vez, montar um governo em que a imprensa não saiba quem serão os escolhidos antes de eu indicar. Quero provar a mim mesmo que isso é possível. Quero montar um governo sem que haja pressão para que as pessoas sejam escolhidas por essa ou aquela credencial."

DIREITO DE ERRAR - "Na campanha, eu dizia que não tinha o direito de errar. Agora quero compartilhar isso com vocês dizendo: nós não temos o direito de errar. Sei do time que tenho de montar, sei da responsabilidade que cada ministro ou ministra terá de ter. Dona Zilda [Arns, da Pastoral da Criança], as mulheres terão vez e voz no governo, não serão peças de enfeite. Um governo só funciona se houver, da parte do presidente, o desejo, a vontade e a determinação de cobrar de cada ministro a execução de seu plano de metas, a cada 30, 40, 60 dias."

FOME - "Por que colocamos a fome na ordem do dia? Por que a fome, quando todo mundo esperava que eu indicasse o presidente do Banco Central? Ou o ministro da Fazenda? Porque estou convencido de que o problema é mais político do que econômico. Há muitas coisas prioritárias. Mas se a pessoa não comer, não aprende na escola. Fica doente mais rápido, morre mais. Se a pessoa não comer, não tem nem o direito de ficar bonita, porque a fome deforma a figura humana. Comer não deveria ser nem sequer um compromisso de governo, mas o cumprimento de uma lei bíblica."

SOBRESSALTOS - "O país não pode viver aos sobressaltos. Fiquei pasmo ao saber que uma matéria feita por um jornal [sobre o não pagamento de dívida da Prefeitura de São Paulo] de maneira irresponsável causou pânico, fez o dólar subir, a Bolsa cair. A matéria era inverídica. Havia acontecido exatamente o que o acordo previa que acontecesse. Nossa economia não pode continuar fragilizada a ponto de alguém que tenha poder neste país não poder espirrar mais alto ou menos alto que o dólar sobe e a Bolsa Cai. A responsabilidade de resolver isso não é do presidente, mas da sociedade."

JUROS - "Já disse que nenhum país do mundo poderá dar certo se as taxas de juros oferecidas pelo governo forem maiores e mais atrativas do que as taxas de lucros advindas da produção. Isso será um norte para o meu comportamento na economia. Precisamos acreditar 24 horas por dia, durante 365 dias, que só a produção é capaz de tirar o Brasil da situação em que ele está. Não é aceitável que um país do tamanho do Brasil fique à espera de que haja dinheiro sobrando no mundo para que venha para cá. Porque todo dinheiro que vem, um dia volta. E o que é grave: volta mais gordo do que entrou. Isso aqui não é spa, em que o dinheiro vem para cá e volta magrinho, raquítico. Ele vem para cá e engorda. Temos de mandar embora parte da nossa riqueza por causa desse dinheiro."


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