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São Paulo, domingo, 09 de fevereiro de 2003

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NO PLANALTO

Ex-PT vai ao divã com Tereza Grossi

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Está cada vez mais claro: o neo-PT é a consciência ética que, chegando à meia-idade, concluiu que capitalismo selvagem é sinônimo de socialismo hipócrita. Decidiu cair na vida. Foi viver com o Sarney em Brasília.
O ex-PT atravessa um dilema existencial. Seu ego à Antonio Palocci, fino respeitador das convenções, é cutucado pelo id à Heloísa Helena, rude contestador das contradições.
Qual um Freud pós-moderno, José Dirceu desbrava regiões ocultas da mente petista em busca de uma utopia: o equilíbrio psicanalítico capaz de impedir que o lodo da incoerência continue escorrendo do inconsciente partidário para a superfície política.
Mesmo o velho Sigmund suaria para explicar certas perversões. A sobrevivência de Tereza Grossi na diretoria de Fiscalização do BC, por exemplo. Ela é personagem do escândalo Marka, que custou à viúva R$ 1,574 bilhão. Na oposição, o PT cobrava o escalpo de Grossi. No governo, a mantém no cargo.
Lula deveria requisitar cópia de dossiê da PF sobre o caso. Como o tempo do presidente é curto e o inquérito é longo -mais de 10 mil páginas-, vai aqui um "kit Grossi", modesto subsídio à formação do psiquismo petista.
1) o BC disse à PF que socorreu Salvatore Cacciola, dono do Marka, porque a BM&F (Bolsa de Mercadorias & de Futuros) enviou carta a Brasília alertando para o risco de "crise sistêmica", eufemismo para quebradeira de bancos. Lorota.
2) ouvida, a BM&F disse ter redigido a carta em 15 de janeiro de 99, um dia depois do socorro. Encomendou-a a senhora Grossi. Era falso o apelo ao "risco sistêmico". A BM&F confessou-se apta a liquidar os contratos que o Marka deixaria de honrar;
3) o BC disse também à PF que seu departamento jurídico referendara o refresco a Cacciola. Conversa fiada. Intimados, advogados do BC acomodaram os pingos nos is. Chamam-se Francisco José de Siqueira e Manoel Lucívio de Loiola;
4) foram chamados em casa, por volta das 21h do dia 14 de janeiro de 99. Chegando ao BC, entraram numa sala em que estavam, entre outros, Cacciola e Grossi. Recomendaram não o socorro, mas a liquidação extrajudicial do Marka e o bloqueio dos bens de seus controladores;
5) a PF apurou que o Banco do Brasil recebera, às 20h50 daquele fatídico 14 de janeiro, antes da convocação dos advogados, ordem escrita do BC para que bancasse os compromissos do Marka na BM&F;
6) no ocaso do populismo cambial de FHC, Aloizio Mercadante mostrava-se convencido de que vazamentos de dados do Banco Central haviam patrocinado uma farra de grandes bancos. Entre eles o BankBoston de Henrique Meireles;
7) em abruptas trocas de posição no mercado futuro de dólar, a alta banca teria amealhado lucros de R$ 10 bilhões, impondo prejuízo de R$ 7 bilhões ao erário. O súbito silêncio de Mercadante é hoje mais ensurdecedor que o barulho de Heloísa Helena.
8) sob aplausos do antigo PT, o Ministério Público mandou à Justiça ação em que Tereza Grossi figura como ré. O veredicto deve sair nos próximos meses.
Diligente, José "Freud" Dirceu decerto já prepara a defesa de Tereza Grossi, para o caso de eventual condenação. Soará inconvincente, mas propiciará ótima matéria-prima para psicanalistas.



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