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JANIO DE FREITAS
A hora do general
Duas atitudes vêm aumentar a dimensão e a gravidade do episódio revelado por
Elio Gaspari e protagonizado pelo
general Francisco Albuquerque,
comandante do Exército, ao se fazer embarcar em avião comercial
que já iniciara a operação de partida do aeroporto de Campinas,
na Quarta-Feira de Cinzas.
O Exército, como instituição, foi
agora envolvido em um episódio
que deveria se restringir à pessoa
do seu comandante, com emissão
de uma nota oficial incabível porque nenhum ato ou palavra do
general Albuquerque em Campinas decorreu do cumprimento de
deveres do seu cargo.
Não bastando esse comprometimento da instituição por interesse
pessoal, a nota do Exército o faz a
partir da adulteração dos fatos,
com o propósito de conformá-los
a uma normalidade de conduta
que não existiu.
Diz a nota, entre os seus cinco
pontos: "1 - O comandante do
Exército cumpriu os prazos previstos pela companhia aérea e, inclusive, confirmou a viagem com
12 dias de antecedência. 2 - Está
comprovado que havia passageiros em excesso".
O próprio general Albuquer-
que, em entrevista que o seu agradecimento sugeriu ser de iniciativa sua, disse ontem a uma rádio
duas frases principais: "Eu atendi
a todos os prazos da companhia"
e "eu estava completamente
correto".
Todo o episódio no aeroporto
decorreu de um só fato: o casal Albuquerque apresentou-se ao balcão da companhia, para o check-in pessoal de passagens e a conseqüente autorização de acesso à
sala de embarque, entre 20 e 15
minutos antes da hora marcada,
nos seus bilhetes, para a partida
do avião. Houve, portanto, descumprimento aos "prazos previstos pela companhia aérea" e, supõe-se que devesse ser mais importante para um militar, às normas fixadas pelo Ministério da
Aeronáutica por intermédio da
Diretoria de Aeronáutica Civil.
Além daquelas com que a Infraero coordena a atividade das companhias nos salões de despacho e
embarque. O general não "estava
completamente correto", não o
estava nem o mínimo necessário.
É de conhecimento público, por
parte de todos os que alguma vez
embarcaram em aeroporto, a
norma original de que a apresentação do passageiro deve dar-se
com o mínimo de duas horas de
antecedência, para os vôos internacionais, e de uma hora para os
vôos domésticos. Com as novas
providências a pretexto de segurança, a partir do ataque às torres
de Nova York, muitas empresas e
muitos aeroportos alteraram a
antecedência exigida, mas sempre para aumentá-la.
Mesmo no caso de antecedência
excepcional, nunca seria de menos de meia hora. Por fim, na falta de apresentação do pretendido
passageiro no prazo-limite, a
companhia não está obrigada a
deixar vago o seu lugar, daí a
existência, freqüente e autorizada
pelas normas, de fila de espera.
Como houve em Campinas.
O recurso à deformação dos fatos não defende o general Francisco Albuquerque: acrescenta-lhe outra atitude imprópria para
o seu cargo, e já deveria sê-lo para
sua condição de militar. A nota
oficial do Exército é como uma
carteirada da carteirada, ao valer-se da instituição Forças Armadas para servir à opinião pública a versão reformada dos fatos, nos quais a responsabilidade
não foi institucional, mas individual. Ou assim parece ser, se não
mais estivermos, mesmo, no tempo em que um militar é, só por sê-lo, ele próprio uma instituição
acima de todas as demais.
Se os tempos são outros, o general Francisco Albuquerque tem
satisfações a prestar -por si e por
seus atos pessoais, sem o comprometimento intimidatório da sua
instituição. Porque não poderia
ser outra e melhor a finalidade da
nota que nada acrescentou, como
informação e "esclarecimento",
ao que o general disse de viva-voz.
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