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Ex-ministro vê preconceito e diz que decidiu se demitir no elevador, antes de entrevista em que anunciou a saída
"Querem me nivelar a Jader", diz Bezerra
ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Na condição de ex-ministro,
Fernando Bezerra se declarou
"cristão novo na política", além
de um modestíssimo empresário
e vítima de preconceito por ser
nordestino. Ele centrou fogo contra a cúpula do PMDB. "O que você quer? Me nivelar a essa gente, a
esse povo todo?"
Em entrevista no início da noite,
Bezerra disse que o presidente
"autorizou e permitiu" que ele
continuasse morando na casa da
CNI (Confederação Nacional da
Indústria), entidade que presidia,
quando assumiu o ministério.
Contou, ainda, que na sua última conversa pessoal com o presidente, ontem, no Palácio da Alvorada, voltou a receber seu apoio.
Bezerra lhe perguntou: "O sr. confia em mim?" FHC teria respondido: "Confio, sim, Fernando".
Folha - Quais são os funcionários
do governo que são pagos também
pela CNI, no seu e em outros ministérios?
Bezerra - Nos outros, não sei. No
meu, não estranho nada. Sou presidente da CNI, o ato que cometi é
legal. Chamei para trabalhar comigo pessoas de minha confiança. Eu não podia trazer pessoas de
minha confiança com uma remuneração que não atraía. As pessoas iam perder dinheiro para vir
para cá?
Folha -O sr. também continuou
usando a casa da CNI.
Bezerra - Eu já ocupava a casa
quando fui nomeado, a diretoria
da CNI insistiu e eu disse que uma
condição era pagar um aluguel.
Pago R$ 2.000, que certamente
não corresponde ao valor real do
imóvel, mas o lugar de ministro
não é permanente. E, afinal, eu
sou presidente da CNI. Estou apenas licenciado. Acho que não estava cometendo nenhum crime.
Não estou usando dinheiro público, não estou defendendo o interesse da CNI.
Folha - O ex-ministro Luiz Carlos
Mendonça de Barros caiu justamente por admitir a promiscuidade entre o que é público e o que é
privado. Não é o mesmo caso?
Bezerra - No meu caso, isso não
procede. Eu queria que alguém
me dissesse o que eu fiz no ministério para a iniciativa privada. O
que um jornalista, uma secretária,
um chefe de gabinete poderiam
influir numa decisão de governo?
Folha - E o código de ética?
Bezerra - Estou sendo acusado
de quê? Ninguém me acusa de ter
roubado. Isso é jogo político, claro que é.
Folha - O sr. sempre fala dos seus
funcionários, que não tinham como influir. E o chefe da Assessoria
Econômica do Ministério do Planejamento, José Guilherme Reis? Ele
trata diretamente de assuntos de
interesse da indústria, portanto,
da CNI. Isso não muda de figura?
Bezerra - Posso dizer que José
Guilherme é uma pessoa íntegra,
capaz, que ajudou imensamente a
CNI e só ajuda o governo. Se eu
atirei em alguém, foi no PMDB. A
leitura não pode ser outra. A última coisa que eu quero é atingir o
José Guilherme, que é uma pessoa
a quem quero muito bem.
Folha - O sr. ligou para o presidente, depois da entrevista coletiva?
Bezerra - Liguei e disse: ""Olha,
presidente, me desculpe por tomar essa atitude sem comunicar
ao senhor. Tomei a decisão no
elevador porque não dava mais".
Seria forçar uma situação. Estou
agora esperando datilografarem a
carta de demissão para ir lá entregar. Não dá para ficar e ser execrado pela opinião pública, aliás, pela
opinião publicada, o que é muito
diferente.
Folha - O sr. ia dizendo que atirou
no PMDB...
Bezerra - O que está por trás da
divulgação dessas coisas que são
do conhecimento de todo mundo
há tanto tempo? Minha carta de
desligamento do partido também
está sendo batida agora. Tem
duas linhas. Não podemos ser hipócritas. Eu não tenho espaço no
PMDB, porque sou candidato ao
governo do Rio Grande do Norte.
Eu sou um cristão novo na política, só participei de uma eleição (a
de 1998, para o Senado). Sou um
pequeno empresário, um modestíssimo empresário.
Folha - Como foi sua conversa
com o presidente no Alvorada?
Bezerra - Eu tinha o dever de
mostrar a ele toda as minhas explicações. E ele negou que tenha
dito em algum momento que estivesse irritado comigo, que esperava minha demissão. Eu perguntei:
"O sr. confia em mim?" O presidente respondeu: "Confio, sim,
Fernando".
Folha - Mas essas denúncias contra um ministro respingam no governo todo, até no presidente, especialmente no momento em que
há assinaturas suficientes para
uma CPI.
Bezerra - Eu anunciei que vou
assinar a CPI porque é uma forma
de mostrar que sou um sujeito
limpo. O presidente permitiu, autorizou, não sei bem qual a palavra correta, que eu morasse na casa da CNI. Não foi escondido.
Folha - Além de ser um cargo político e do PMDB, o Ministério da Integração Nacional também foi desenhado para um representante do
Nordeste. O que o sr. acha da nomeação de um peemedebista de
São Paulo, por exemplo?
Bezerra - O sujeito não é competente, não é honesto ou deixa de
ser honesto por ter nascido aqui
ou ali. O que vejo aqui, aliás, é o
contrário. O nordestino é que carrega uma carga enorme de preconceito. Eu sei disso. Mas não tenho preconceito. Nomeei para a
Sudene um carioca e para a Sudam, um gaúcho.
Folha - O sr. era ministro da Integração, que cuidava da Sudene,
mas uma empresa sua recebeu verbas da Sudene e não concluiu projetos. Não é o caso da raposa tomando conta do galinheiro?
Bezerra - Quando cheguei aqui
para tomar conta do galinheiro,
não tinha nenhuma galinha aqui.
Quem mudou quarenta anos de
política para a região fui eu. Quem
acabou com as possibilidades de
desvio fui eu. Que raposa é essa
que você fala?
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