São Paulo, domingo, 9 de maio de 1999

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SISTEMA FINANCEIRO
Instituições que tiveram formuladores do plano como sócios ou fundadores multiplicam o patrimônio
Bancos de economistas crescem no Real

MARTA SALOMON
ALEX RIBEIRO
da Sucursal de Brasília

Três bancos que tiveram como sócios ou fundadores pais do Plano Real -Matrix, BBA e Opportunity- mais do que duplicaram seu patrimônio nos quatro anos do primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Nesse período, não foi raro ver bancos multiplicarem seu patrimônio, embalados pelo plano econômico formulado por Pérsio Arida, André Lara Resende e Edmar Bacha.
Esses personagens tiveram em comum, além das respectivas ligações com o Opportunity, BBA e Matrix, passagens pelo comando do Banco Central (com exceção de Bacha) e do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Dos três, apenas Edmar Bacha permanece atualmente vinculado a uma instituição financeira.
Como o BBA de Bacha, algumas instituições até triplicaram o patrimônio, segundo levantamento feito pela Folha no Sisbacen, o sistema eletrônico de informações do Banco Central.
É o caso do FonteCindam, socorrido pelo BC depois da desvalorização do real em operação investigada pela CPI dos Bancos.
Pouco mais da metade das instituições privadas pesquisadas conseguiram duplicar o seu patrimônio, de acordo com pesquisa feita em amostragem que reuniu os 50 maiores bancos do país.
Ouvido pela Folha, Lara Resende classificou o desempenho dos bancos de "nada excepcional".
Edmar Bacha reconhece que houve transferência de renda para os bancos e atribuiu o fato à dificuldade do governo em controlar seus gastos.
"Isso fez com que a manutenção da estabilidade de preços dependesse da manutenção de uma política cambial rígida, acompanhada de uma política cambial apertada", disse à Folha.
"Taxas de juros elevadas implicam transferência de renda de quem se endivida por gastar em excesso para seus credores", completou Bacha.
Negócios ligados aos juros, câmbio e privatização de estatais, pilares do plano formulado pelos economistas-banqueiros, sustentaram o desempenho dos bancos.
Só com o pagamento de juros, o setor público desembolsou quase R$ 220 bilhões no primeiro mandato de FHC. A dívida pública saltou de R$ 155 bilhões, em dezembro de 94, para R$ 389 bilhões, quatro anos depois.
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Grupo O currículo de André Lara Resende, Edmar Bacha e Pérsio Arida registra também vínculos com o departamento de economia da PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio de Janeiro -um detalhe que esses pais do Real têm em comum com o ministro da Fazenda, Pedro Malan.
No grupo dos economistas-banqueiros também pode ser incluído Luiz Carlos Mendonça de Barros, um crítico da política de juros altos e câmbio que ganhou destaque durante a campanha de reeleição de FHC como formulador da segunda fase do Plano Real.
Ele se afastou do governo no ano passado, depois do vazamento de escuta telefônica no BNDES.
Seu currículo inclui passagem pelo Banco Central, como Lara Resende e Arida. Mendonça de Barros já havia sido diretor do BC quando fundou o Banco Matrix, em parceria com André Lara Resende, em 1993.
O banco exibiu, nos primeiros anos, um dos melhores índices de crescimento e rentabilidade do mercado.
Lara Resende negou que o desempenho do banco se devesse às relações com o comando da política econômica.
"Era só olhar para os planos anteriores para prever que o juro iria ser muito alto e ler jornais para saber que o câmbio ficaria mais ou menos estável", disse em entrevista disponível no site do banco na Internet.
O Matrix continuou crescendo, embora num ritmo mais lento. Entre dezembro de 1994 e dezembro de 1998, os balanços do banco registraram crescimento de 124%.
Antes de formularem o Real, Lara Resende e Arida se juntaram a Luiz Carlos Mendonça de Barros, durante o governo José Sarney, em diretorias do Banco Central, sob o comando de Fernão Bracher, então presidente da instituição.
A relação de Arida e Bracher se estreitou na fundação do banco BBA, em 1988, a ponto de inviabilizar, mais tarde, a permanência de Pérsio Arida na presidência do Banco Central.
A passagem de Arida pelo BC durou apenas cinco meses e foi abalada pelas notícias do Carnaval que passou na fazenda de Bracher.
O país atravessava uma turbulência do mercado financeiro, e o Banco Central interveio no mercado de câmbio, área em que o BBA obteve lucros.
Durante o primeiro mandato de FHC, o BBA manteve forte atuação na área de privatização e quase que triplicou seu patrimônio, revela o levantamento feito pela Folha -cresceu 180%.
O desempenho foi ainda melhor que o outro banco a que Pérsio Arida se associaria: o Opportunity, que cresceu 144% nos quatro últimos anos.
Fundado em 1994 e controlado por outro economista da PUC do Rio de Janeiro, Daniel Dantas, o Opportunity apostou na política de juros altos e estocou títulos públicos antes do lançamento do Plano Real.
Depois, o banco investiu pesado nos negócios da privatização do governo FHC.
Comprou participações da Companhia Vale do Rio Doce e de empresas do Sistema Telebrás.
Durante o processo de privatização das empresas de telefonia, manteve contatos com Lara Resende e Mendonça de Barros, que comandavam a operação nos cargos de presidente do BNDES e ministro das Comunicações, respectivamente.
O episódio mudou o destino dos três. Arida rompeu a sociedade com o Opportunity. Lara Resende e Mendonça de Barros pediram demissão.
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Multiplicação Numa amostragem de 50 maiores bancos privados do país, excluídos aqueles que passaram por recente processo de reestruturação ou fusão, 52% conseguiram duplicar o patrimônio durante o primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso.
Nesse grupo, além do Matrix e do Opportunity, estão bancos como Safra, Bozano,Simonsen e Icatu.
A lista inclui o Banco Marka, também socorrido pelo BC depois da desvalorização do real e investigado pela CPI dos Bancos.
Há um grupo menor, com aproximadamente cerca de 20% da amostragem, de bancos que conseguiram triplicar seu patrimônio entre dezembro de 1994 e 1998.
Aí estão BankBoston, Votorantim, Citibank, BNL, Sofisa e Fininvest, além do FonteCindam.



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