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JANIO DE FREITAS
A cassação do decoro
A oferta a Renan de deixar a presidência
do Senado, preservando seu mandato é, ela mesma, falta de decoro
O MÉTODO NÃO chega a
ser original, tanto que
de casos mais graves
surgiu até o "ladrão que rouba
ladrão". Mas, como proposta
mais apoiada no Senado, para
o caso Renan Calheiros, é o
prenúncio de um escândalo
de imoralidade política ainda
mais ampla.
A oferta a Renan Calheiros
de renunciar à presidência do
Senado, preservando o mandato de senador, em troca de
ver-se perdoado ou inocentado de falta de decoro é, ela
mesma, falta de decoro.
A fórmula reconhece falta
de decoro em Renan Calheiros, restringindo, porém, o
seu efeito impeditivo apenas
ao exercício da presidência do
Senado. Ocorre que o decoro
é exigido, por mínimo que seja, para o exercício do mandato parlamentar, no qual um
cargo diretivo ou comissionado é apenas uma decorrência
eventual.
Por isso mesmo, o processo
de cassação não propõe retirar o mandato de presidente
ou outro: visa a retirada do
mandato parlamentar.
Além disso, para tornar efetiva a barganha, a maioria dos
senadores teria que forçar o
Conselho de Ética a recusar
as outras três representações
existentes contra Renan Calheiros, referentes a atos indecorosos também fora do assunto Mônica Veloso. A rejeição aos três, como operação,
talvez não fosse difícil. Mas
quem ou o que seguraria a
reação desmoralizante para o
Senado e ruinosa para os senadores que, para não cassar
Renan, querem cassar o decoro?
Eis o problema dos adeptos
da salvação indecorosa para
dar a Renan Calheiros sem
anos de perdão.
Sem decolar
Por várias vezes nos últimos dias, Lula voltou a dizer
que seu governo "cumpre os
contratos" e "respeita as regras", sem dispensar o chavão -no caso, em defesa de
Renan Calheiros- de que
suspeitos não são culpados
antes do julgamento.
As repetições acompanharam-se de fatos que as desmentiam -também isto,
mais uma vez.
Os diretores da Anac, a
Agência Nacional de Aviação
Civil, tornaram-se oprimidos pela violência de pressões que nada têm de democráticas nem de respeito às
leis. É, além do mais, um processo covarde de tomar-lhes
os cargos, quando não faltam
meios corretos de fazê-lo, se
isso se justificar.
As evidências não deixaram dúvida de erros graves
da Anac, mas o governo não
as investigou para identificar
com precisão em que consistiram tais erros, por que
ocorreram e o que cada um
deles provocou na crise aérea. Logo, não conhece as
responsabilidades individuais na direção e no corpo
técnico da Anac. Supre com
pressões e ameaças a falta de
elementos para proceder a
processos legítimos de afastamento.
Os dirigentes da Anac, como os das demais agências
setoriais, têm mandato conferido por votação do Senado
e autonomia administrativa.
Apesar disso, três já cederam
às pressões. Jorge Velloso,
oficial reformado da FAB,
sem suspeitas que explicassem a decisão; Leur Lomanto, também isento de suspeitas, em honra à tradição familiar na política baiana propôs sua saída em troca de um
cargo ainda melhor, porque
vitalício; e Denise Abreu, incapaz de explicar o uso de
um documento incabível para liberar a pista de Congonhas.
As providências propaladas, no entanto, não vieram.
Como a desconcentração de
conexões e de horários. E
nem mesmo a limitação ao
uso de Congonhas, já submetido a artifícios farsantes do
governo, para ceder, sabe-se
lá por que, a linhas e conexões de interesse das empresas. De novo, só a criação de
mais um órgão, com mais
burocracia, mais empregos
para as patotas, em uma tal
Secretaria Geral de Aviação
Civil (Geral a prenunciar
parciais?). Como se não bastasse a aviação civil brasileira estar dividida entre vários
departamentos da FAB, a
Anac, a Infraero, o Conselho
de Aviação Civil, a Iata e os
acordos internacionais, além
de inúmeras entidades com
influência indireta.
Com alguns dias de chuva
em São Paulo, veremos se os
problemas estão resolvidos
ou se a nota da Anac, com tal
afirmação, apenas quer atenuar pressões e ameaças.
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