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Dantas dribla Receita com recursos judiciais
Fisco só conseguirá analisar 670 das 24 mil operações financeiras de disco rígido do Opportunity apreendido pela PF em 2004
Por lei, a Receita só pode cobrar impostos retroativos a cinco anos; disco obtido na Operação Chacal registrava movimentações desde 1992
ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Graças à passagem do tempo,
em parte propiciada pela apresentação de recursos judiciais,
o banqueiro Daniel Dantas, do
Opportunity, livrou milhares
de operações de seus clientes
de passar pelo crivo da Receita.
O fisco vai analisar apenas 670
das quase 24 mil movimentações que constam do disco rígido do banco apreendido pela
Polícia Federal em 2004 e que
tiveram o responsável identificado pela fiscalização.
Assim, em vez de ter como
base de cálculo US$ 6 bilhões
para cobrar impostos devidos
aos cofres públicos, os fiscais da
Receita irão se debruçar sobre
um montante de US$ 534 milhões -a soma das 670 operações entre 2003 e 2004.
A Folha tentou, sem sucesso,
falar com o advogado de Dantas até a conclusão da edição.
Por lei, a Receita só pode cobrar impostos devidos retroativos a um prazo de cinco anos. A
matéria-prima do trabalho dos
fiscais poderia ser maior, não
fossem os sucessivos recursos
que os advogados do banqueiro
apresentaram e por meio dos
quais conseguiram, inclusive
no STF (Supremo Tribunal Federal), a proibição da abertura
e da análise dos dados contidos
no disco rígido apreendido na
Operação Chacal e que registra
33 mil operações financeiras
internacionais, entre dezembro de 1992 e junho de 2004.
O principal argumento dos
advogados é que as movimentações não eram alvo da Chacal, que tinha como foco a contratação da empresa Kroll para
espionar, inclusive com métodos ilegais, a Telecom Italia
-que mantinha disputas judiciais com a Brasil Telecom, então gerida pelo Opportunity.
Por uma manobra jurídica
do Ministério Público e da PF,
o sigilo do disco rígido foi quebrado, sob o argumento de que
necessitavam ter acesso aos dados para verificar eventual envolvimento do banqueiro com
o mensalão -o esquema de pagamento a congressistas da base aliada em troca de apoio ao
governo Lula. Tudo isso ancorado no fato de que as companhias telefônicas de Dantas teriam contribuído com R$ 150
milhões para tais pagamentos.
Três anos depois de aprovada a quebra do sigilo do disco
rígido pela Justiça, os peritos
acessaram seus dados e constataram a prática de crime financeiro. Elaboraram um laudo
que foi um dos fundamentos
para a prisão de Dantas na
Operação Satiagraha, em julho.
As operações financeiras sob
investigação da Receita e da PF
fazem parte de um tipo de aplicação destinada a um fundo no
qual só podem investir pessoas
não-residentes no país. Ao colocar seu dinheiro no Brasil,
ganham como benefício isenção de Imposto de Renda.
Havia a suspeita, confirmada
pela Satiagraha, de que residentes no Brasil usavam essa
movimentação para burlar a lei
e livrar-se de tributos.
A passagem do tempo, com
os sucessivos recursos, na prática fez com que uma montanha de US$ 5,5 bilhões eventualmente ilegais tenha sido legalizada, o que beneficia diretamente clientes de Dantas.
As 670 operações sob investigação têm como titulares 120
pessoas físicas e jurídicas. Entre impostos, juros e correção
monetária, devem recolher
mais de R$ 6 bilhões.
Ainda que prescritos do ponto de vista da Receita, os crimes
financeiros continuam sob investigação, na esfera criminal,
da equipe da PF da Satiagraha.
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