São Paulo, quarta-feira, 09 de setembro de 2009

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Depois de mal-estar, governo recua de anúncio sobre caças

Defesa diz que haverá negociações com os 3 concorrentes; francês deve ser mesmo o vencedor

Lula se precipitou em jantar com Sarkozy no domingo, o que irritou a Aeronáutica e deixou o ministro Jobim no meio de um fogo cruzado


Sérgio Lima/Folha Imagem
Nelson Jobim (à dir.) em reunião ontem com líderes da Câmara na qual tratou da compra de caças

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

Ao anunciar antes do esperado a definição do Brasil pelos caças da francesa Dassault, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva provocou constrangimento no seu próprio governo, que teve de recuar ontem, informando que o processo de seleção não está concluído e que o F-18 dos EUA e o Gripen sueco ainda estão na disputa.
O comunicado conjunto de anteontem dizia que Lula e o presidente Nicolas Sarkozy "decidiram fazer do Brasil e da França parceiros estratégicos também no domínio aeronáutico" e anunciava "a decisão" de entrar em negociações para a compra. Em nota ontem à noite, Nelson Jobim (Defesa) corrigiu: "o processo de seleção (...), ainda não encerrado, prosseguirá com negociações junto aos três participantes".
A expectativa é que o negócio acabe sendo fechado com a França, mas só depois que a Dassault abaixar os preços do Rafale -o mais alto entre os concorrentes- e criar condições mais favoráveis de juros. Conforme a Folha apurou, Lula se precipitou no jantar com Sarkozy no domingo à noite e queimou etapas do processo de seleção, o que irritou o Comando da Aeronáutica e deixou Jobim no fogo cruzado.
Tanto que o ministro se recusou a dar entrevista na segunda no Alvorada para explicar um anúncio que é da sua área. Lula delegou a tarefa então para o chanceler Celso Amorim, que confirmou os termos do comunicado conjunto: "O que há é uma decisão de iniciar uma negociação com um fornecedor [a França].
E não há a mesma decisão em relação aos outros dois [EUAe Suécia]". Criada a confusão, o comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, reuniu durante todo o dia de ontem seus assessores. Eles se dizem satisfeitos como Rafale, mas não aceitaram o anúncio sem que o processo estivesse concluído. O relatório da FAB sobre as três opções nem sequer foi entregue ainda. Por volta das 15h, Jobim, Saito e o responsável pela seleção se reuniram para acertar um recuo que não confrontasse Defesa e Força Aérea com Planalto e Itamaraty. Na reunião do Conselho Político, Jobim deu uma explicação sobre o processo de escolha, defendendo que "os ritos e os prazos" fossem seguidos à risca para evitar questionamentos judiciais futuros.
Um dado considerado nas reuniões do governo foi que a opção por qualquer um dos três aviões só pode ser anunciada depois do aval do Conselho de Defesa Nacional, presidido por Lula e integrado por Jobim, Amorim, outros ministros e os presidentes do Senado e da Câmara.
Em encontro com líderes partidários, ontem, Jobim já tinha afirmado que o acordo entre Brasil e França para a compra de 36 Rafale ainda não estava fechado, e o que havia era apenas uma "conversa avançada" com os franceses. Questionado se Jobim teria confirmado a compra, o presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), foi enfático: "Ao contrário, ele disse que ainda está em negociação".
Ontem, militares e diplomatas fecharam-se para declarações, enquanto afunilava a versão em Brasília de que Lula tomou a decisão do anúncio praticamente sozinho e isso pode atrapalhar a negociação de detalhes, como preços e condições do negócio. Daí o recuo. No caso da compra de quatro submarinos da classe Scorpène, mais a tecnologia para a fabricação de um submarino nacional de propulsão nuclear no Brasil, houve várias etapas de negociação, até ser assinado o contrato em si.
Um dos motivos apontados para Lula ter se precipitado foi a intenção de Sarkozy de adquirir da Embraer brasileira dez unidades da futura aeronave de transporte militar e reabastecimento aéreo KC-390. O avião está em fase de projeto, com financiamento da FAB, e uma promessa de venda externa deverá deslanchá-lo no mercado internacional. As compras dos aviões franceses podem custar R$ 10 bilhões.
Colaborou MARIA CLARA CABRAL, da Sucursal de Brasília



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