São Paulo, segunda-feira, 09 de outubro de 2006

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ELEIÇÕES 2006 / ENTREVISTA
Brasil pode virar Venezuela, diz Ciro

Ex-ministro diz que teme pelo que pode ocorrer caso Lula perca eleição devido a acusações de corrupção

Para ele, se a eleição for restrita a acusações mútuas, o processo eleitoral ficará pouco crível e o vencedor assumirá sem credibilidade

FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Deputado federal proporcionalmente mais votado do país, o ex-ministro da Integração Nacional no governo Lula Ciro Gomes (PSB-CE), 48, considera que uma radicalização no processo eleitoral com acusações no campo moral pode acabar numa "venezuelização" do Brasil, em referência à instabilidade política do país comandado por Hugo Chávez. Se o debate eleitoral se restringir a um candidato acusar o outro de corrupto, avalia, "o processo político-eleitoral passa a ser pouco crível". "O que ganha acaba sendo eleito sem legitimidade. O país mergulha numa situação venezuelana".  

FOLHA - Como será decidido o segundo turno?
CIRO GOMES
- Haverá o assunto do dossiê. Tudo bem. Tem de ser tratado no contexto certo. Mas há uma tentativa, resumida num slogan completamente contraditório do Alckmin, que é "a ética vai vencer a corrupção". Que conversa é essa?

FOLHA - Qual é o problema com esse slogan ou idéia?
CIRO
- O que pega é catapora. Se alguém de terceiro ou quarto escalão faz algo errado ou inescrupuloso isso desqualifica do ponto de vista moral a respeitabilidade de outro cidadão? Se for assim, o Alckmin também seria responsável pelo caso Fonte-Cindam, pela "privataria" na área de telecomunicações e pelas cerca de 60 suspeitas sem esclarecimentos pela não-instalação de CPIs sobre o governo de São Paulo. Aonde vamos chegar?

FOLHA - Aonde?
CIRO
- Eu não tenho problema em reconhecer a respeitabilidade do dr. Alckmin. Agora, se a ética é manipulada por conveniência, ele se abraça com o casal Garotinho e com Ivo Cassol. E o presidente Lula não é ético porque um maluco qualquer fez uma atitude inescrupulosa numa campanha local? Tudo posto, o Alckmin é uma pessoa respeitável. Mas, pela mesma boa-fé, eles têm de reconhecer a respeitabilidade do Lula. Isso é o que importa para a nossa democracia. A metade do país acredita em um e a outra metade acredita no outro. O que ganha acaba sendo eleito sem legitimidade. O país mergulha numa situação venezuelana. Isso não tem cabimento. Porque ética para o Alckmin é uma conveniência, não é um comportamento.

FOLHA - Como assim?
CIRO
- Se fosse mesmo o anjo, ele não daria conta de sustentar esse discurso -pelos escândalos dos quais ele infelizmente é o portador por ser o representante da coalizão PSDB-PFL. Se um ficar acusando o outro, metade do país acredita em um, e metade, no outro. E trazemos a Venezuela aqui para dentro.

FOLHA - Que movimentos estão sendo feitos para evitar isso?
CIRO
- Há dois movimentos. Um de diplomacia e outro de infantaria. Estou conversando com as pessoas e ponderando. Conversei com o governador Aécio Neves. Há um esforço. Não estamos querendo fazer acordo. Eu compreendo que o dever do Aécio Neves é lutar pelo candidato dele. E ele compreende que o meu dever é lutar pelo meu lado.

FOLHA - Mas se não é um acordo, o que se busca então?
CIRO
- Estamos defendendo um projeto nacional contra uma ameaça. Na minha opinião, o país corre o risco Alckmin. A redução dos gastos correntes fará explodir a questão social. Se não atualizar os valores do Bolsa Família, essa conquista do povo miserável do país vai custar a ele muito politicamente. Se estivermos na eminência de uma reforma neoliberal na Previdência, teremos outra onda de greves.

FOLHA - Mas o sr. não disse ainda que tipo de resultados podem ter as conversas entre as duas campanhas.
CIRO
- O objetivo é que os dois candidatos se respeitem. Porque se ficar num jogo de desqualificação vil, uma premissa básica do sistema de democracia representativa ficará ferida.

FOLHA - Mas o que acontece?
CIRO
- Quem se eleger chega negado na sua credibilidade. O processo político-eleitoral passa a ser pouco crível para essas tensões sociais. Aí nós vamos conhecer o fenômeno que é visualizável na Venezuela e em quase toda a América do Sul.

FOLHA - Os grupos de pressão no país reagiriam de maneira violenta?
CIRO
- Eu não sou futurólogo. Eu temo.


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