São Paulo, segunda-feira, 09 de outubro de 2006

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Editor Fernando Gasparian morre em SP

Ex-deputado e fundador do jornal "Opinião" e da revista "Argumento", críticos da ditadura militar, foi cremado ontem

Empresário nacionalista chegou a empregar 5.000 funcionários em empresa têxtil e tentou fixar limite aos juros na Constituinte

Marco Ankosqui/Diário de SP
Plínio de Arruda Sampaio (PSOL), à dir., no velório do
editor Fernando Gasparian, ontem, na Assembléia
Legislativa de SP


DA REPORTAGEM LOCAL

O corpo do editor e ex-deputado federal constituinte Fernando Gasparian, 76, foi cremado ontem no crematório da Vila Alpina, em São Paulo, após o velório na Assembléia Legislativa paulista.
Empresário e político de convicções nacionalistas, Gasparian fundou nos anos 70 o jornal semanário "Opinião" e a revista "Argumento", considerados focos de resistência à ditadura militar, presidiu a Editora Paz e Terra e criou a livraria Argumento, no Rio.
Gasparian estava internado desde a última quinta-feira no hospital Sírio-Libanês, na capital paulista, para tratamento de problemas renais que levaram a uma infecção generalizada seguida de parada cardíaca. Ele morreu na manhã do último sábado.
Estiveram ontem no velório o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e a ex-primeira-dama Ruth Cardoso, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, a ex-prefeita paulistana Marta Suplicy, o ex-ministro da Justiça José Gregori, entre outros políticos e autoridades.
"Meu pai tinha duas paixões na vida, minha mãe [Dalva] e o Brasil", disse ontem um dos filhos do editor, Eduardo.
Para Ruth Cardoso, o editor foi peça fundamental na "resistência cultural" à ditadura.
"Nós perdemos um grande amigo de mais ou menos cinco décadas, desde a adolescência. E o Brasil perdeu um empresário que lutou muito por suas idéias. "Opinião" e "Argumento" foram a base da luta contra a ditadura", disse Ruth.
"Concordando ou discordando de idéias, nunca deixamos de ser amigos", declarou.

Nacionalista
No início dos anos 60, Gasparian era um dos principais empresários da indústria têxtil no país, dono da América Fabril, sediada no Rio, que chegou a ter mais de 5.000 funcionários.
Após o golpe militar de 64, passou a ser perseguido pela ditadura. "Meu pai teve de parar com a indústria porque o governo cortou o crédito do Banco do Brasil, que era o principal financiador", disse o filho Eduardo.
Em 1970, ao saber que poderia ser preso por motivos políticos, Gasparian foi para o exílio na Inglaterra. Retornou ao Brasil logo depois, quando fundou o jornal "Opinião".
Foi editor do jornal entre 1971 e 1975. Durante sete anos, o jornal firmou-se como veículo alternativo de críticas ao regime militar, abrigando autores como Celso Furtado, Fernando Henrique Cardoso, Dias Gomes, Alceu Amoroso Lima e Érico Verissimo.

Editora
Em 1973, o grupo do "Opinião" liderado por Gasparian assumiu a editora "Paz e Terra", fundada em 1965 pelo seu amigo e editor Ênio Silveira, também fundador da Civilização Brasileira.
A Paz e Terra deu espaço a autores que eram adversários do regime, como o educador Paulo Freire (1921-1997), autor de "Pedagogia do Oprimido".
A editora deu prioridade às áreas de filosofia, sociologia e ciência política, tornando-se referência no meio acadêmico.
A revista Argumento tratava com inventividade temas da política, da economia, dos esportes e das artes. O então diretor-responsável, Barbosa Lima Sobrinho (1897-2000), chegou a suspender a circulação da revista após o quarto número, em resposta a uma tentativa de tutela da linha editorial pelos censores do governo.
Em 1977, Gasparian criou a Livraria Argumento em São Paulo. No ano seguinte, transferiu-a para o Rio de Janeiro. Hoje, a livraria conta com três lojas na capital fluminense: no Leblon, na Barra da Tijuca e em Copacabana.

Parlamentar
O editor retornou a São Paulo em 1984. Dois anos depois, se elegeu deputado federal pelo PMDB. Na Constituinte, sua contribuição mais citada foi a criação do teto dos juros reais em 12% ao ano, que não chegou a ser regulamentada pelo Congresso Nacional.
Gasparian também tentou, como deputado, impor uma quarentena (não poderiam ocupar cargos na iniciativa privada) aos ex-dirigentes do Banco Central.
Durante o governo de seu amigo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), opôs-se à privatização da companhia mineradora Vale do Rio Doce e defendeu a adoção do limite de 12% aos juros reais -assim como dizia a Constituinte-, nunca colocada em prática.
Gasparian deixou viúva, Dalva, e quatro filhos, a diplomata Helena e os três livreiros, Laura, Eduardo e Marcus, que dirigem as livrarias Argumento.


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