São Paulo, terça-feira, 09 de outubro de 2007

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TCE ignorou 7 pareceres sobre Nossa Caixa

Tribunal de Contas aprovou contrato de R$ 671 milhões, sem licitação, com associação investigada por polícia e promotores

Para justificar contratação direta, banco se baseia em trecho da lei sobre empresas sem fins lucrativos ou de inquestionável reputação

LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

O Tribunal de Contas do Estado (TCE) de São Paulo ignorou sete pareceres de técnicos da própria instituição e aprovou por unanimidade um contrato de R$ 671 milhões, sem licitação, firmado entre a Nossa Caixa e a Asbace -associação de bancos estatais investigada pela Polícia Civil e pelo Ministério Público.
A decisão do TCE, a quem cabe fiscalizar atos do Executivo e de empresas públicas, serviu de esteira para que outros quatro contratos da estatal com a Asbace fossem celebrados na seqüência, todos sem licitação.
Sem infra-estrutura para a execução dos serviços, a associação subcontratou empresas, em acordos que não são submetidos ao tribunal de contas.
A Asbace está sob suspeição desde junho, quando a polícia e a Promotoria do Distrito Federal deflagraram a Operação Aquarela, que prendeu o ex-presidente da associação e do BRB (banco estatal de Brasília) Tarcísio Moura e o ex-secretário-geral e principal homem da entidade, Juarez Cançado.
Foi apontado um rombo de R$ 50 milhões dos cofres do BRB. Para a polícia, há "fortes indícios" de que o desvio se repetiu na Nossa Caixa.

Em São Paulo
Em 2003, a Nossa Caixa contratou a Asbace para que a associação cuidasse da instalação de redes de auto-atendimento (caixas eletrônicos) em todo o Estado. O acordo foi fechado por R$ 671 milhões e tem validade até outubro de 2008.
Para justificar a contratação direta num valor tão alto, a Nossa Caixa se baseou no inciso XIII, do artigo 24 da lei nš 8.666/93, que prevê a dispensa de licitação se a contratada não tiver fins lucrativos, gozar de inquestionável reputação ético-profissional e for voltada ao ensino, à pesquisa ou ao desenvolvimento institucional.
Esse argumento não foi acolhido por técnicos do TCE, que estudam a legalidade de um contrato antes de o caso ser submetido à avaliação final dos conselheiros do tribunal.

Vaivém
O primeiro técnico a opinar foi Alan Roberto Hoffmeier. Para ele, sem pesquisa de mercado, não era possível garantir o caráter econômico do acordo.
O processo voltou à Nossa Caixa, que reafirmou que a Asbace era a mais recomendada para a execução do serviço.
De volta ao TCE, o contrato passou por mais quatro técnicos. Todos opinaram pela irregularidade do documento.
Mais uma vez chamada a se explicar, a Nossa Caixa manteve o mesmo argumento.
No tribunal de contas, o acordo novamente foi rejeitado, desta vez, em dois pareceres.
O processo seguiu, então, para três técnicos do tribunal que ainda não haviam examinado o contrato. Eles se manifestaram pela regularidade.
O último a opinar foi Cláudio Plaschinsky, que substituiu o diretor-geral Sérgio Ciquera Rossi -que já havia dito que os argumentos do banco "careciam de comprovação efetiva".
Segundo o TCE, Rossi não votou pois "estava de férias ou dando palestras no interior".
No plenário do tribunal, o conselheiro e relator Eduardo Bittencourt acolheu os argumentos da Nossa Caixa e considerou legal a dispensa de licitação. Os colegas Edgard Rodrigues e Cláudio Ferraz de Alvarenga acompanharam o voto do relator. A partir daí, os demais contratos também foram feitos sem concorrência pública.

Subcontratos
Após fechar contrato com a Nossa Caixa, a Asbace, que não tem fins lucrativos, subcontratou a ATP Tecnologia e Produtos, que tem fins lucrativos e pertence à própria associação.
A ATP, por sua vez, subcontratou a ONG Caminhar, cujos funcionários relataram à polícia terem prestado serviços fictícios à Nossa Caixa.
Para o promotor Eduardo Rheingantz, a Nossa Caixa não poderia ter dispensado a licitação. O fato de a Asbace subcontratar empresas para a execução de serviços, diz, mostra que ela não é especializada.
"Não tenho dúvida de que a licitação deveria ter ocorrido. A minha investigação é para apurar se a dispensa foi por equívoco ou por má-fé e também se houve prejuízo ao erário, pois o Estado de São Paulo é o acionista majoritário da Nossa Caixa."
Para o líder do PT na Assembléia Legislativa de São Paulo, Simão Pedro, houve uma "tremenda forçação de barra" no TCE para que os contratos fossem aprovados sem licitação.
"É de extrema gravidade ver o TCE, a despeito da opinião de vários técnicos que desaconselharam o contrato, aprovar a dispensa de licitação. Não estamos falando de R$ 10 mil para uma situação de emergência. São R$ 671 milhões para a instalação de caixas eletrônicos, que não tem nada de urgente."


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