São Paulo, sexta, 9 de outubro de 1998

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JANIO DE FREITAS
Fechado ao diálogo

É compreensível que o exaustivo discurso de Fernando Henrique tenha produzido decepção: veio atrasado. Foi um eleito fazendo o discurso que ficou devendo como candidato.
Não foi um discurso do atual nem do futuro governante. As medidas anticrise que o presidente em pleno mandato está devendo, também, ficaram numa vaguidão que só aumentou sua dívida. As linhas que diriam o que será o segundo mandato não chegaram nem ao vazio das entrelinhas.
Talvez pela falta de algo melhorzinho, ou porque o senador Antonio Carlos Magalhães se antecipou no tema e o presidente deve segui-lo, a disposição de diálogo com oposicionistas tornou-se o trecho promovido pelos governistas. "Reafirmo que estou aberto ao diálogo (...) o diálogo hoje é um imperativo nacional".
Se for assim um dever nacional, é mais um que deixará de ser cumprido. Subentendido no discurso que o diálogo entre oposição e governo é exigido pela crise, o governo já o trava e só o trava no estrangeiro, com outros governos, com banqueiros americanos e, acima de tudo, com o FMI. O que seria objeto do diálogo que é "imperativo nacional" está sendo definido no exterior e chegará pronto.
De traições
O segundo turno no Rio, embora a necessidade de mais campanhas e outra ida às urnas, não deixa de ter graça.
Só o candidato a senador Moreira Franco, que fez uma das campanhas mais ricas do país e sofreu uma derrota achatante, foi mais agressivo do que Cesar Maia nas peças de propaganda e nas falas pessoais. O nível de insultos a que Cesar Maia chegou pode ser medido pelo tratamento dado aos filhos de Marcello Alencar: Irmãos Metralha, em alusão aos personagens de quadrinhos que, de tão bandidos, jamais tiram a máscara do rosto e já estão sempre com a camisa numerada da penitenciária.
A doçura com que Cesar Maia se refere agora a tudo o que diga respeito a Marcello Alencar é a doçura de um enamorado. Tão doce que chega a revirar o estômago do ouvinte. E ainda diz que a união deles é necessária porque "a população não aguenta mais conchavo de políticos".
Esse Cesar Maia giratório é que está deixando aturdidos os outros adversários de Anthony Garotinho. O PFL abandonou seu candidato, no primeiro turno, pela convicção de que, se eleito, será um livre-atirador fazendo o impossível para sair candidato à Presidência em 2002, à revelia do partido. Fernando Henrique, Serra e outros peessedebistas perceberam que o mesmo motivo os aconselhava a promover o boicote empresarial a Maia, antes candidato do empresariado fluminense.
No primeiro turno, com vários candidatos, não foi difícil disfarçar a recusa de apoio consequente. Mas, só com dois candidatos, o PFL e o PSDB estão em situação única entre os vários segundos turnos: ou apoiam o Cesar Maia de quem receiam traições ou o rejeitam e passam eles à acusação de traidores.



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