São Paulo, quarta-feira, 09 de novembro de 2005

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ANÁLISE

Presidente tem momentos de contradição

MARCELO DIEGO
EDITOR-ADJUNTO DE BRASIL

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi peremptório: não houve caixa dois em sua campanha presidencial em 2002. Segundos depois foi confrontado com a lembrança de que o seu ex-publicitário Duda Mendonça declarou à CPI ter recebido por fora e num paraíso fiscal pelo trabalho para o PT. "Não posso responder pela campanha do Duda", respondeu.
Este foi um dos momentos de contradição nas declarações do presidente, dadas ao programa "Roda Viva" e exibidas anteontem pela TV Cultura. Lula, que em julho achava que caixa dois era uma prática sistemática no país, anteontem disse que se trata de "prática condenável". Ainda assim, afirma que não foi utilizada em sua campanha, mesmo com a afirmação pública de seu publicitário dizendo o contrário. Mas acredita que isso é um problema do seu partido, não seu.
Outro momento em que o presidente foi afirmativo se deu ao responder se acreditava na existência do "mensalão". Disse que, com certeza, não. Segundo ele, a denúncia do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) de que parlamentares da base aliada recebiam dinheiro para votar de acordo com os interesses do governo não foram comprovadas. E afirmou que alguns deputados podem ser cassados por práticas de corrupção, mas não pelo "mensalão". "Jefferson prestou um desserviço ao Brasil", afirmou Lula. "A tese era que tinha dinheiro público abastecendo as contas do PT e isso não foi provado", disse.
A CPI dos Correios sustenta que o dinheiro distribuído aos parlamentares pelo PT (via publicitário Marcos Valério) pode ter tido como origem um banco federal (o Banco do Brasil), e não empréstimos privados. A Folha fez um levantamento e mostrou coincidência de saques feitos por deputados às vésperas de votações importantes no Congresso em 2003 e 2004. Não há ainda provas inequívocas de que o "mensalão" existiu -mas há fortes indícios.
O presidente defendeu que o governo não procurou interferir no trabalho de investigação dos parlamentares e que não impediu a criação das CPIs.
Em maio, porém, o governo jogou pesado para que os parlamentares da base aliada não assinassem o pedido de abertura da CPI dos Correios. Ela só saiu do papel após as declarações de Jefferson à Folha. Mais tarde, o ministro Jaques Wagner (Relações Institucionais) disse que o governo debatia ir ao STF contra a CPI dos Bingos, que estaria "fugindo do seu foco".
Durante o programa, o presidente foi interpelado sobre focos de corrupção em seu governo e no PT. Cauteloso, disse que até o momento nada foi provado. E afirmou não achar que há "denuncismo" vazio, embora tenha alertado para supostos excessos cometidos pela oposição. Publicamente, porém, Lula já criticou o trabalho das CPIs, afirmando que elas reverberam "denúncias vazias" e que depois "não há pedidos de desculpas, retratações".
De números da economia ao caso Cuba, as respostas de Lula foram assim: favoráveis ao governo, com um toque de amnésia e nem sempre em linha com a realidade.


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