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Judiciário autoriza mais de mil grampos por dia no país
CPI aponta prorrogações não autorizadas e por período acima do permitido por lei
Estado de São Paulo lidera ranking das interceptações; Justiça impediu comissão de ter acesso aos mandados que determinaram escutas
ALAN GRIPP
MARIA CLARA CABRAL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Dados oficiais das operadoras de telefonia enviados à CPI
dos Grampos e compilados por
técnicos da comissão revelam
que foram feitas pelo menos
375.633 escutas telefônicas
com autorizações judiciais em
2007 -ou seja, em média foram iniciadas mais de mil interceptações a cada dia.
A análise dos dados revelou
irregularidades explícitas, como grampos determinados por
varas de família -a lei diz que a
escuta só pode ser usada em investigação criminal. Também
foram dadas ordens para interceptações por período superior
ao limite de 15 dias. Há casos de
grampos contínuos por 190
dias, sem os devidos pedidos de
prorrogação na Justiça.
O levantamento é a espinha
dorsal da investigação da CPI,
que apontará o abuso na utilização do instrumento de investigação, segundo o presidente
da comissão, deputado federal
Marcelo Itagiba (PMDB-RJ):
"Esses dados inéditos comprovam o descontrole total e absoluto de todas as instituições
que lidam com os grampos, da
Justiça às polícias, passando
pelas operadoras, que são concessionárias de serviço público
e muitas vezes não têm controle dessas atividades", diz Itagiba, ex-secretário de Segurança
do Rio e ex-superintendente da
Polícia Federal no Estado.
Não é possível dizer que foram grampeadas 375.633 linhas telefônicas, já que um
mesmo número pode ter sido
alvo de ordens judiciais diferentes. E, dentre os pedidos
atendidos pela Justiça, também pode haver casos de prorrogações de escutas em curso.
Versão do CNJ
Ainda assim, o número contrasta com as declarações do
corregedor do CNJ (Conselho
Nacional de Justiça), Gilson
Dipp, responsável por elaborar
um cadastro dos grampos no
país. Com base em informações
recebidas pelo CNJ, Dipp afirmou que o número de escutas
foi "infinitamente menor" do
que dizia a CPI dos Grampos.
O corregedor referia-se à estimativa da CPI de que 409 mil
interceptações foram realizadas ano passado, feita a partir
de depoimentos de representantes das operadoras à comissão. Porém, o número calculado agora pela CPI com base nas
informações prestadas pelas
operadoras é apenas 8% menor
do que a primeira estimativa.
Na sexta, a Folha procurou o
corregedor para que ele comentasse os novos dados, mas,
segundo a assessoria de imprensa do órgão, Dipp estava
no Chile e não foi localizado.
Em razão de respostas incompletas enviadas pela maioria das 13 operadoras acionadas, a CPI só pôde fazer um
mapeamento parcial dos grampos. Baseado nos dados de apenas três operadoras, de nomes
não divulgados, que responderam aos questionários na íntegra e disseram ter feito 150 mil
interceptações, a comissão diz
que 23% delas foram em telefones do Estado de São Paulo.
Celulares
Considerando apenas celulares, essas três operadoras fizeram 85,7 mil escutas, a maioria
em telefones de São Paulo: 21,7
mil (um em cada quatro grampos). Em seguida vieram os
grampos em celulares do Paraná (13,3 mil), Santa Catarina
(6,3 mil), Minas Gerais (5 mil) e
Pernambuco (4,8 mil).
A CPI não informou o nome
dessas operadoras nem daquelas que prestaram informações
incompletas: quer evitar novos
problemas com a Justiça, como
a liminar do Supremo Tribunal
Federal que desobrigou as empresas de enviarem à comissão
cópias dos mandados judiciais
que ordenaram os grampos.
Para Itagiba, a entrega dos
mandados judiciais seria a única forma de a CPI fazer um mapeamento completo das escutas no país e levantar os casos
de abuso de poder, como os de
grampos ilegais "enxertados"
em investigações sem relação
com os donos dos aparelhos.
Em cartas enviadas aos presidentes da Câmara e do Senado, Itagiba queixou-se dos
"atos de intervenção" do STF
nas atividades da Congresso.
"Da forma como o Supremo
vem se comportando, a caixa-preta dos grampos continuará
fechada", diz ele, lembrando
que a Justiça já transferiu ao
Congresso o sigilo de dados
confidenciais, como nas CPIs
dos Bingos e dos Sanguessugas.
Apesar de afirmar que a CPI
já diagnosticou excesso no uso
de grampos pelas polícias, Itagiba diz que não é contrário ao
uso desse expediente: "É um
instrumento fundamental para
investigação de crimes como
corrupção, tráfico de drogas,
terrorismo, seqüestros e outros. E é justamente por isso
que não se pode permitir que
caia no descrédito".
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