São Paulo, domingo, 09 de novembro de 2008

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ELIO GASPARI

A carta cubana de Barack Obama


O estabelecimento de relações racionais com a ilha é um fruto maduro, grátis e conveniente


A SORTE botou um pote de ouro na mesa de Barack Obama. Nele está o abrandamento do bloqueio econômico a Cuba. O primeiro passo ele anunciou no ano passado: "Darei aos cubano-americanos o direito irrestrito de visitar seus familiares e de remeter dinheiro para a ilha". À época, ele recuou e prometeu manter o embargo, pois corria o risco de queimar os 27 votos eleitorais da Flórida, onde vive uma grande comunidade de cubanos marcados pelo sofrimento do exílio imposto às suas famílias pela ditadura de Fidel Castro.
Obama ganhou na Flórida e o caso cubano, visto sem a pátina quase cinquentenária da hostilidade mútua, tornou-se uma falsa questão. Uma pesquisa feita no dia da eleição mostrou que 55% dos cubano-americanos com menos de 30 anos votaram em Obama.
O bloqueio econômico a Cuba é uma inutilidade anacrônica e desprimorosa. É inútil porque Fidel ficou gagá, mas não caiu. É anacrônica porque facilita a vida de empresários canadenses e europeus que se beneficiam da incipente abertura da economia castrista. Cuba vai se tornar um riquíssimo mercado imobiliário e, por enquanto, os americanos estão a chupar o dedo. O embargo é desprimoroso porque não cabe na idéia que se tem hoje de uma liderança política dos Estados Unidos. Filho do Muro de Berlim, ficou na orfandade. Hoje os americanos temem muito mais uma migração maciça de cubanos para a Flórida do que a propagação da senilidade castrista.
A equipe de Obama tem um diplomata experimentado no trato com a América Latina. É Anthony Lake, assessor para assuntos de segurança nacional no governo de Bill Clinton. Nos anos 70, ele trabalhou com o professor Henry Kissinger, que grampeou seu telefone por nove meses e pagou uma multa por isso. (Lake guarda o cheque numa moldura). Foi nomeado para a direção da CIA, mas a maioria republicana no Senado detonou-o. Lake tem na biografia um magnifico livro sobre a desastrosa diplomacia americana na Nicarágua depois da queda de Anastasio Somoza, em 1979. Expõe o funcionamento da burocracia do Departamento de Estado e da Casa Branca, lidando com informações incompletas, falta de tempo e ausência de percepção histórica. Se não tivessem tanta capacidade de fazer besteira, não teriam tentado depor o coronel Hugo Chávez.
Obama não precisa anunciar o fim do bloqueio, nem Raúl Castro precisa informar que o comunismo cubano se acabou. As duas coisas vão acontecer, mas o tempo cuidará do assunto. A partir de janeiro, os Estados Unidos e Cuba voltarão a conversar, como se o relógio do tempo, tendo parado, voltasse a funcionar. No dia 22 de novembro de 1963, foi enviado à Casa Branca um memorando que dava conta das negociações para um encontro de Fidel com um emissário do presidente dos Estados Unidos. No dia seguinte, John Kennedy desembarcou em Dallas, numa história conhecida.
Ao longo dos últimos 45 anos sempre existiram canais de comunicação entre os dois governos. As conversas progrediam e retrocediam, influenciadas por precondições capitulacionistas. Coisa semelhante ao que ocorreu com a China entre 1949 e 1971. Enquanto o guerrilheiro Carlos Lamarca, caçado no sertão da Bahia, desejava "longa vida ao presidente Mao", o Grande Timoneiro negociava uma aproximação com os EUA.
O intermediário que conseguiu melhores resultados em Cuba foi o empresário Bernardo Benes. Ele fugiu da ilha em 1960 e retornou 75 vezes levando e trazendo recados dos governos de Jimmy Carter e Ronald Reagan. Suas conversas com Fidel Castro somaram 150 horas e ajudaram a libertar 3.600 presos políticos.
A reaproximação com a União Soviética pouco custou ao presidente Roosevelt em 1933. A abertura chinesa tornou-se o melhor momento da biografia de Richard Nixon. Há pouco, George W. Bush acertou suas contas com o líbio Muammar Gaddafi e o assunto mal recebeu atenção. Obama colherá o fruto maduro.

0800-STF
O ministro Gilmar Mendes, presidente do STF, precisa decidir qual é seu lugar no estádio. Ele pode ficar na tribuna de honra, de toga, lendo votos capazes de servir de lição. Pode também vestir as camisas dos times de sua preferência, indo disputar a bola no gramado. Não pode fazer as duas coisas.
Não é próprio que um ministro do Supremo se meta em discussões do cotidiano político, dando entrevistas de salão, ensinando que "não dá para dizer que há imprescritibilidade de um lado [o dos torturadores da ditadura] e não há para o outro [o dos militantes esquerdistas que praticaram crimes de sangue]". Ele pode estar coberto de razão, mas ministro do STF não é call center, que responde a consultas imediatas. Nessa batida, vira comentarista jurídico.

FHC pela paz
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso será convidado para armar um protocolo de comportamento para José Serra e Aécio Neves, os dois tucanos que disputam a candidatura à Presidência. Se ninguém fizer nada, a aspereza pública aumentará e o tiroteio de bastidores derramará sangue.

A crise real
Um brasileiro passou por Miami e precisou comprar uma mala. Entrou numa loja e foi abraçado pelo dono: "O senhor é o primeiro cliente a entrar aqui em duas semanas. Eu tinha oito empregados, tive que dispensá-los e estou cuidando sozinho". O curioso decidiu testar o andar de cima. Foi a uma revendedora da Mercedes-Benz e perguntou o preço de um modelo E 350. Custava US$ 60 mil. Quando ele estava perto da porta o vendedor disse que baixava para US$ 36 mil.

Novo arcebispo
É imprudente mexer com notícias do Vaticano, mas parece que o papa Bento 16 aceitou a renúncia de d. Eusébio Scheid, arcebispo do Rio de Janeiro. Ele a encaminhou em dezembro, quando completou 75 anos. É possível que seu substituto venha a ser d. Filippo Santoro, atual bispo de Petrópolis. Ele tem 60 anos, nasceu em Bari, na Itália, e foi bispo auxiliar do Rio de 1996 a 2004.
Em tempos de Obama, é sempre bom lembrar que d. Eusébio defendeu a escolha de um cardeal africano para a sucessão de João Paulo 2º.

Bom exemplo
Fizeram papel feio os fundos brasileiros, sobretudo os de caixas estatais. Apanharam como cães danados das empresas que se meteram com derivativos tóxicos, mas reagiram com silencio siciliano. A primeira ação contra uma das empresas intoxicadas (a Sadia) partiu de Westchester Putnam, um fundo de trabalhadores dos EUA.

Eremildo, o idiota
Eremildo é um idiota a acredita que Nosso Guia aderiu ao entendimento de que a imprensa tem uma opção preferencial pelas notícias ruins, sobretudo a respeito do seu governo. Num psicologuês de lanchonete, perguntou o seguinte:
"Ou será que a nossa cabeça está condicionada a pensar que o bom é obrigação fazer e só o mau tem que mostrar?"
O idiota concorda com Lula, mas não consegue resolver um problema. Dias antes da eleição de outubro, ele disse aos jornalistas: "Podem escrever: Marta vai ganhar em São Paulo".
Eremildo suspeita que fraudaram o resultado. Do contrário, nem um idiota é capaz de entender o condicionamento da cabeça do presidente.


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