São Paulo, sábado, 10 de janeiro de 2004

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QUESTÃO INDÍGENA

Ministério da Justiça reafirma que reserva será homologada, mas vai discutir retirada dos não-índios

Fazendeiros liberam rodovias em Roraima

DA AGÊNCIA FOLHA, EM BOA VISTA
DA AGÊNCIA FOLHA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Depois de quatro dias de bloqueio, as rodovias de Roraima foram liberadas ontem pelos fazendeiros que protestam contra a homologação da reserva indígena Raposa/Serra do Sol após a negociação com um "gabinete de crises" criado pelo governador.
A liberação ocorreu por volta das 12h (hora local, 14h em Brasília), horas antes de o governador Flamarion Portela (que se afastou do PT) se reunir em Brasília com o ministro Márcio Thomaz Bastos (Justiça) e com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
"Ele está incentivando as manifestações, junto aos fazendeiros", disse Jacir José da Silva, coordenador do CIR (Conselho Indígena de Roraima), que defende a homologação da reserva. O secretário de Segurança Pública, Francisco Sá Cavalcanti, disse que houve apenas um trabalho de convencimento junto aos manifestantes. "Mostramos a eles que o objetivo maior, chamar a atenção do Brasil para a situação de Roraima, já tinha sido atingido, tanto que o governador ia lá conversar com o presidente em Brasília", disse.
O Ministério da Justiça, porém, não cedeu aos apelos do governador e da bancada federal do Estado na reunião e manteve a homologação contínua da reserva Raposa/Serra do Sol, mas criou um comitê de transição para discutir a retirada dos não-índios da área.
"Houve uma posição autocrática do governo federal no sentido da homologação contínua, já que a bancada veio apenas para ser informada. Não houve consideração aos pleitos que a bancada apresentou", resumiu o deputado Alceste Almeida (PMDB).
Márcio Thomaz Bastos interrompeu a reunião com a bancada a chamado do Planalto. A Folha apurou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez questão de dizer a Flamarion que é uma decisão de governo homologar a reserva de forma contínua. Em entrevista no Planalto, Bastos declarou: "Temos o referencial de janeiro para a homologação, mas pode ser que não saia".
Como medida compensatória pela homologação, Flamarion e os parlamentares pediram a cessão de 5 milhões de hectares de terras federais para o Estado. Essa área serviria para assentar os produtores de arroz que estão no interior da reserva e receberia, também, empresas rizicultoras.
A reserva ocupa uma área de 1,75 milhão de hectares, dos quais 15 mil são utilizados por não-índios. Com a homologação, os não-índios precisam deixar a área. O impasse hoje é justamente para onde eles irão. Os 5 milhões pedidos pela bancada pertencem ao Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), que exige do governador a elaboração de um plano de uso para a terra. A Folha apurou que o governo federal resiste à idéia de transferir terras para Roraima.

Protestos
Desde terça-feira, agricultores e índios contrários à homologação da área promovem uma série de protestos em Roraima, com a ocupação de prédios públicos e o bloqueio de estradas. O estopim foi a declaração do ministro Márcio Thomaz Bastos, dada em 22 de dezembro, de que a homologação ocorrerá ainda neste mês.
Na quarta-feira, o governador criou o Gabinete Provisório de Gerenciamento de Crises para tentar debelar a crise. O secretário de Segurança, na condição de presidente do gabinete provisório, comandou as conversas com os manifestantes, que resultaram na suspensão dos bloqueios.
Ontem à noite, o Movimento Pró-Roraima, que reúne os manifestantes contrários à criação da reserva em área contínua, anunciou na noite de ontem que irá pedir ao STF (Supremo Tribunal Federal) a nulidade do processo de homologação da reserva.
"Achávamos que seria mais fácil resolver a questão pela via política. Como não deu certo, vamos tentar a via jurídica", disse Dirceu Vinhal, presidente da cooperativa Grão-Norte e um dos líderes do movimento. Segundo o advogado dos manifestantes, Luiz Travassos, houve uma série de "vícios" no processo de homologação que podem levar à sua nulidade. Ele afirma que o processo não levou em conta a existência de dois municípios na área da Raposa/Serra do Sol -Pacaraima e Uiramutã.
O movimento ainda não havia decidido, até o fechamento desta edição, se voltaria a bloquear as rodovias do Estado em protesto contra a decisão do ministro sobre a homologação da reserva.


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