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São Paulo, segunda-feira, 10 de fevereiro de 2003

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SOB SUSPEITA

Governo Garotinho, com aval de Silveirinha, deu isenção de R$ 53 mi a companhia que não produz no Estado

Rio deu incentivo fiscal para obra no RS

MURILO FIUZA DE MELO
DA SUCURSAL DO RIO

Muitos dos 3.700 habitantes de Garruchos (oeste do Rio Grande do Sul) jamais viram o mar do Rio de Janeiro, mas devem ao Estado o incremento da economia local.
Entre abril de 1999 e março de 2001, a Secretaria de Fazenda do Rio, com o aval do fiscal Rodrigo Silveirinha Corrêa, concedeu isenção de ICMS, no total de R$ 53 milhões, para a importação de equipamentos destinados à construção de uma estação conversora de energia elétrica em Garruchos, que fica a 2.250 quilômetros da capital fluminense, na fronteira com a Argentina.
A empresa beneficiada foi a Cien (Companhia de Interconexão Energética), controlada pelo grupo espanhol Endesa, com sede no Rio. Apesar do incentivo fiscal, a Cien nunca produziu nada no Estado. A operação foi considerada irregular por tributaristas ouvidos pela Folha.
A autorização de isenção de ICMS foi dada pelo então secretário de Fazenda no governo Anthony Garotinho (1999 a abril de 2002), Carlos Antônio Sasse, que encaminhou o pedido a Silveirinha, na época secretário-adjunto de Administração Tributária, para tomar "as providências necessárias". O pedido foi publicado em 13 de abril de 1999.
Silveirinha é suspeito de comandar um esquema de corrupção na Fazenda estadual que teriam enviado irregularmente US$ 36 milhões para contas na Suíça.
Em maio de 98, a Cien assinou convênio com a Gerasul (Centrais Geradoras do Sul do Brasil S.A) para a construção de uma estação conversora de energia elétrica, em Garruchos.
Em dezembro de 1998, a empresa deu entrada na Secretaria de Fazenda com um pedido de isenção de ICMS, com base em uma autorização do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, que a isentou do pagamento do Imposto de Importação (II) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), em regime de "drawback" para fornecimento interno. O drawback para fornecimento interno é um benefício fiscal concedido a empresas que desejam importar insumos não existentes no país, para produção de produtos destinados ao mercado interno.
O pedido da Cien só foi aceito cinco meses depois, quando Sasse e Silveirinha já estavam na Fazenda. Um parecer da assessoria jurídica da Fazenda, de 12 de março de 2001, obtido pela Folha, mostra que a concessão do benefício fiscal gerou uma discussão interna. "É oportuno destacar que essa discussão interna, em certos lances, chegou a superar os limites da hierarquia e da disciplina funcional, com pronunciamentos de agentes subalternos em afronta a manifestações de autoridade superior", afirma o procurador Joaquim Ferreira Filho, que assina o parecer.
O procurador diz que a discussão foi "pacificada" com a decisão de Sasse de abril de 1999. Com base nessa decisão, Ferreira Filho autorizou a Cien a fazer uma nova importação de produtos com isenção de ICMS. O parecer teve novamente o aval de Silveirinha.
Ferreira Filho chegou a argumentar que a concessão de "efeitos de estímulos ou benefícios fiscais" traria "incentivo do desenvolvimento econômico".
"O drawback prevê necessariamente um benefício social como contrapartida. Neste caso, se trata de drawback no ICMS, que é um imposto estadual, e o Executivo estadual não pode dar benefício para outro Estado", afirma o tributarista José Ruben Marone.



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