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São Paulo, segunda-feira, 10 de fevereiro de 2003

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BRASIL PROFUNDO

Irmã de Paulo César Farias é proprietária; funcionários dizem que ex-deputado Augusto Farias é o administrador

Fazenda da família de PC mantinha escravos

MAURO ALBANO
EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA

Fiscais do Ministério do Trabalho e agentes da Polícia Federal localizaram no fim de semana 34 trabalhadores em situação análoga à escravidão durante uma blitz em fazenda da família de Paulo César Farias, o PC, em Santana do Araguaia (1.032 km de Belém, no sul do Pará).
Além deles, outros 83 empregados da fazenda estavam submetidos a regime semelhante, mas foram retirados do local na semana passada e enviados a pensões de Redenção, a cerca de 300 quilômetros da fazenda. Segundo os trabalhadores, a intenção da direção da fazenda era justamente "driblar" a fiscalização.
A fazenda, chamada Santa Ana Agropecuária Industrial, é uma sociedade anônima que tem como presidente Eleusa Maria Cavalcante Farias Leôncio, irmã de PC (morto em 1996) e do ex-deputado federal Augusto Farias (PPB-AL).
Os trabalhadores da Santa Ana disseram ainda que a fazenda seria administrada por Augusto Farias, que a visitava frequentemente, e que ele teria abandonado a região na véspera da blitz. Fiscais federais, que chegaram ao local na sexta-feira à noite, não puderam confirmar a informação.
A equipe do grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho vai exigir o pagamento dos direitos trabalhistas do grupo de 117 peões. A maioria deles não tinha carteira de trabalho assinada.
Três deles estavam escondidos em uma área de desmatamento que não teria sido autorizada pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), segundo o ministério. Foram apreendidas 25 motosserras. O advogado da fazenda afirmou que a derrubada das árvores estava autorizada (leia texto nesta página).
De acordo com os fiscais, os trabalhadores da fazenda se encontravam na situação chamada "escravidão por dívidas": eram obrigados a se endividar com os capatazes para pagar por artigos que o próprio fazendeiro deveria fornecer. Na Santa Ana, os peões precisavam pagar o aluguel das redes que usavam para dormir.
Como eles estavam devendo sempre mais do que deveriam receber, seu serviço não era pago -ou era pago apenas parcialmente. A maior parte dos peões trabalhava lá desde outubro do ano passado. Eles disseram ter sido contratados para derrubar parte da mata da fazenda a R$ 140 por alqueire.
Os trabalhadores também não tinham como abandonar a fazenda: a estrada de asfalto mais próxima está a 160 quilômetros de distância. A condição em que os peões se encontravam foi descrita como "subumana" pelos fiscais e pelos agentes. Eles não tinham água potável e sua comida estava acondicionada em latões.
A blitz na Santa Ana foi a sexta ação de combate ao trabalho escravo do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Nas cinco fiscalizações anteriores -realizadas a partir de janeiro no Pará, Mato Grosso e Maranhão-, 387 trabalhadores foram libertados.
Na última sexta, o ministro Jaques Wagner (Trabalho) declarou que o governo vai lutar pelo aprovação de uma emenda constitucional que prevê o confisco de terras cujos proprietários tenham utilizado mão-de-obra escrava.
O secretário nacional dos Direitos Humanos, Nilmário Miranda, calcula que existam 25 mil brasileiros submetidos ao trabalho análogo à escravidão. O sul do Pará e o norte do Mato Grosso são as regiões onde esse tipo de exploração é mais frequente.



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