São Paulo, domingo, 10 de fevereiro de 2008

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Sociedade vê juiz a favor do poder e contra mais pobres, diz ministro

Para Napoleão Maia Filho, do STJ, investigados têm "direito à paz de espírito"

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Napoleão Maia Filho diz que "os juízes são vistos em geral como pessoas a serviço do poder, contra os mais pobres, os miseráveis". Ao justificar a liminar pela qual concedeu acesso ao inquérito da Polícia Federal aos advogados de Fernando Sarney, ele disse que os investigados têm "direito à paz de espírito", incluindo acusados de tráfico e de assassinatos. (HUDSON CORRÊA E LEONARDO SOUZA)

 

FOLHA - Nesse caso que o sr. cita [em que também concedeu liminar dando vistas ao inquérito], a pessoa já havia sido presa e condenada [por homicídio]. O sr. compara com o do Fernando Sarney?
NAPOLEÃO MAIA FILHO -
Eu comparo. Coloco no mesmo nível todos os direitos subjetivos. O direito à vida é o principal. O direito à liberdade, o direito à propriedade, o direito ao sossego, o direito à tranqüilidade, à paz de espírito. O sujeito ser preso, perder bens, ser desassossegado constantemente por investigação, sem ter direito de saber quem o está acusando? Não me disponho a proteger esse tipo de situação. Acho preferível que o indivíduo dê as explicações que tiver, que quiser.

FOLHA - Ainda que haja risco de o investigado apagar provas, tentar intimidar possíveis testemunhas?
MAIA FILHO -
Esse é um argumento para atemorizar o investigado. É possível [apagar provas etc.]? É. É plausível? Isso é que precisa ser visto.

FOLHA - O sr. foi pressionado no caso do Fernando Sarney?
MAIA FILHO -
Sinceramente, nunca ninguém me pressionou para fazer ou deixar de fazer. Com toda a franqueza, eu nunca fui peitado.

FOLHA - E a repercussão de sua decisão, o sr. não considera pressão?
MAIA FILHO -
Considero uma pressão e uma intimidação.

FOLHA - Por parte de quem, da imprensa?
MAIA FILHO -
Da imprensa não, que está cumprindo o papel dela. Da sociedade, que fica pensando que sou favorável a que se ocultem as coisas.

FOLHA - Por que o sr. acha que a sociedade tem essa idéia?
MAIA FILHO -
Porque o Judiciário não é bem avaliado pela sociedade. Bem avaliados são a Polícia Federal, o Ministério Público, a imprensa. Os juízes são vistos em geral como pessoas a serviço do poder, contra os mais pobres, os miseráveis.

FOLHA - O sr. considera a pressão da sociedade uma forma de intimidação?
MAIA FILHO -
Há a possibilidade de se criar no espírito do julgador um certo comodismo para ele não afrontar as coisas que a sociedade gosta de ver realizadas.

FOLHA - Como corruptos na cadeia?
MAIA FILHO -
Como corruptos na cadeia. Então corruptos não têm direito a defesa? Vi um professor de direito constitucional em Recife [dizer] sobre o saudoso Antonio Carlos Magalhães: "Não precisa ser julgado. Pode ser preso imediatamente. Por quê? É óbvio que é corrupto". A mesma coisa em relação a Maluf. Será que fez ou faz mesmo aquilo que se imputa a ele? E ninguém consegue pôr a mão neste homem?

FOLHA - Mas o que o sr. acha das acusações contra o Maluf?
MAIA FILHO -
Não sei. O senhor jornalista, certamente da linha investigativa, é sua obrigação desconfiar de tudo que tem um jeito, um cheiro exótico. Agora, minha obrigação, ou função como magistrado, é não desconfiar e achar que está inocente.

FOLHA - Em sua opinião, existe um prejulgamento no Brasil de que todo político é corrupto?
MAIA FILHO -
Não todo político. Há políticos que são tão blindados que nada pega neles.

FOLHA - O sr. acha que o Sarney é blindado?
MAIA FILHO -
Sarney não é blindado. De jeito nenhum. Não vê o que o governador [Jackson Lago, do Maranhão] faz com ele? E o anterior [José Reinaldo Tavares]? Renan [Calheiros] não é blindado.O presidente Lula é blindado. Pode dizer o que quiser que nele não pega. O José Serra é quase blindado. Os governadores do Ceará [Cid Gomes] e de Pernambuco [Eduardo Campos] são blindados. Vai falar mal dele no Pernambuco. Sai de lá correndo.

FOLHA - Blindado em relação à imprensa, ao Judiciário?
MAIA FILHO -
Em relação à sociedade.


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