São Paulo, segunda-feira, 10 de março de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ENTREVISTA / ANTONIO PALOCCI FILHO

Terei oportunidade de demonstrar que nunca quebrei o sigilo de ninguém

Ex-ministro rebate acusação da Procuradoria Geral da República de ter violado sigilo bancário do caseiro Francenildo e diz ter sempre agido com respeito à lei

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ex-ministro da Fazenda e deputado federal Antonio Palocci Filho (PT-SP) rebateu o principal argumento do Ministério Público para sustentar que seria "indubitável" sua participação na quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa -episódio que o tirou do governo Lula em 2006.
Em denúncia ao STF, oferecida em 22 de fevereiro passado, a Procuradoria Geral da República disse que houve trocas de telefonemas no dia da violação entre Palocci e auxiliares, apontando proximidade dos horários das ligações com a quebra do sigilo. "Seria estranho se eu não tivesse telefonemas com meus assessores", afirmou o ex-ministro.
Segundo Palocci, ele terá "só agora" a "oportunidade" de se defender devido ao "ordenamento do processo" no STF. "Vou demonstrar que não quebrei sigilo de ninguém." O ex-ministro disse que não se estenderia nos comentários porque prejudicaria sua defesa. Para o principal auxiliar econômico de Lula no primeiro mandato, a queda do dólar "vai assustar", mas não afetará o ritmo de crescimento do Brasil.

 

FOLHA - Quais serão os efeitos da crise mundial que nasce de uma fragilidade na economia dos EUA?
ANTONIO PALOCCI FILHO -
Se a crise se aprofundar, o mundo pode se tornar mais protecionista, o que será um retrocesso. A crise é grave, mas o ciclo de crescimento mundial não parece que será interrompido, pois há incorporação de produtividade enorme nos emergentes e avanços em pesquisa e desenvolvimento nos países ricos. A abertura comercial aumentou muito a transferência de tecnologia, o que leva a ganhos de produtividade generalizada. Por isso o ciclo é tão longo. Mas ainda é cedo para fazer previsões definitivas. Os mercados de crédito e os mercados de ações estão muito afetados.

FOLHA - O Brasil se descolou da crise mundial?
PALOCCI -
O Brasil engatou uma fase de crescimento econômico que pode durar dez anos. O Brasil vingou porque eliminou os três fatores de risco que geraram as nossas últimas dez crises: a inflação, o resultado fiscal e a dívida em moeda estrangeira. Hoje, há equilíbrio fiscal. Na prática, acabou a dívida em moeda estrangeira. E controlamos a inflação. No fiscal, o governo está entregando as metas ano a ano. A dívida pública está em trajetória descendente. Nas últimas décadas, nunca tivemos uma combinação de fatores tão favorável.

FOLHA - A inflação, que ameaçou subir, pode ser um problema?
PALOCCI -
A inflação sempre terá que ser vigiada de perto. Ela tem sido um problema para muitos países, pelo preço dos alimentos e de outras commodities. No Brasil, ela terá que ser acompanhada, mas o Banco Central já mostrou que sabe agir quando é preciso.

FOLHA - Há quem veja risco de faltar energia para sustentar esse ciclo de crescimento.
PALOCCI -
Não acho que faltará energia, desde que tenhamos maciços investimentos nos próximos meses e anos, na medida em que faz muito tempo que não temos um ciclo tão longo de crescimento.

FOLHA - A queda do dólar comprometerá o crescimento da economia?
PALOCCI -
Não creio. Esse novo momento de queda vai assustar, mas há muitos setores transformando o fato em oportunidade, adquirindo equipamentos e insumos que trarão grandes ganhos de produtividade. A modernização das empresas brasileiras veio para ficar e inclui aumento de produtividade, acesso ao crédito e ao mercado de capitais, melhora de governança, esforço exportador e investimento dentro e fora do Brasil.

FOLHA - O BC não deveria voltar a baixar os juros?
PALOCCI -
Seria muito bom que um dia pudesse fazê-lo. Mas não me parece que este dia esteja num curto horizonte.

FOLHA - Qual será a fotografia histórica do governo Lula?
PALOCCI -
Oito anos de Lula farão muito bem ao Brasil. Racionalidade econômica e forte preocupação social resultarão numa bela arrumada em nossa distribuição de renda. O povo trabalhador está tendo ganhos importantíssimos. Não só os trabalhadores. As empresas brasileiras nunca estiveram tão bem. O Brasil também melhorou em outros governos. Não há dúvida de que este período marcará a história do Brasil, mas ainda há muito o que fazer.

FOLHA - No poder, PT e PSDB aplicaram receitas semelhantes. Não deveriam fazer uma aliança em vez de se matar no dia-a-dia?
PALOCCI -
Fazer ou não uma aliança é uma questão que depende de muitos fatores. Mas não tenho dúvidas de que o Brasil se beneficiaria se entre governo e oposição houvesse um clima mais construtivo. As disputas eleitorais fazem parte da democracia. Mas isso não deveria impedir um esforço comum em torno dos grandes temas para realizar as reformas pendentes. Elaborar algumas regras de política fiscal de longo prazo seria muito bom também. Grandes temas, que dizem respeito a questões estratégicas e institucionais, deveriam receber um tratamento suprapartidário. Infelizmente o clima de diálogo para construção de políticas anda muito restrito.

FOLHA - A polícia e a oposição suspeitam de acordo do sr. com Rogério Buratti para que ele retirasse as acusações sobre sua gestão como prefeito em Ribeirão Preto.
PALOCCI -
Não falo com ele desde antes da primeira denúncia. O que o levou a fazer isso agora só pode ser esclarecido por ele.

FOLHA - Na denúncia ao STF, a Procuradoria Geral da República disse ser "indubitável" sua participação na violação do sigilo do caseiro Francenildo Costa.
PALOCCI -
Só agora terei oportunidade de me defender, pelo ordenamento do processo. Vou demonstrar que não quebrei sigilo de ninguém. Aliás todos sabem que meu trabalho no Ministério da Fazenda foi de rigidez na política econômica e de absoluto respeito à lei. Mesmo porque não seria possível fazer uma coisa sem a outra.

FOLHA - A denúncia aponta cruzamento de telefonemas entre o sr., seu assessor e o presidente da Caixa, Jorge Mattoso, no dia da quebra do sigilo bancário do caseiro.
PALOCCI -
Seria estranho se eu não tivesse telefonemas com assessores e autoridades vinculadas ao Ministério da Fazenda. Não vou falar mais deste assunto. Pode atrapalhar minha defesa. Procure meu advogado.


Texto Anterior: Outro lado: Recursos são otimizados, afirma Ibama
Próximo Texto: Entrevista da 2ª/ Juan Gabriel Tokatlian: Lógica da "guerra contra o terror" ameaça democracias latino-americanas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.