São Paulo, quinta-feira, 10 de maio de 2007

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A visita do papa/análise

Sucessor de Pedro Apóstolo

Papa Bento 16 ressalta seu papel como guardião da unidade da Igreja Católica

PAULO DANIEL FARAH
ESPECIAL PARA A FOLHA

EM TRAJES imaculadamente brancos, à exceção dos sapatos vermelhos tradicionalmente utilizados pelo papa, Bento 16 recordou por duas vezes em seu primeiro pronunciamento, e em outra posteriormente, no mosteiro de São Bento, que veio como "sucessor do apóstolo Pedro", o primeiro papa, indicado por Jesus Cristo como o líder da igreja, sua rocha de base e sustentáculo.
Para os católicos, o papa é o sucessor de São Pedro, o primeiro bispo de Roma, no governo da Igreja Católica Romana. Destarte, é o guardião da unidade da Igreja Católica e exerce autoridade sobre os fiéis; sua palavra deve ser respeitada.
O anel do papa traz a imagem do "pescador de homens": Pedro Apóstolo, Príncipe dos Apóstolos (o papa, como indicam as iniciais). Considerado pela Igreja Católica como o representante de Jesus Cristo na terra (o que corrobora sua infalibilidade em questões vinculadas à fé), "o chefe (ou a cabeça) visível de toda a igreja", Bento 16 fez um discurso marcado pelos advérbios que reforçam a exortação da identidade católica e o papel do país como modelo para toda a região.
Saudou "fraternalmente os irmãos de fé ("irmãos no senhor"), exortou o testemunho de uma vida "autenticamente cristã", anunciou uma conferência "essencialmente missionária" e afirmou sua convicção de que os "valores radicalmente cristãos" da América Latina não serão eliminados. Clara é a ênfase na relevância da região.
Teólogo acostumado a atuar nos bastidores, ao assumir o papel de Santo Padre e de homem público não repetiu gestos que marcaram o pontificado anterior. Bento 16 não seguiu o costume de João Paulo 2º de beijar o solo da terra que visitava (antes de a fragilidade física o obrigar a abandonar o gesto que marcou a maioria de suas viagens e crianças passarem a levar-lhe a terra local numa bandeja). O papa atual não o fez ontem e tampouco o fez em outras ocasiões, mesmo em sua terra natal, na Alemanha, durante a Jornada Mundial da Juventude, em Colônia.
Bento 16 conservou como papa os símbolos que utilizava enquanto cardeal, com algumas poucas alterações.
Ao que parece a altura da barra de suas vestes foi levemente erguida (cerca de três polegadas acima do tradicional, de acordo com alguns observadores no Vaticano), o que possibilita uma visão clara de seus sapatos vermelhos.
Na tradição cristã, o vermelho representa o sangue derramado do sacrifício de Cristo e dos mártires, além de amor fervoroso e vitorioso. O vermelho nos sapatos do papa e nas vestes dos cardeais sugere disposição em morrer pela igreja. Pela associação com a paixão de Cristo, essa cor também marca a Sexta-Feira Santa.
Com seus cabelos brancos cobertos parcialmente pelo solidéu ("somente a Deus", em latim), o barrete portado em respeito e reconhecimento à superioridade de Deus, e os trajes em branco (uma das cores mais vinculadas ao sagrado) para simbolizar a pureza e a perfeição, Joseph Ratzinger condenou qualquer ameaça à vida, de sua concepção ao término natural (a rejeição se refere ao aborto, à eutanásia e às pesquisas com embriões).
Seu brasão pessoal traz uma grande concha que recorda a lenda atribuída a Santo Agostinho, que, ao encontrar uma criança na praia que tentava colocar toda a água do mar em um buraco na areia com uma concha, compreendeu ser impossível entender o mistério de Deus. Ademais, a concha é usada há séculos para representar o peregrino. Os dois símbolos laterais são da tradição bávara.
As chaves no brasão, uma de ouro e a outra de prata, associam-se a São Pedro e simbolizam o poder espiritual e o poder temporal. A heráldica eclesiástica reproduz as regras da civil para a composição e a definição do escudo, embora posicione no entorno símbolos de insígnias de caráter eclesiástico e religioso, de acordo com os graus da ordem sacra, da jurisdição e da dignidade. Como indica o núncio apostólico Andrea Cordero di Montezemolo, nos últimos oito séculos, os papas possuem seu brasão pessoal, além dos simbolismos próprios da Sé Apostólica. Brasões papais aparecem, além da faixa, em publicações e decretos vários.


PAULO DANIEL FARAH é professor na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo


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