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ESTUDO BRASILEIRO
Levantamento coordenado por Marcelo Neri diz que seria necessário gastar R$ 1,69 bilhão mensalmente para erradicar a fome
País tem 50 milhões de indigentes, diz FGV
ANTÔNIO GOIS
FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO
O Brasil tem hoje 50 milhões de
pessoas (29,3% da população) em
situação de indigência e seria necessário gastar R$ 1,69 bilhão
mensalmente para erradicar a fome no país. Essa é a tese de um estudo lançado ontem pelo Centro
de Políticas Sociais da FGV (Fundação Getúlio Vargas), chefiado
pelo economista Marcelo Neri.
O governo federal contesta os
dados. Com base numa metodologia diferente, a Secretaria de Assistência Social afirma que existem apenas 20 milhões de indigentes no país (veja texto ao lado).
Pelos cálculos de Marcelo Neri,
coordenador do trabalho da FGV,
um indigente sairia da miséria
com um aumento médio de R$ 34
em sua renda mensal. Ele usou
dados populacionais e de renda
das Pnads (Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios).
De acordo com esse estudo, se
cada brasileiro não-indigente
transferisse R$ 14 mensais de sua
renda para os miseráveis do país,
seria possível erradicar a fome.
Em sua metologia, o estudo
classificou como indigentes pessoas com renda mensal inferior a
R$ 80, valor necessário, de acordo
com preços de São Paulo, para garantir a ingestão mínima de alimentos recomendada pela Organização Mundial de Saúde. Já na
metodologia do governo, só os
que recebem menos de um terço
de salário mínimo são indigentes.
Neri disse que seu estudo define
como indigentes pessoas que, em
outras metodologias, seriam consideradas pobres: "O governo
pensa diferente. Eu faço parte de
uma instituição independente".
O volume de recursos a ser
transferido dos não-indigentes
para os miseráveis varia de Estado
para Estado. Uma conta feita pela
Folha, com base na metodologia
do estudo, mostra que em São
Paulo esse valor seria de R$ 4,20
mensais, enquanto no Maranhão
ele chegaria a R$ 70,20.
O economista critica a falta de
foco das políticas sociais brasileiras no combate à miséria: "Erradicar a fome não é uma questão
de volume de recursos, mas de
distribuição deles. A política social brasileira não atinge o pobre.
Ela erra o alvo", afirma Neri.
Segundo o economista, os governos federais, estaduais e municipais somados investem anualmente na área social 20,9% do PIB
nacional, volume suficiente para
erradicar a miséria.
Para Neri, é preciso focalizar as
políticas sociais nos grupos mais
pobres da população, para melhorar a distribuição da renda no
país. O volume de R$ 1,69 bilhão
mensal poderia vir, na análise do
economista da FGV, tanto dos governos como da própria sociedade civil, num esforço conjunto para acabar com a fome no país.
Neri chegou a calcular qual teria
de ser a colaboração de cada brasileiro para a erradicação da fome
e encontrou R$ 10, caso esse conjunto de contribuintes incluísse
os indigentes. A pedido da Folha,
refez a conta excluindo os indigentes e obteve o valor de R$ 14.
Distribuição de renda
O que o estudo mostra é que, no
Brasil, o problema da pobreza não
é de falta de recursos, mas de má
distribuição de renda, e tenta
comprovar isso em três cenários.
No primeiro cenário, com um
crescimento da renda per capita
de 21% em cinco anos, mas sem
distribuição de renda, a taxa de
indigência cairia de 29,3% para
24,1%. No segundo cenário, com
economia estável e crescimento
zero, mas redução da concentração de renda (baixando o índice
de Gini de 0,59, taxa do país, para
0,54, taxa de São Paulo), a indigência cairia para 21,6% -mais
que no cenário de crescimento
sem redistribuição de renda.
O índice de Gini é um padrão
internacional de medição da concentração de renda. Varia de 0
(renda igualmente distribuída) a 1
(hipotética situação em que uma
pessoa concentra toda a renda).
Por fim, no terceiro cenário,
mesclando o mesmo crescimento
econômico e a mesma redução da
concentração de renda, a indigência cairia quase pela metade -de
29,3% para 15,79%.
Neri afirmou que, no biênio
1998-1999, a miséria caiu 1,5% ao
ano no Brasil em comparação
com o biênio 1996-1997.
Pelos dados da PME (Pesquisa
Mensal de Emprego) do IBGE, em
2000 a miséria caiu 5,1% em seis
regiões metropolitanas brasileiras, na comparação com 1999. A
maior queda foi em Salvador
(9,1%), e a menor, no Rio (1,9%).
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