São Paulo, segunda-feira, 11 de março de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CAPITALIZAÇÃO

Para procuradora, Grupo Silvio Santos fez "apropriação indevida" de US$ 1 bilhão em 11 anos

Parecer vê Tele Sena como "aventura"

XICO SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Em parecer emitido na última segunda-feira, o Ministério Público Federal acusou a Liderança Capitalização, empresa do Grupo Silvio Santos, de "apropriação indevida" de US$ 1 bilhão nos últimos 11 anos -R$ 2,3 bilhões em valores de hoje- dos compradores de cartelas da Tele Sena.
A procuradora regional da República Maria Iraneide O. Santoro Facchini concluiu que a Tele Sena não funciona como título de capitalização, objetivo para a qual foi criada e aprovada oficialmente pelo governo em 1991, mas como jogo de azar comum.
Segundo o texto do parecer, a Tele Sena é uma aventura que descapitaliza a população carente e enriquece o Grupo Silvio Santos.
A legislação federal não permite exploração de loterias pela iniciativa privada -a ação é exclusiva do poder público, encarregado de repassar um percentual da arrecadação para programas sociais.
"É sabido que -como a publicidade maciça e enganosa iludia os incautos "investidores", mas interessados no aspecto do jogo de azar, pressurosos de, num passe de mágica, obter prosperidade- certamente [os compradores" jogavam fora a cartela, sem reclamar a devolução da metade "capitalizada'", diz o parecer.
O que ocorre com a Tele Sena, segundo a procuradora, é o mesmo que foi registrado no caso do Papa-Tudo, suposto título de capitalização do especulador Arthur Falk, que sofreu intervenção da Susep (Superintendência de Seguros Privados e Capitalização).
No caso do Papa-Tudo, divulgado pela TV Globo, cerca de 40% dos "investidores" não resgatavam os títulos, pois, a exemplo da Tele Sena, achavam que estavam participando apenas de um jogo.

Estimativa
O cálculo sobre a apropriação indevida por parte do Grupo Sílvio Santos foi feito nessa mesma base, de acordo com o Ministério Público. O faturamento total da Tele Sena desde 91 foi de R$ 5,75 bilhões, segundo informou a Liderança Capitalização à Justiça.
Se pelo menos 40% dos compradores não recuperaram seus títulos, a empresa ficou com R$ 2,3 bilhões, o que é irregular. O dinheiro não resgatado deveria ser transferido a algum fundo público que beneficiasse a população.
Segundo especialistas, essa estimativa (40%) é tímida. Avalia-se que, por causa do valor insignificante dos resgates, 95% dos compradores das cartelas acabam não recuperando os recursos.
"Como a legislação não permite loteria de propriedade privada, criou-se essa desculpa para legalizar o jogo de azar", diz o advogado Luiz Nogueira, que representa o ex-deputado estadual Antonio Carlos Tonin (PMDB), autor da ação que resultou no processo contra a Tele Sena.
Pelas regras aprovadas pelo governo, ao final de um ano o comprador tem direito a resgatar 50% do que gastou, com juros (0,01%) e correção monetária. A cartela custa R$ 5, o que garante a recuperação de cerca de R$ 2,60.
O processo tramita desde 92. Em 97, o juiz federal João Batista Gonçalves, da 6ª Vara, condenou a Liderança, anulando a autorização do governo para o suposto título de capitalização.
Segundo a sentença, a Tele Sena não passa de jogo de azar travestido de título de capitalização. Os réus recorreram da decisão. O caso deve ser julgado pelo TRF, em São Paulo, nos próximos dias.
O Ministério Público emitiu o seu parecer por causa de embargos infringentes (contestações a partes do processo) que foram feitos pelo autor da ação. Embora tenha condenado a Tele Sena em primeira instância, a Justiça tem entendido como legal o contrato, para venda de cartelas, do grupo Sílvio Santos com a ECT (Empresa Brasileira de Correios).
No seu parecer, a procuradora afirma que o contrato é lesivo.



Texto Anterior: Judiciário: 3 juízes do TRF no Rio são acusados de improbidade administrativa
Próximo Texto: Imprensa: História da Folha é tema de seminário
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.