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Para procuradores, ministro do STF age em causa própria
Gilmar Mendes, que quer alterar lei da improbidade, é alvo de denúncia por suposto enriquecimento ilícito no governo FHC
Magistrado é crítico de denúncias que considera "ineptas" do Ministério Público Federal; ele não quis falar sobre as acusações
FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL
O julgamento que poderá decidir no STF (Supremo Tribunal Federal) o fim da lei de improbidade administrativa, um
alívio para políticos e magistrados acusados de corrupção,
acirrou os ânimos entre procuradores e o ministro Gilmar
Mendes, um crítico contundente de denúncias que considera "ineptas" oferecidas pelo
Ministério Público Federal.
Alguns procuradores atribuem a indisposição ao fato de
o vice-presidente do STF também ser alvo de ações de improbidade, numa das quais é acusado de enriquecimento ilícito.
Mendes poderá ser beneficiado com a decisão que o STF
vier a tomar sobre uma reclamação do ex-ministro de Ciência e Tecnologia Ronaldo Sardenberg, também acusado de
improbidade. Esse julgamento
foi retomado no último dia 1º.
Em abril do ano passado, a
ministra Ellen Gracie suspendeu o processo contra Mendes,
condicionando-o à apreciação
da reclamação de Sardenberg.
Para o Ministério Público Federal, Mendes espera que prevaleçam os votos anteriores,
extinguindo a ação de Sardenberg, prevendo que a sua seguiria o mesmo rumo.
"Ações políticas"
Em 2002, o procurador da
República Luiz Francisco Souza ofereceu ação de improbidade contra Mendes, acusando-o
de enriquecimento ilícito
quando advogado-geral da
União, no governo FHC.
Sócio-cotista do Instituto
Brasiliense de Direito Público
-IDP Ltda., de Brasília, Mendes, diz a acusação, "lecionava
em sua própria empresa, no horário de trabalho, e permitia a
liberação de subordinados para
assistir as aulas". "Permitiu que
seus subordinados usassem o
poder da entidade e do órgão
que dirigia para beneficiar-se e
para que sua empresa obtivesse
receita e lucros."
No último dia 2, o ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles rompeu o silêncio
e repudiou as críticas que Mendes fez a procuradores na sessão de julgamento da reclamação de Sardenberg. Disse que,
"sem um dado consistente sequer", Mendes "tisnou a honra
funcional" dos procuradores
Raquel Branquinho, Walquíria
Quixadá, Guilherme Shelb, José Alfredo de Paula Silva e Luiz
Francisco Fernandes de Souza,
ao atribuir-lhes "uso político de
ações de improbidade".
Para a procuradora da República Ana Lúcia Amaral, Mendes "tem demonstrado em seus
votos um rancor desmedido em
relação ao MPF, possivelmente
por ter sido acionado por improbidade administrativa".
Ações trancadas
Contrariando o Ministério
Público, o STF trancou, com
base em voto de Mendes, uma
ação penal contra o desembargador Roberto Haddad, do Tribunal Regional Federal de São
Paulo, acusado de falsificar documento da Receita Federal
(ver texto na pág. A10).
Decisões do STF, apoiadas
em votos de Mendes como relator, trancaram ações contra
magistrados e réus denunciados na Operação Anaconda.
No final de fevereiro, o STF
suspendeu a quebra dos sigilos
do subprocurador-geral da República Antônio Augusto César, envolvido na Operação
Anaconda. Como relator, Mendes entendeu que a denúncia
era inepta, "por não conter uma
descrição detalhada do crime
de corrupção passiva".
O subprocurador tinha sala
no escritório central da organização criminosa. Foram
apreendidos documentos sobre transações financeiras com
membros da quadrilha. Gravações autorizadas pela Justiça
mostram César tratando, em
código, de decisões judiciais.
Em conversa captada, César
orientou um ex-policial que arrebentara o maxilar da namorada a forjar provas, para alegar
legítima defesa, sugerindo que
a secretária o arranhasse.
Ex-procurador da República,
Mendes não é especialista em
direito criminal. "É muita pretensão ou ofensa classificar como inepta uma denúncia subscrita por Cláudio Fonteles, que
atuou em matéria criminal durante toda a carreira", diz a procuradora Ana Lúcia Amaral.
Os juízes Casem Mazloum e
Ali Mazloum, denunciados na
Anaconda, livraram-se de
ações penais em decisões com
votos de Mendes. Gravações
autorizadas mostram Casem
Mazloum solicitando a um ex-policial "grampear" um telefone. O STF o isentou, porque as
fitas não confirmam se a gravação ilegal chegou a ser feita.
A 2ª Turma do STF extinguiu
ação penal contra Ali Mazloum,
acusado de abuso de poder. "Algumas condutas podem até ser
moralmente ou funcionalmente reprováveis, mas assumem o
caráter de mera irregularidade
administrativa e não se justifica a propositura de ações penais", sustentou Mendes.
Divergindo de voto da ministra Ellen Gracie, Mendes votou
pelo trancamento de ação penal contra os juízes federais
paulistas João Carlos da Rocha
Mattos e Adriana Soveral, acusados de retirar placas lacradas
pelo Detran em seus veículos
particulares e nos de parentes
para substituí-las por placas reservadas de uso exclusivo da
polícia. Mendes, que em julgamento anterior entendera que
esse fato tipificava crime, pediu
"escusas" e sustentou que poderia configurar "uma mera irregularidade administrativa".
Outro lado
O ministro Gilmar Mendes
não quis se manifestar sobre as
críticas dos procuradores da
República. Consultado por e-mail, na última quarta-feira,
Mendes telefonou para o jornal, no dia seguinte, quando foi
informado de todos os assuntos
que seriam tratados na reportagem. Ele afirmou que não iria
fazer comentários sobre as decisões como ministro do STF.
Consultado por meio da assessoria do TRF-3, Haddad não
se pronunciou, até o fechamento desta edição. Seu advogado,
Antônio Nabor Areias Bulhões,
também não respondeu ao pedido de entrevista.
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