UOL

São Paulo, domingo, 11 de maio de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

NO PLANALTO

Fisco fisga Volkswagen em águas turvas

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Vai aqui uma sugestão de pegadinha para o próximo vestibular:
A que se dedica a Volkswagen do Brasil?
a) à montagem de automóveis
b) à venda de automóveis
c) à criação de frangos
d) todas as anteriores
Resposta certa: letra "d".
Sim, caro leitor, a Volkswagen -espanto, estupefação- meteu-se no ramo da avicultura. E ao fazê-lo virou personagem do caso Sudam.
Os jornais já não se interessam, mas as investigações do escândalo amazônico prosseguem. Vencido o estágio do arrastão, que enredou o baiacu Jader Barbalho e dezenas de bagrinhos, o Fisco iniciou a etapa do arpão, mais refinada.
A Volkswagen tornou-se o primeiro peixão fisgado nas águas turvas dos incentivos fiscais. Descobriu-se que a multinacional é sócia de uma fraude. Chama-se Frango Norte. É exemplo de agressão ao erário.
Entre 1993 e 1999, o criatório de frangos arrancou da Sudam R$ 20,8 milhões. Seguindo o rastro do dinheiro, o Ministério Público e a Receita descobriram que foi "integralmente" desviado.
Para justificar a "aplicação" da verba, a Frango Norte serviu-se de orçamentos com assinaturas falsificadas, notas fiscais frias, recibos gelados, o diabo.
O nome do controlador do projeto é Vicente de Paula Pedrosa da Silva. Comete atentados contra a Viúva desde 1988.
Naquele ano, vendeu ao Ministério da Reforma Agrária, então chefiado por Jader Barbalho, uma propriedade fantasma, a Fazenda Paraíso. Amealhou 55.221 Títulos da Reforma Agrária -algo como R$ 5 milhões. A operação rendeu-lhe também condenação judicial em primeira instância.
Em 1990, Pedrosa da Silva obteve no BNDES empréstimo de Cr$ 157.053.206,60 -cerca de R$ 3 milhões, em moeda atual. Ofereceu em hipoteca a mesma inexistente Fazenda Paraíso. O bancão oficial não viu mais a cor do dinheiro.
Os caminhos de Pedrosa da Silva e da Volkswagen se cruzaram numa época em que a montadora alemã ainda integrava a Autolatina, sob cujo guarda-chuva operava em parceria com a Ford. Deu-se assim:
1) a Volkswagen tinha impostos a pagar ao governo;
2) escorada na lei, destinou parte do numerário a aplicações em projetos beneficiados pela política oficial de incentivos fiscais;
3) entre os empreendimentos beneficiados está a Frango Norte;
4) graças à operação, a Volkswagen virou sócia da fraude.
No ano passado, quebrou-se o sigilo bancário da Frango Norte (período de 1993 a 1999). A análise gerou uma listagem com 683 registros. Entre os beneficiários dos repasses monetários estão:
a) Volkswagen do Brasil Ltda: US$ 1,3 milhão;
b) Consórcio Nacional Volkswagen: US$ 256 mil;
c) Banco Volkswagen S/A: US$ 243 mil;
d) São Bernardo Administradora de Consórcios Ltda (Grupo Volkswagen): US$ 406 mil;
e) Consórcio Nacional Ltda (da Autolatina à época dos repasses. Hoje, da Ford): US$ 396 mil.
As empresas foram intimadas pela Receita a explicar a origem do dinheiro e a natureza das operações que resultaram nos depósitos.
A Volkswagen diz ter respondido à Receita em ofício de 23 de janeiro passado. O conteúdo? Prefere não divulgar. Argumenta que decidiu associar-se à Frango Norte porque o empreendimento "recebeu a aprovação dos órgãos legais". Condição que foi sendo renovada "ao longo dos anos".
Exibe dois documentos: um da própria Receita e outro da Sudam. O primeiro é de 1997, anterior ao início das investigações, que data de 1998. O segundo, de 2000, foi emitido por uma repartição extinta justamente por ter "frangado" fraudes à Frango Norte.
Como se vê, a exemplo do governo, multinacionais também podem cair no conto do incentivo fiscal. A diferença é que, enquanto a Volkswagen explica os lucros ao Fisco, a Sudam amarga os prejuízos. Que ameaçam aumentar. A Frango Norte reivindica do governo a liberação de novos R$ 16,4 milhões. Dispõe até de sentença judicial ordenando o repasse.


Texto Anterior: Reforma não deve mudar, diz Berzoini
Próximo Texto: Congresso: PMDB já apóia o governo Lula, diz Hélio Costa
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.