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PRESIDENTE 40/ELEIÇÕES 2010
Senadora leva o "marinês" à campanha
Pré-candidata do PV surpreende eleitores ao introduzir termos como "desadaptação criativa" na corrida presidencial
Marina diz que expressões como "descarbonização" e "problemas multicêntricos" não foram criadas por ela e têm sentido num contexto
BERNARDO MELLO FRANCO
BRENO COSTA
DA REPORTAGEM LOCAL
Depois de transformar a
questão ambiental em tema
obrigatório na campanha, a
pré-candidata do PV à Presidência, Marina Silva, tenta promover uma pequena revolução
no vocabulário eleitoral.
Em discursos e palestras pelo
país, ela tem surpreendido ao
recitar expressões estranhas ao
dicionário político, como "problemas multicêntricos" e "desadaptação criativa".
A senadora jura não inventar
nada, mas reconhece ter dado
um sentido particular a alguns
verbetes. Um de seus hits é
"transversalidade", criado no
tempo de ministra do Meio
Ambiente e adotado pelos assessores mais próximos.
A "tradução", como em outros casos, parece mais complicada do que a própria palavra.
"Esta era muito usada por mim
e por minha equipe para mostrar que a gente precisa de um
conhecimento que seja transversal, com uma interação que
seja transdisciplinar", explica.
No ABC do "marinês", índios
e ribeirinhos da Amazônia são
sinônimo de "povos da floresta". Causas que todo político
diz apoiar e que nunca saem do
papel, como a reforma tributária, viram "consensos ocos".
Ou, numa variação mais dramática, para reforçar a ideia de
paralisia: "ocos e congelados".
Algumas expressões parecem pedir a tecla SAP para serem decifradas pelo eleitor. Um
exemplo muito usado: "Precisamos construir uma aliança
intergeracional com compromisso ético". Em linguagem
corrente, significaria que ela
quer atrair pessoas de todas as
idades e honestas.
Ao justificar o fato de ter entrado na disputa a bordo de
uma legenda pequena e isolada,
ela costuma se dizer à frente de
um "movimento transpartidário". Nesse caso, a tradução seria que sua candidatura não se
limita aos filiados ao PV.
Origem acadêmica
Outro hábito dela é dizer que
a realidade está "grávida de
múltiplas respostas". Desta
vez, o truque serve como desculpa para driblar perguntas difíceis. Algo como: "Não há respostas prontas para tudo".
Questionada pela Folha sobre a etimologia de seu vernáculo, que às vezes lembra o "do-in antropológico" do colega de
partido e também ex-ministro
Gilberto Gil, ela invocou raízes
acadêmicas. "Essas palavras
não foram criadas nem inventadas por mim", garantiu.
"Desadaptação criativa é
uma expressão usada por um
psicanalista argentino. Acho
que tem tudo a ver com o contexto das transformações que o
Brasil e o mundo precisam em
relação a fazer novas perguntas
para obter novas respostas."
O termo é citado sempre que
Marina menciona a necessidade de mudança nos hábitos de
consumo para evitar o esgotamento de recursos naturais.
"Se a gente não tivesse se desadaptado de usar as rodas apenas puxadas por bois ou cavalos, até hoje estaríamos andando de carroça", explica.
Ela gosta de dizer ainda que o
mundo está diante de uma "inflexão civilizatória", ou seja, ficando mais civilizado.
As falas também reciclam
termos da cartilha ambiental,
como a "descarbonização" da
economia. A tradução é simples: a senadora defende um
modelo de produção que reduza a emissão de gases-estufa.
"Descarbonização é um termo utilizado no âmbito da convenção de mudanças climáticas", explica. "Mas aos poucos
vai fazendo parte do repertório
de grupos sociais, de vários segmentos da sociedade."
Marina diz já ter ouvido uma
observação semelhante na rua
sobre seu vocabulário: "Uma
vez, um estudante brincou comigo, sugerindo que talvez fosse necessário fazer um glossário dessas expressões todas.
Não seria de todo ruim".
Mas ressalva: "As pessoas, diferentemente do que se pensa,
compreendem o que se diz
dentro de um contexto. E eu
procuro usar sempre as palavras dentro de um contexto".
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