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PRIVATIZAÇÃO
Unindo visão empreendedora e um pouco de superstição, Benjamin Steinbruch vira 'homem de US$ 10 bi'
Era tucana gera primeiro megaempresário
IGOR GIELOW
da Reportagem Local
Quando o
maior cheque da
história do país,
de R$ 3,2 bilhões, caiu nas
mãos do governo federal na
sexta-feira, consolidou-se não só a venda da Companhia Vale do Rio Doce.
Saiu também da casca o primeiro
megaempresário gestado no ninho
da era tucana: Benjamin Steinbruch, o "homem de US$ 10 bilhões" -soma dos faturamentos
da Vale, CSN e Vicunha, os principais negócios a que está associado.
Aos 43 anos, Steinbruch é visto
por amigos e detratores como um
homem de negócios adepto dos
códices de administração que têm
em "globalização" e "parcerias"
seus principais verbetes.
Ao coordenar a compra da maior
estatal posta à venda pelo país até
hoje, ele confirmou sua condição
de maior herdeiro do crescente
desmonte do Estado empresarial
brasileiro.
A Vale, embora a mais espetacular, não foi, como se sabe, sua primeira incursão nos leilões de privatização -nem será a última.
Rumores de mercado dão como
certa sua presença na disputa pelas
Centrais Elétricas de São Paulo
(Cesp), suculenta fatia do programa de privatização paulista, a ser
leiloada em 1998.
Tudo começou em abril de 1993,
quando o tradicional grupo têxtil
Vicunha comprou quase 10% das
ações da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional).
Um dos principais executivos da
Vicunha, Steinbruch encastelou-se no Conselho de Administração da CSN e começou a preparar seu próximo lance.
Tratava-se de empreender uma
reformulação total da empresa e
preparar o caminho para arrematar a Vale.
Para tanto, enfrentou o então
moribundo Bamerindus, também
condômino da CSN. Segundo um
dos principais executivos do banco paranaense à época, Steinbruch
era "osso duro de roer" nas negociações sobre os rumos da siderúrgica. Mas, frisa, nunca levantou a
voz em uma reunião.
Em 1995 veio o golpe final. Depois de tentar entronar na presidência do grupo Marcos Jacobsen,
o Bamerindus jogou a toalha. Vendeu seus 9% de participação na
CSN -4% para a Vicunha.
Know-how
Em maio do ano passado, a CSN
e a Vicunha abocanharam parte da
Light, a empresa de distribuição de
energia do Rio. Era o know-how
que faltava para a disputa pela Vale.
"O Benjamin sempre foi uma
pessoa que tomou decisões na hora certa. E apostava na intuição",
diz Maria Sílvia Bastos Marques,
40, considerada um dos "braços
direitos" do empresário.
Ela ocupa uma das quatro diretorias-superintendências da CSN
há um ano, após deixar a Secretaria da Fazenda do pefelista César
Maia na Prefeitura do Rio.
"Eu não entendia nada de aço e
estava grávida de quatro meses (de
gêmeos) quando fui contratada.
Mas ele disse que me queria porque acreditava na chance de reestruturar a CSN em novas bases."
A divisão de trabalho é uma das
marcas registradas de Steinbruch.
Dividindo seu tempo entre Rio e
Higienópolis, bairro da região
central de São Paulo, o empresário
viu na associação constante a chave para cacifar suas participações
na privatizações.
Conseguiu: obteve o maior empréstimo privado da história brasileira, quando o NationsBank injetou R$ 1,2 bilhão para bancar o
consórcio que comprou a Vale.
Para Paulo Renato Marques, que
cuida das relações de mercado da
CSN há três anos, isso prova a condição de "entrepeneur" do chefe.
A identificação com o poder tucano não é apenas retórica.
Steinbruch é amigo há vários
anos de Paulo Henrique Cardoso,
o filho mais velho do presidente da
República.
Até fevereiro, empregava o "primeiro-filho" na Diretoria de Comunicação e Marketing da CSN.
Agora, Paulo Henrique está na
Light.
Em São Paulo, a família Steinbruch (Benjamin, casado há cinco
anos com Carolina e pai de três filhos) é conhecida pela discrição.
Avesso a badalações, frequenta
estréias de teatro e leilões chiques
de cavalos acompanhado de expoentes do tucanato paulista.
Entre eles, David Zylberstajn
(secretário estadual de Energia e
"primeiro-genro", casado com
Beatriz Cardoso). E Andrea Matarazzo (presidente da Cesp), amigo
há mais de 20 anos e frequente
conselheiro.
Nuances
Mas a formação de Steinbruch
contradiz, às vezes, a "modernidade tucana".
Seguiu os preceitos do investimento total na família, característico da formação judaica dada por
seu pai, o mitológico Mendel
Steinbruch (1925-1994).
Mendel formou, juntamente
com a família Rabinovich, o grupo
Vicunha. Criou o filho dentro da
empresa, à sua sombra, enquanto
Steinbruch ia virando ex-aluno do
Colégio Rio Branco com notas variando entre 7,0 e 8,0 e administrador formado pela Fundação Getúlio Vargas.
Aos 20 anos, começou a trabalhar de fato. Quatorze anos mais
tarde, começou a ganhar notoriedade dentro do negócio familiar,
idealizando a famosa campanha
publicitária "Expresso Brasil",
reunindo personagens de Dias Gomes na TV.
Daí em diante foi designado pelo
pai para cuidar de tudo que fosse
novo na Vicunha. Tocou um
bem-sucedido banco de negócios,
o Fibra, e dirigiu a divisão fabricante da marca Lee.
O irmão, Ricardo, ficou junto
aos Rabinovich na parte puramente têxtil do negócio.
'Pão-duro'
Essa premissa tradicionalista, a
da formação dentro de uma empresa familiar e sob os auspícios
do pai, combinada à receita tucana, ajuda a entender a fama de
"pão-duro" de Steinbruch -o
próprio FHC é notório
"unha-de-fome".
Amigo de tempos de faculdade e
adversário ideológico na compra
da Vale, o petista Aloizio Mercadante lembra um episódio revelador.
"Há cinco anos, em Salvador,
meu filho Pedro achou no Mercado Modelo US$ 300. Ficou com
US$ 100, deu US$ 100 para a irmã e
outros US$ 100 para o avô. Benjamin estava por perto e disse: 'Tudo errado, Pedro. Você deveria ter
guardado os US$ 300, investido e
dividido com a irmã e o avô só os
lucros"'.
Para o deputado federal do PT,
isso não impede Steinbruch de ser
uma pessoa generosa. "Ele é simples e muito, muito humano no
trabalho", atesta a "braço direito"
Maria Sílvia.
Além de simples e "pão-duro",
o novo megaempresário brasileiro
é um homem supersticioso. Não
começa nenhum negócio ou atividade às segundas-feiras. "Eu tive
que começar a trabalhar na terça",
lembra Maria Sílvia.
E não tira, em momentos difíceis, uma gravata que os funcionários e amigos crêem ser do pai.
Pode até ser bobagem, mas
Steinbruch saiu do quase-anonimato para a condição de "homem
de US$ 10 bilhões" semana passada vestindo a mesma gravata.
Colaboraram João Batista Natali, Silvana
Quaglio e Antonio Carlos Seidl, da Reportagem Local
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