São Paulo, sábado, 11 de junho de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"

Empresário interessado em negociar licitações na estatal ordenou gravação em que Maurício Marinho é flagrado recebendo propina

Disputa comercial originou a fita dos Correios

ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

JOSÉ MASCHIO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM LONDRINA

O estopim da maior crise política do governo Lula foi uma disputa comercial. Interessado em negociar novas licitações com os Correios, o empresário Artur Washeck Neto seria o mentor da gravação em que o servidor Maurício Marinho foi flagrado recebendo R$ 3.000 em propina.
Washeck é sócio da Vetor Comercial e da Comam, empresas que fornecem material ao governo federal. O empresário pediu para gravar as conversas com Marinho, então chefe do Departamento de Contratação e Administração de Material dos Correios, com a intenção de usar as fitas para negociar novas licitações, segundo a Folha apurou.
O advogado Joel Santos Filho e o consultor de informática João Carlos Mancuso Villela, presos anteontem, em Curitiba, pela Polícia Federal, gravaram as fitas em que Marinho é flagrado pedindo propina. O deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), da CPI dos Correios, disse ontem que já tem requerimento para ouvir os dois.
Washeck e Santos Filho são amigos desde o governo Collor, quando o advogado paranaense -que teve seu registro cassado na OAB do PR- trabalhava no MEC (Ministério de Educação e Cultura). Foi de Santos Filho a idéia de apresentar João Carlos Mancuso Villela a Marinho como um representante de uma empresa americana de informática.
Na portaria do edifício-sede dos Correios, Santos Filho e Villela registraram os nomes verdadeiros, mas omitiram que o real destino era o gabinete de Marinho. A entrada da dupla no prédio foi registrada pelo sistema de segurança.
Depois da gravação, entraram em ação o militar reformado Arlindo Geraldo Molina e o capitão reformado da PM mineira José Santos Fortuna Neves, ambos também presos anteontem. Eles negociariam o material da gravação com o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), apontado por Marinho como o chefe do esquema de corrupção.
Desde o governo Collor, a Vetor Comercial e a Comam fornecem materiais de informática e produtos médicos ao governo.
A entrega de uma das fitas para a revista "Veja" acabou impedindo os idealizadores do esquema de negociar com Jefferson.

Gravação
O nome de Washeck surgiu apenas como "Artur" no depoimento de Joel Santos Filho à PF. Ele disse ainda que uma outra pessoa, chamada "Jairo", ligado à comunidade de informações, participou da operação. Esse terceiro personagem forneceu o equipamento, deu orientações sobre seu uso e também de como proceder no momento de gravar o servidor em seu próprio gabinete.
Diante de Santos Filho, então escondido sob o codinome Julio Goldman, Marinho contou em detalhes como funcionaria o suposto esquema de corrupção.
Na tentativa de esclarecer a identidade de "Jairo", a Folha procurou na tarde de ontem Jairo Martins. Ele negou ser ligado à comunidade de informações. Disse que é jornalista, que "vive disso", e confirmou ter participado da gravação, a pedido de Washeck. Assumiu ter comprado o equipamento e dado orientação a Santos Filho sobre como utilizá-lo.
Martins foi um dos emissários do empresário do jogo Carlos Cachoeira responsáveis pelas gravações que levaram à cassação do então deputado André Luiz.
Achacado pelo ex-deputado, que lhe cobrava R$ 4 milhões para deixá-lo sair sem problemas de uma CPI na Assembléia Legislativa do Rio, Cachoeira encomendou, então, gravações que comprovassem a extorsão.
Segundo Jairo Martins, o combinado era que Washeck tornasse o esquema público. "Como ele não fez isso, eu fiz", afirmou. "E entreguei a fita à "Veja"."
Na sede da Vetor Comercial, em Brasília, a informação ontem era a de que Washeck tinha viajado. Ele teria, por meio de seus advogados, se colocado à disposição da PF para prestar esclarecimentos.

Abin
A Abin, como órgão de assessoramento da Presidência, vinculado ao Gabinete de Segurança Institucional, entrou na investigação antes de a gravação ser revelada pela revista "Veja". Desde então, servidores do órgão buscavam "montar o quadro" do caso, uma expressão utilizada pelo ministro do GSI, general Jorge Felix.
Ao entrar na investigação, servidores da Abin buscaram informações sobre alguns personagens do caso, entre eles o capitão da reserva da PM José Fortuna Neves, que deve ser chamado para prestar depoimento. Segundo Roberto Jefferson, Fortuna estaria associado ao militar Arlindo Molina numa tentativa de extorqui-lo.


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