São Paulo, quarta-feira, 11 de agosto de 2004

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ELIO GASPARI

Chega de malas, é tempo de bornais

Finalmente uma novidade do PT Federal no mundo da moda. A tradicional figura da mala poderá ser substituída pelo bornal. Foi com uma dessas delicadas sacolas que a família do tesoureiro do PT, Delúbio Soares, carregou o numerário com que comprou 32 alqueires de terras em Buriti Alegre, no cerrado goiano. De acordo com a escritura registrada no cartório da cidade, havia R$ 150 mil em dinheiro vivo no bornal. A esse preço, em notas de R$ 10, o fardo pesaria uns 15 quilos.
O bornal está na indumentária dos sertanejos, esteve na dos guerrilheiros dos anos 70. A política brasileira ganharia estilo popular se os hierarcas circulassem com bornais, em vez de malas. Os de Lampião eram lindos, tinham flores bordadas pelo próprio cangaceiro. Muito melhores que uma maleta Kenneth Cole de US$ 250. (Apertando, ela agüenta o enxoval de duas noites ou US$ 1 milhão em notas de cem.)
O doutor Delúbio está docemente associado à novidade do bornal. Aos 48 anos, o tesoureiro do PT é dos símbolos da nobiliarquia do companheiro Lula. Tem a barba dos velhos militantes e os charutos Cohiba dos novos poderosos. Pena que não retire o anel da grife e repouse a peça em cinzeiros impróprios. Não se deve maltratar um charuto de R$ 100, por baixo.Também não se deve exibi-lo.
Professor de matemática da rede pública, Delúbio é um personagem recente na política nacional, mas vale conhecê-lo por aquilo que diz. Aqui vão seis exemplos:
1) Em novembro de 2003, quando se estranhou que ele tivesse sido incluído na comitiva de Lula numa viagem à África: "Qual o problema? Não sou ladrão! Represento uma entidade, o PT".
2) Um ano depois, quando lhe perguntaram se tinha dificuldades para marcar audiências com autoridades, respondeu: "Com burocrata de ministério? É só ligar e marcar para quatro, cinco dias depois".
3) O melhor momento do tesoureiro Delúbio, que em repetidas ocasiões louvou a transparência petista, deu-se em abril. Numa reunião do Diretório Nacional, ele detonou a proposta de um grupo de parlamentares para que o partido colocasse sua lista de doadores de campanha na internet, em tempo real. Há duas versões para o centro de sua argumentação. Numa, teria dito que esse tipo de sugestão era "ingenuidade". Noutra: "Transparência assim é burrice".
4) Em junho, quando se desbaratou o ninho dos vampiros do Ministério da Saúde, resultou que um deles (Laerte Corrêa) estivera em diversas ocasiões com o tesoureiro petista. O comissário explicou: "O sindicato das empresas farmacêuticas pediu ao Laerte que ajudasse nos contatos. Eu o conheci na campanha. Ele ia lá no comitê com vários empresários da área. Depois da eleição, veio várias vezes aqui ao PT. Disse que queria ficar perto do PT, que queria filiar pessoas ao partido".
5) Em fevereiro passado, antes do caso Waldomiro Diniz: "O ministro com quem eu mais converso é o Zé Dirceu".
6) Em abril, depois do caso Waldomiro: "Convivi com o Zé Dirceu quase que integralmente de 1995 até a posse do Lula. Hoje nos vemos ocasionalmente. Mas gosto muito, muito dele".
Delúbio Soares é um daqueles coriscos que atravessam o céu de Brasília sem que se possa assegurar que venham a ser relevantes, podendo-se garantir que serão inesquecíveis.


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