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FOLCLORE POLÍTICO
Embaixador fora de série
AUGUSTO MARZAGÃO
O embaixador Hugo Gouthier era uma figura singular na diplomacia brasileira. Polêmico, combatido, cercado de amizades fiéis e de desafetos impiedosos, amigo de Juscelino e do presidente Kennedy, envolvia-se em
complicações políticas internas e
externas. Não fora assim, e o Brasil jamais teria adquirido para a
nossa embaixada em Roma uma
jóia do patrimônio histórico italiano, o Palácio Dorea Pamphili.
Gouthier também ficou famoso
por algumas idéias mirabolantes,
muitas das quais enviadas ao presidente JK. Por exemplo, ele planejou uma rodovia em linha reta
que cruzava o Brasil de norte a
sul, servindo-se da inestimável
ajuda do saudoso escritor e jornalista Otto Lara Resende. Otto ia
propondo desvios e ramais estratégicos e políticos no trajeto que
terminavam convencendo o entusiasmado rodoviarista amador e
criavam finalmente uma solução
difusa e inviável. Gouthier também chegou a imaginar um serviço secreto de comunicação entre
as embaixadas brasileiras na Europa, através de pombos-correio.
O nosso discutido, sagaz e eficiente diplomata era ainda um
repositório de histórias divertidas
de que participavam brasileiros
que se serviam da sua hospitalidade e ajuda. Certa vez levou o time de futebol do Santos, onde
pontificavam Pelé, Coutinho,
Mengalvio e tantos outros craques, para um tour de ônibus pelos mais famosos pontos turísticos
de Roma antiga. Quando passavam pelo Fórum Romano ouviu o
seguinte diálogo entre dois jogadores: "Olha só", disse um deles.
"É tudo ruína de guerra." O outro
discorda: "Não diga bobagem.
Você não vê que isso foi construído para fazer o filme Ben Hur?".
A mim, ainda na Itália, Gouthier contou uma história, naturalmente misturada à anedota
política. Importante líder de esquerda, depois de reunir a maioria dos dirigentes sindicais italianos, comunicou-lhes que brevemente não teriam que trabalhar
mais que 30 dias por ano. Houve
uma explosão de alegria. Um dos
presentes meio surdo não entendeu bem, mas um colega lhe explicou aos gritos: "Ele falou que se for
eleito proporá uma lei reduzindo
a nossa jornada de trabalho a 30
dias anuais". O surdo, porém não
se dá por satisfeito e exclama: "E
sobre as férias, ele não disse nada?".
AUGUSTO MARZAGÃO, jornalista,
autor do livro "Memorial do Presente",
ex-secretário particular de Jânio
Quadros e José Sarney e ex-secretário de
Comunicação Institucional de Itamar
Franco, escreve às sextas nesta seção
cecifrei@unisys.com.br
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