São Paulo, terça-feira, 11 de novembro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Procuradoria decide futuro da Satiagraha

Se procuradores entenderem que há provas obtidas de forma ilícita, ação contra Dantas será afetada

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

A apuração da Polícia Federal sobre os métodos usados pelo delegado Protógenes Queiroz só afetará a ação penal contra o banqueiro Daniel Dantas se o Ministério Público Federal entender que, durante as investigações da Operação Satiagraha, foram obtidas provas ilícitas, capazes de contaminar o processo principal.
Até lá, um indiciamento de Protógenes significará tão-somente que um delegado federal entende que outro delegado é suspeito de crime. Caberá à Procuradoria denunciar Protógenes ou arquivar o inquérito.
O juiz federal Ali Mazloum, que autorizou as diligências, poderá discordar de um eventual arquivamento. Nessa hipótese, o juiz remeterá o inquérito ao procurador-geral da República, que poderá arquivá-lo ou indicar outro procurador. Ou seja, a Procuradoria é a titular, a "dona" da ação penal. Não há processo sem denúncia.
Advogados criminalistas, juízes e procuradores ouvidos pela Folha divergem sobre os possíveis efeitos das investigações contra Protógenes.
A confirmação de um vazamento ou desobediência do delegado poderá caracterizar um crime funcional sem afetar as provas da Satiagraha. O uso de agentes da Abin, por sua vez, abre uma discussão polêmica. Queiroz era a autoridade do inquérito, poderia, segundo alguns criminalistas, recorrer a pessoas que tivessem condição funcional para auxiliá-lo.
"A eventual usurpação de função pública por parte de Queiroz e agentes da Abin poderá comprometer a investigação", entende o advogado criminal Luiz Fernando Pacheco. "Admitir prova clandestina é admitir prova ilícita", diz.
"Provas colhidas por arapongas são nulas, nada valem. Grampos e filmagens clandestinos também não têm valor algum", afirma Pacheco.
Ainda que as interceptações tenham sido autorizadas pela Justiça, o delegado pode ter cometido eventual ilegalidade se não cumpriu alguns requisitos legais, diz outro advogado.
"Se, eventualmente, as provas foram obtidas por meios ilícitos, é indiscutível que essas provas não valem nada, assim como as que delas derivarem", diz o promotor de Justiça Daniel Westphal Taylor, de Santa Catarina. "Nada impede, contudo, que essas provas venham a ser repetidas, ganhando, a partir daí, o caráter de lícitas".
Ao autorizar investigações sobre o delegado sem parecer favorável da Procuradoria, o juiz Ali Mazloum assumiu a condição de "juiz acusador". Ou seja, a mesma alegação do advogado de Dantas contra o juiz Fausto De Sanctis poderá ser usada pela defesa do delegado para tentar anular provas.
"Sem entrar no mérito da investigação em si, me parece claro que houve violação do sistema acusatório", diz o procurador da República Vladimir Aras. "Não pode o juiz, de ofício ou por representação policial, autorizar prova cuja produção não foi requerida ou apoiada pelo titular da ação penal. Essa prova é nula, por violação à Constituição", afirma Aras.
Sobre o sistema acusatório, Pacheco diz que há duas correntes nos tribunais. No Distrito Federal, em caso distinto, um tribunal determinou soltar um rapaz que causou a morte de pessoas em acidente, porque o juiz mandara prendê-lo sem pedido do Ministério Público. Para outra corrente, o juiz é livre para determinar qualquer diligência, ainda que não requerida, pois "o processo penal tem por fim precípuo a busca da verdade real", diz.


Texto Anterior: Janio de Freitas: O silêncio da voz
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.