São Paulo, quarta-feira, 11 de dezembro de 2002

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ELIO GASPARI

O cavalheiro Armínio Fraga

Armínio Fraga faz parte de um agrupamento de economistas que arruinou a nação. Prometeram estabilidade monetária e crescimento econômico, entregaram uma economia estagnada e inflação logo depois da esquina, como diria o presidente americano Herbert Hoover. Pois é a Armínio Fraga que o PT deve desculpas. Tem-lhe dado um tratamento malcriado, cheio de soberba, vulgar. Tem recebido de volta uma lição de humildade e responsabilidade pública.
Aos fatos:
Pode-se acreditar que lá pelo meio do ano, Armínio Fraga tenha namorado a idéia de continuar na presidência do Banco Central. Ele gosta do cargo. Gosta muito. Lula não o queria no lugar. É verdade que houve petistas e mercadistas conspirando para que ele fosse mantido, mas nem tiveram influência suficiente para convencer Lula, nem a coragem necessária para expor suas propostas em público.
Armínio viu-se numa situação esquisita. O novo locatário do Planalto anuncia que deseja mandá-lo embora, mas ele não pode dizer que fica feliz indo para casa. É por isso que o PT deve desculpas a Armínio. Imagine-se a seguinte situação: Lula diz que não vai mantê-lo e Armínio convoca uma entrevista coletiva informando que não tem o menor interesse em colaborar com um governo formado por pessoas que pensam de forma diametralmente diferente dele. Um ouvinte o corrige e lembra que o doutor Palocci e um número cada vez maior de petistas estão pensando como ele. Armínio responde que, nesse caso, vê mais uma razão para ir-se embora, visto que aprendeu a não confiar em quem muda de opinião num assunto tão importante sem ler ao menos um livro. Jogo jogado. Ambos dizem o que pensam e a vida segue.
Dado o fato que o presidente do Banco Central terá chutado o balde, não custa muito supor que depois de uma declaração desse tipo, o dólar vai a R$ 4. Uma retribuição de Armínio custaria ao novo governo um enorme trabalho de reconstrução da confiança dos investidores internacionais. Seja lá o que for essa tal de confiança dos investidores internacionais, o fato é que o PT passou a cultivá-la como antigamente cultivava-se a memória de Camilo Torres, o padre-guerrilheiro colombiano,
Paradoxal situação: por lealdade à economia brasileira (ou ao que ainda há dela) Armínio Fraga carrega estoicamente o fardo da malcriação alheia. Por mais que a presidência do Banco Central seja para ele uma experiência ímpar e muito provavelmente insuperável, não precisa do cargo para coisa nenhuma. Mora no Rio, tem família arrumada e casa montada. Ganhou todo o dinheiro que pode vir a precisar na vida antes de trabalhar para o governo. Financeiramente, faz parte daquele grupo de pessoas que perde patrimônio ao trabalhar para a Viúva.
Serviu ao Estado brasileiro como fizeram diversas gerações de sua família. Coube ao médico Clementino Fraga Filho, reitor em exercício da gloriosa Universidade do Brasil em junho de 1968, aturar malcriações de estudantes. Foi praticamente prisioneiro de uma assembléia de 2.000 jovens. Parecia a China, com os professores sendo interpelados por alunos. Na narrativa de Vladimir Palmeira, um do líderes da cena, "a partir de certo momento, o reitor Clementino Fraga começou a negociar nossa saída daquele local." Bingo. Tinham prendido o reitor, mas precisavam de sua autoridade para escapar da polícia, que cercara a universidade. Infelizmente, a polícia traiu o professor Fraga e quando os estudantes saíram deu-se uma grande pancadaria. A crônica da noite informa que o reitor ajudou estudantes a escafederem-se.
Muitos estudantes das jornadas de 1968 estão no firmamento petista. Não só Vladimir Palmeira, com seu exemplo de coerência, como também José Dirceu de Oliveira e Silva, na época um agitador paulista. E nesse novo cenário de real valor, lá está um Fraga, prisioneiro aparente de seus adversários políticos, pronto para negociar a melhor saída possível para uma turma que está pronta para mudar o mundo.


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