São Paulo, segunda-feira, 12 de fevereiro de 2007

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Itamaraty vê disputa política e ressentimento em críticas

DA COLUNISTA DA FOLHA

As exportações do Brasil para os Estados Unidos cresceram 60,73% nos quatro anos do primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dado que o Itamaraty não cansa de repetir como resposta às "acusações adjetivas" de que a política externa seria contaminada pelo antiamericanismo.
Para o ministro Celso Amorim (Relações Exteriores) e sua equipe, esse é um exemplo inquestionável de que a insistente acusação de antiamericanismo não se baseia em fatos, mas em disputas políticas e ressentimentos.
O volume passou de US$ 15,3 bilhões em 2002 para US$ 24,7 bilhões em 2006, e os EUA continuaram reinando como o principal destino individual dos produtos brasileiros.
O problema é que, se o Itamaraty prefere trabalhar com valores absolutos, a oposição à política externa opta por percentagens. Neste caso, a participação dos EUA nas exportações brasileiras caiu 29,42% em quatro anos de Lula. Eram um quarto (25,44%) em 2002 e caíram para 17,95% em 2006.
Os dois últimos embaixadores do Brasil em Washington estão entre os que criticam a atual política externa.
"O Brasil está desperdiçando o maior mercado do mundo, está perdendo oportunidades fantásticas de negócios", diz Rubens Barbosa, que assumiu o cargo no governo Fernando Henrique Cardoso e foi mantido no primeiro ano de Lula.
Seu sucessor, Roberto Abdenur, nomeado no atual governo, concorda. Em entrevista à revista "Veja" da semana passada, disse que há "um substrato ideológico vagamente anticapitalista, antiglobalização, antiamericano, totalmente superado". Segundo ele, há dez anos o Brasil está estacionado em 1,4% do mercado americano.
Na avaliação de Amorim e do futuro embaixador em Washington, Antônio Patriota, é simples explicar a questão sob a ótica percentual. De um lado, os EUA intensificaram fortemente suas relações comerciais com a Índia e a China, mudando a base de cálculo. De outro, o Brasil investiu seriamente na diversificação de parceiros.
Se a participação americana caiu em quase 30%, a da Argentina cresceu 119,63%. Bom dado, aliás, para registrar a prioridade da América do Sul, no contexto de investimento numa política "Sul-Sul" que privilegia também África e Ásia.
No Itamaraty, os críticos em geral são chamados de "viúvas da Alca", porque eram favoráveis à Área de Livre Comércio das Américas, que o Brasil rejeitou, ou pelo menos a um TLC (Tratado de Livre Comércio) bilateral com os EUA.
"Ninguém questiona a importância de diversificar mercados, mas o problema é perder o foco e descuidar dos mercados fundamentais", disse o ex-chanceler Celso Lafer, do governo FHC. Ele critica o "excesso de atenção Sul-Sul", e, mesmo evitando usar a expressão "antiamericanismo", definiu que esse excesso "caracteriza uma reação a um mundo unipolar". Em linguagem não diplomática, leia-se: contra a maior potência, os EUA.
No debate, a atual cúpula do Itamaraty diz que o Brasil escapuliu da Alca e de um TLC para não ficar atrelado às condições da potência. Em resumo: realisticamente, o Brasil sabe que os EUA são o maior mercado do mundo e não podem ser desprezados, mas não quer ser subjugado por suas condições de grande potência. (EC)


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