São Paulo, quarta-feira, 12 de maio de 2004

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IMPRENSA

Segundo nota do Ministério da Justiça, reportagem de Rohter é "leviana"

Governo cancela visto e bane do Brasil jornalista do "NYT"

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O governo brasileiro considerou "inconveniente" a presença em território nacional do jornalista Larry Rohter, do jornal "The New York Times", e determinou ontem o cancelamento do seu visto temporário. O correspondente fez uma reportagem sobre supostos excessos alcoólicos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Segundo nota oficial do Ministério da Justiça, divulgada ontem à noite, o cancelamento do visto é necessário "em face de reportagem leviana, mentirosa e ofensiva à honra do presidente da República" e que traz "grave prejuízo à imagem do país no exterior".
A Folha apurou que a ordem veio de Lula. A nota é assinada pelo ministro interino da Justiça, Luiz Paulo Teles Ferreira Barreto. O titular, Márcio Thomaz Bastos, está em viagem oficial à Suíça.
Segundo a Folha apurou, Thomaz Bastos foi informado e ficou preocupado com a repercussão da medida, deixando transparecer que não concordava com ela. Mas orientou sua equipe a executá-la por ser atribuição de sua pasta, de acordo com a legislação.
A nota oficial informa que a decisão foi baseada no artigo 26 da lei 6.815, que diz respeito ao "Estatuto do Estrangeiro". Pela lei, "o visto concedido pela autoridade consular configura mera expectativa de direito, podendo a entrada, a estada ou o registro do estrangeiro ser obstado ocorrendo qualquer dos casos do artigo 7º ou à inconveniência de sua presença no território brasileiro, a critério do Ministério da Justiça".
De acordo com o ministério, a Polícia Federal deve notificar Rohter da decisão e, a partir daí, terá oito dias para deixar o país. Hoje, ele estaria na Argentina.
Ontem, minutos antes de a decisão ser divulgada, Lula comentou com jornalistas a reportagem. Ele falava sobre sua viagem à China no fim de maio e foi indagado se sua imagem internacional tinha sido afetada. Os jornalistas que participavam da entrevista ainda não sabiam da decisão da expulsão. Lula respondeu o seguinte:
"Primeiro, não peça para o presidente responder a uma sandice daquela. Segundo, certamente, o autor daquilo -que não me conhece, que eu não conheço- deve estar hoje mais preocupado do que eu. Sabe? Só isso".
Perguntou-se então ao presidente o que ele queria dizer com Rohter estar mais preocupado do que ele. O presidente estão disse: "Não, não comento. Isso quem comenta é o Ministério da Justiça. O governo brasileiro deve tomar as decisões que a lei permitir que tome. Eu acho que não merece resposta, merece uma ação".
Após a entrevista, quando se tornou pública a expulsão, a Folha quis mais explicações do Planalto. A assessoria de Lula não falou mais sobre o caso, que seria tratado pelo Ministério da Justiça.
O "NYT" chegou a publicar ontem carta enviada anteontem ao jornal pelo embaixador do Brasil nos EUA, Roberto Abdenur, na qual ele se diz "perplexo" e "indignado" com o caso. Segundo o secretário de Imprensa e Divulgação da Presidência, Ricardo Kotscho, que falou sobre o assunto à noite ao programa da TV Cultura "Observatório da Imprensa", além da carta, o embaixador compareceu à Redação do jornal.
Kotscho disse que, como jornalista, acha que a decisão de cancelar o visto de Rohter não foi a melhor, mas, "como é do governo", a apóia. Também à noite, o site do "NYT" reproduziu texto da agência de notícias Reuters sobre a medida anunciada em Brasília.
Na sede do FMI, o assunto foi tratado ontem em tom de brincadeira na entrevista do novo diretor-gerente, Rodrigo Rato. Questionado se já havia tomado "caipirinhas" com Lula, ele disse que, com o presidente brasileiro, só tomou café, mas que toma "caipirinhas" por conta própria.
A reportagem do jornal, que foi publicada no último domingo com o título "Hábito de bebericar do presidente vira preocupação nacional", já havia sido classificada no mesmo dia pelo Palácio do Planalto como "caluniosa", "da pior espécie de jornalismo, o marrom". Leia a seguir a nota divulgada pelo Ministério da Justiça:
 
Em face de reportagem leviana, mentirosa e ofensiva à honra do presidente da República Federativa do Brasil, com grave prejuízo à imagem do país no exterior, publicada na edição de 9 de maio passado do jornal "The New York Times", o Ministério da Justiça considera, nos termos do artigo 26 da lei nº 6.815, inconveniente a presença em território nacional do autor do referido texto. Nessas condições, determinou o cancelamento do visto temporário do sr.William Larry Rohter Junior.
Brasília, 11 de maio de 2004
Luiz Paulo Teles Ferreira Barreto
Ministro interino da Justiça


Colaboraram o correspondente em Washington e a Sucursal do Rio

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