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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"
Jefferson nega ter gravações e diz que negociava cargos no Planalto, numa sala reservada a Silvio Pereira, na presença de Delúbio e Dirceu
"Não tenho fitas, vou relatar fatos que vivi"
DA EDITORA DO PAINEL
Nos trechos abaixo, Roberto
Jefferson nega ter prova do pagamento do "mensalão" para mostrar à CPI. "Tenho a palavra e a vivência desta relação de dois anos e
meio com o governo do PT."
O presidente do PTB também
descreve as negociações de seu
partido com o PT para a ocupação
de cargos no governo. "Noventa
por cento das conversas eram no
palácio, numa salinha reservada
ao Silvio Pereira. De vez em quando o Delúbio metia a mão na porta, entrava, sentava, conversava e
saía. O Zé Dirceu participava. O
Genoino também.
(RLP)
Folha - A semana foi marcada por
rumores de que o sr. teria fitas
comprometedoras. Isso é verdade?
Roberto Jefferson - A única fita
que tenho é a da entrevista que a
Folha gravou e que a Comissão de
Ética da Câmara está pedindo.
Não tenho nenhuma fita. Não faço isso. Eu vou [no depoimento
desta terça] relatar fatos que vivi
neste ano e meses em que presido
o PTB. Das reuniões que tive com
Genoino, Delúbio, Silvio Pereira
[secretário-geral do PT], com o Zé
Dirceu. Das conversas que tivemos tanto para construir a aliança
do PTB com o governo quanto a
aliança eleitoral do PT com o PTB.
Folha - No depoimento desta terça, e depois na CPI, o sr. tem a apresentar unicamente o seu relato?
Jefferson - Vou colocar claramente ao Brasil tudo o que vivenciei, tudo o que conversei, tudo de
que tratei. Tenho a palavra e a vivência desta relação de dois anos e
meio com o governo do PT.
Folha - Que avaliação o sr. faz das
reações dos membros do governo
citados em sua entrevista anterior?
Jefferson - Os ministros foram
covardes com o presidente. O ministro Palocci [Fazenda] sabia do
"mensalão" porque eu falei para
ele. O ministro Walfrido [Turismo] errou por não ter dito ao presidente sobre o "mensalão", porque eu falei com ele. O ministro
Ciro [Integração] sabia. O Zé Dirceu, conversei com ele várias vezes sobre o "mensalão". Deixaram o presidente completamente
desinformado de algo que viciou
a relação do governo, e do comando do PT em especial, com a base
aliada no Congresso.
Quando de minha conversa
com o presidente este ano, lá no
gabinete dele no Palácio do Planalto, estávamos eu e o ministro
Walfrido, quando eu disse a ele do
"mensalão". Ele tomou um susto.
Expliquei a ele no que consistia:
um reparte de recursos do Delúbio para líderes e presidentes de
partido da base aliada dividirem
um dinheiro por mês com representantes de suas bancadas, em
especial o PP e o PL. O PTB fora
convidado a participar e repelira.
Acho que os ministros traíram a
confiança do presidente. Como
pode ministros minimizarem, dizendo que não havia importância
em minhas palavras, e ter essa explosão no Brasil quando a Folha
as coloca para a opinião pública?
Só eles não tinham dimensão da
explosão que isso iria provocar?
O presidente [quando ouviu o
relato], foi como se alguém dissesse "olha ali a tua mulher com
outro homem". Aquela reação de
surpresa, de mágoa, as lágrimas
brotaram. Ele me pediu que explicasse como funcionava o "mensalão". Eu disse. Depois ele se levantou, me deu um abraço e eu saí. E
o que eu sei, até pela vivência da
Casa -essas coisas não se escondem- é que houve uma atitude
forte, porque o "mensalão" secou.
E nós estamos assistindo a uma
crise de abstinência. O corpo mole é porque está faltando aquilo
que o Delúbio sempre transferiu a
líderes e presidentes da base: o dinheiro para pagar o exército mercenário, as bancadas de aluguel.
Folha - Que avaliação o sr. faz da
entrevista do tesoureiro do PT?
Jefferson - Achei que ele foi fraco. Não teve como enfrentar a imprensa. O Genoino parecia um
cão de guarda. Se alguém tentava
uma segunda pergunta, o Genoino cortava. A meu ver, Delúbio
não convenceu. Não esclareceu
sua relação com os partidos que
compõem a base do governo.
Folha - Como se estabeleceu a relação do PTB com a cúpula petista?
Jefferson - Quando, lá atrás, o
José Carlos Martinez era presidente do PTB, e nós começamos a
constituir a relação, depois de nomeado o Walfrido Mares Guia
ministro do Turismo, o segundo
cargo foi o do delegado regional
do Trabalho no Rio, Henrique Pinho. Toda a estrutura abaixo dele
foi nomeada pelo Silvio Pereira.
Outro cargo: Fernando Cunha,
para a BR Distribuidora. Toda a
estrutura abaixo do Fernando Cunha foi nomeada pelo Silvio Pereira. Na área de Petrobras, de petroquímica, quem manda é ele.
Um dia perguntei: "Mas como é
isso? Vocês dão a cabeça e tomam
o corpo?". E ele disse que esse era
o jeito do PT de repartir poder.
Foi assim no Departamento Nacional de Infra Estrutura e Transportes. A primeira indicação para
o Dnit, feita pela bancada de São
Paulo, acho que é Pimentel o nome [Sérgio Pimentel], esse que
hoje aparece nos jornais. Toda a
estrutura abaixo foi montada pelo
Silvio e pelo Delúbio. O gerente,
um tal de Lauro [Lauro Corrêa], é
homem do PT. Ele mandava mais
que o diretor-geral do Dnit.
O PT nomeava as pessoas que
controlavam a estrutura de poder
por baixo dos nomeados do PTB.
Folha - A quem o sr. se refere
quando fala na direção do PT?
Jefferson - Genoino, Marcelo Sereno, Delúbio Soares, Zé Dirceu,
que sempre soube de tudo. Várias
vezes eu conversei com o Genoino e com o Delúbio no gabinete
do ministro Zé Dirceu. Tudo era
tratado com o conhecimento dessas pessoas e do Silvio Pereira. Isso no início do governo. Há uma
sala contígua à do gabinete do ministro Zé Dirceu no Palácio do
Planalto, e de vez em quando nós
fazíamos essas conversas.
Noventa por cento das conversas eram feitas no palácio, numa
salinha que era reservada ao Silvio
Pereira. De vez em quando o Delúbio metia a mão na porta, entrava, sentava, conversava e saía. O
Zé Dirceu participava da conversa, e o Genoino também.
Folha - Após a primeira reportagem da "Veja" sobre os Correios,
duas nomeações iminentes de petebistas foram abortadas: uma na
empresa e outra em Furnas, certo?
Jefferson - O doutor Ezequiel
Ferreira, indicado pelo senador
do PTB Fernando Bezerra [líder
do governo no Congresso], nunca
chegou a ser diretor dos Correios.
Iria para a Tecnologia, ocupada
pelo doutor Eduardo Medeiros,
indicado pelo Silvio Pereira. Era
uma negociação que cortava um
pedaço de poder do PT na carne.
Furnas foi o próprio presidente
Lula que ofereceu ao PTB. Na diretoria de Engenharia, a mais poderosa do setor elétrico do país,
está o doutor Dimas Toledo. Há
12 anos. É muito ligado ao governador Aécio Neves (PSDB-MG).
O presidente queria tirá-lo porque houve um programa em Minas, num repasse de recursos federais de mais de R$ 1 bilhão, o
"Luz para Todos". E quando houve a exploração política desse programa, o Aécio só botou na placa
"governo de Minas Gerais". E o
presidente se sentiu traído.
Com a ajuda do então presidente da Eletronorte, meu companheiro Roberto Salmeron, eu cheguei ao nome de Francisco Pirandel, um técnico de altíssimo nível,
que já trabalhou com o senador
Delcídio [Amaral, líder do PT no
Senado]. Levei o currículo ao presidente Lula, que mandou que eu
despachasse de uma vez com o
ministro José Dirceu e levasse
uma cópia para a ministra Dilma
Rousseff [Minas e Energia].
Ela disse: "É um dos melhores
nomes". Aí começaram as pressões para que o Dimas não saísse.
Do presidente Itamar Franco, lá
em Roma, no enterro do papa. De
grandes empreiteiras. Até o Zé
Dirceu disse: "A pressão está muito forte para não trocar". Eu disse:
"O PTB não é problema. Nós não
queremos gerar uma crise".
Quando nós voltamos, Walfrido e eu, para conversar com o
presidente, nós nos dispusemos a
abrir mão. Ele falou: "Não. Eu faço questão". Ficou marcada a assembléia, se não me engano para
16 de maio. Dia 14 de maio saíram
as primeiras denúncias da "Veja".
Na assembléia, a ministra mandou suspender a troca. Três dias
depois, vem conversar comigo
em casa o Arlindo Chinaglia [petista, líder do governo na Câmara]. Logo depois do meu discurso
na Câmara, falando em nome
pessoal, para pedir que eu matasse no peito, que o PTB puxasse a
crise para si e esclarecesse rapidamente, e que depois as coisas caminhariam normalmente, que
aconteceria a nomeação em Furnas. E eu disse: "Mas por que você
fala isso?". Ele respondeu: "Porque foi o governo que sustou".
Quando saiu a matéria da "Veja", o Janene e o Severino Cavalcanti [presidente da Câmara, PP-PE] foram para cima do Zé Dirceu
para impedir que houvesse essa
troca. Eles adotaram o Dimas como indicação do PP. Pressão direta do Janene e do Severino para que eles não assinassem a CPI.
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