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ENTREVISTA 1/ROBERT SHILLER
Economia dos EUA pode sofrer pancada
Economista diz que nervosismo do mercado é motivo para preocupação
Autor de "Exuberância Irracional" aponta risco de recessão se preços do petróleo ficarem altos e os dos imóveis despencarem
DE NOVA YORK
O nervosismo das Bolsas é
justificado, e a conjuntura atual
-as pressões inflacionárias, a
alta do petróleo e os ativos superavaliados- é causa para a
verdadeira preocupação. Essa é
a opinião do economista Robert Shiller, 60, especialista em
mercados financeiros da Universidade Yale.
O professor defendeu a atuação de Ben Bernanke, presidente do Fed, e apontou um
problema conjuntural grave: a
continuada "exuberância irracional" no mercado imobiliário, cuja queda de preços nos
próximos anos, aliada à alta do
petróleo, dará uma pancada na
economia americana.
As repercussões, naturalmente, serão globais. Mas Shiller também vê um aperto monetário em todo o mundo e um
movimento de bancos centrais
para administrar esses "riscos
reais", mas atentos para não sufocar o crescimento.
Mas seu prognóstico para o
longo prazo é bom. Considera
que Bernanke é inteligente e
afinado, apesar de muito criticado recentemente por modificar expectativas de juros, um
dos motivadores da fuga de investimentos nas Bolsas, especialmente de emergentes. A seguir, trechos da entrevista.
FOLHA - O senhor avalia que há
uma bolha especulativa hoje nas
Bolsas, por isso o abalo?
ROBERT SHILLER - Essa metáfora
ilustra a noção de que pode haver uma explosão repentina e
irrevogável. Os investidores são
conscientes da possibilidade de
bolhas, mas acho que hoje a
idéia de que estamos vivendo
uma bolha nas Bolsas é pouco
proeminente entre investidores. O "crash confidence index"
[que mede a confiança no mercado acionário], compilado em
Yale, está bastante alto: 58%
dos investidores institucionais
avaliam que há menos de 10%
de chance de uma implosão semelhante às de 1929 e 1987.
FOLHA - O setor imobiliário dá sinais de desaquecimento da economia. Vai ser um pouso forçado ou o
que estão chamando de período de
transição?
SHILLER - Eu acho que os preços
imobiliários nos Estados Unidos e em outros países estavam
muito fortes e vão diminuir no
futuro próximo, até despencar
em certos locais. Mas uma
grande queda vai demorar um
pouco. Ajudei a lançar na Bolsa
Mercantil de Chicago um mercado de futuros para o setor, e
as apostas são de aumento de
preços no próximo ano.
FOLHA - O que isso significa? O
crescimento continua? Quando vai
acabar o boom?
SHILLER - Os Estados Unidos
não vão parar de crescer num
futuro previsível, mas pode haver uma recessão. Se o preço do
petróleo ficar onde está e o setor imobiliário cair, podemos
ver uma forte pancada na economia. Mas, a longo prazo, ainda acho que a perspectiva é boa.
FOLHA - Como podemos avaliar as
pressões inflacionárias? São reais,
perigosas, iminentes?
SHILLER - Dados recentes indicam preocupação com a inflação, mas Bernanke está disposto a mostrar que vai lutar contra ela. Ele vai ter sucesso em manter a inflação sob controle.
FOLHA - As falas e medidas recentes dele indicam isso?
SHILLER - Bernanke é um homem muito inteligente, está
muito afinado à possibilidade
de a inflação se esparramar e
está sob controle de sua missão.
FOLHA - E os mercados? Estão agindo de forma racional?
SHILLER - Estamos vendo muita
volatilidade depois de os mercados atingirem um pico no início de maio. O Brasil está entre
os países com as maiores quedas da Bolsa. Mas o fato é que o
fenômeno aconteceu em todo o
mundo. Parte disso tem a ver
com a percepção correta de que
os bancos centrais pelo mundo
vão apertar o cinto [arrocho
monetário]. Outra parte é devido à situação instável mundial,
à tensão política no Oriente
Médio e à perspectiva de continuada alta do petróleo no futuro, que pode desencadear uma
recessão global.
FOLHA - Não houve exagero?
SHILLER - Não estou certo disso.
A situação atual é causa para
preocupação real, não há nada
de imaginário.
FOLHA - Os juros vão subir ao redor
do mundo?
SHILLER - Juros mais altos provavelmente vão acontecer, mas
não acho que essa seja a principal preocupação. É pouco provável que os bancos centrais
sufoquem suas economias. A
grande preocupação são os
mercados de ativos, superavaliados, especialmente o imobiliário em alguns países. O petróleo, as commodities e as
perspectivas no Oriente Médio
ainda devem piorar tudo.
FOLHA - Se pudesse falar com Bernanke antes da próxima reunião do
Fomc, o que diria a ele?
SHILLER - Daria os parabéns por
finalmente incorporar às considerações do comitê a questão
imobiliária. Até então o Fed
praticamente ignorou o superaquecimento perigoso do
mercado imobiliário. Mas, ao
mesmo tempo, pediria que
olhasse com ainda mais atenção. Os preços podem não cair
imediatamente, mas, em alguns anos, quedas substanciais
são risco real para a economia.
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