São Paulo, segunda-feira, 12 de junho de 2006

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ENTREVISTA 1/ROBERT SHILLER

Economia dos EUA pode sofrer pancada

Economista diz que nervosismo do mercado é motivo para preocupação

Autor de "Exuberância Irracional" aponta risco de recessão se preços do petróleo ficarem altos e os dos imóveis despencarem

DE NOVA YORK

O nervosismo das Bolsas é justificado, e a conjuntura atual -as pressões inflacionárias, a alta do petróleo e os ativos superavaliados- é causa para a verdadeira preocupação. Essa é a opinião do economista Robert Shiller, 60, especialista em mercados financeiros da Universidade Yale. O professor defendeu a atuação de Ben Bernanke, presidente do Fed, e apontou um problema conjuntural grave: a continuada "exuberância irracional" no mercado imobiliário, cuja queda de preços nos próximos anos, aliada à alta do petróleo, dará uma pancada na economia americana. As repercussões, naturalmente, serão globais. Mas Shiller também vê um aperto monetário em todo o mundo e um movimento de bancos centrais para administrar esses "riscos reais", mas atentos para não sufocar o crescimento. Mas seu prognóstico para o longo prazo é bom. Considera que Bernanke é inteligente e afinado, apesar de muito criticado recentemente por modificar expectativas de juros, um dos motivadores da fuga de investimentos nas Bolsas, especialmente de emergentes. A seguir, trechos da entrevista.  

FOLHA - O senhor avalia que há uma bolha especulativa hoje nas Bolsas, por isso o abalo?
ROBERT SHILLER
- Essa metáfora ilustra a noção de que pode haver uma explosão repentina e irrevogável. Os investidores são conscientes da possibilidade de bolhas, mas acho que hoje a idéia de que estamos vivendo uma bolha nas Bolsas é pouco proeminente entre investidores. O "crash confidence index" [que mede a confiança no mercado acionário], compilado em Yale, está bastante alto: 58% dos investidores institucionais avaliam que há menos de 10% de chance de uma implosão semelhante às de 1929 e 1987.

FOLHA - O setor imobiliário dá sinais de desaquecimento da economia. Vai ser um pouso forçado ou o que estão chamando de período de transição?
SHILLER
- Eu acho que os preços imobiliários nos Estados Unidos e em outros países estavam muito fortes e vão diminuir no futuro próximo, até despencar em certos locais. Mas uma grande queda vai demorar um pouco. Ajudei a lançar na Bolsa Mercantil de Chicago um mercado de futuros para o setor, e as apostas são de aumento de preços no próximo ano.

FOLHA - O que isso significa? O crescimento continua? Quando vai acabar o boom?
SHILLER
- Os Estados Unidos não vão parar de crescer num futuro previsível, mas pode haver uma recessão. Se o preço do petróleo ficar onde está e o setor imobiliário cair, podemos ver uma forte pancada na economia. Mas, a longo prazo, ainda acho que a perspectiva é boa.

FOLHA - Como podemos avaliar as pressões inflacionárias? São reais, perigosas, iminentes?
SHILLER
- Dados recentes indicam preocupação com a inflação, mas Bernanke está disposto a mostrar que vai lutar contra ela. Ele vai ter sucesso em manter a inflação sob controle.

FOLHA - As falas e medidas recentes dele indicam isso?
SHILLER
- Bernanke é um homem muito inteligente, está muito afinado à possibilidade de a inflação se esparramar e está sob controle de sua missão.

FOLHA - E os mercados? Estão agindo de forma racional?
SHILLER
- Estamos vendo muita volatilidade depois de os mercados atingirem um pico no início de maio. O Brasil está entre os países com as maiores quedas da Bolsa. Mas o fato é que o fenômeno aconteceu em todo o mundo. Parte disso tem a ver com a percepção correta de que os bancos centrais pelo mundo vão apertar o cinto [arrocho monetário]. Outra parte é devido à situação instável mundial, à tensão política no Oriente Médio e à perspectiva de continuada alta do petróleo no futuro, que pode desencadear uma recessão global.

FOLHA - Não houve exagero?
SHILLER
- Não estou certo disso. A situação atual é causa para preocupação real, não há nada de imaginário.

FOLHA - Os juros vão subir ao redor do mundo?
SHILLER
- Juros mais altos provavelmente vão acontecer, mas não acho que essa seja a principal preocupação. É pouco provável que os bancos centrais sufoquem suas economias. A grande preocupação são os mercados de ativos, superavaliados, especialmente o imobiliário em alguns países. O petróleo, as commodities e as perspectivas no Oriente Médio ainda devem piorar tudo.

FOLHA - Se pudesse falar com Bernanke antes da próxima reunião do Fomc, o que diria a ele?
SHILLER
- Daria os parabéns por finalmente incorporar às considerações do comitê a questão imobiliária. Até então o Fed praticamente ignorou o superaquecimento perigoso do mercado imobiliário. Mas, ao mesmo tempo, pediria que olhasse com ainda mais atenção. Os preços podem não cair imediatamente, mas, em alguns anos, quedas substanciais são risco real para a economia.


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