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VOTAÇÃO
Listas de resultados das urnas mostram 49 nomes pelo país
que receberam apoio de um único eleitor no domingo
A incrível história dos candidatos de...1 voto só
ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL
O dramaturgo Nelson Rodrigues certo dia proclamou: não há
pior solidão que a companhia de
um paulista. Se estivesse vivo, talvez reformulasse a frase: a solidão
mais aguda, mais cruel, mais patética é a do sujeito que disputa
uma eleição e arranca das urnas
apenas um voto.
Tome-se a história do carioca
Denis da Silva. Escrivão de polícia, 34 anos, decidiu lutar por uma
cadeira na Assembléia Legislativa
do Amapá, Estado em que mora
desde 1992.
Nunca participara de uma campanha. Ainda assim, o neófito do
PRP brigou como pôde -espalhou "santinhos" e promessas pelas ruas de Macapá. Dizia que, caso o elegessem, iria providenciar
emprego e segurança para "as
classes humildes".
Terça-feira, soube do resultado.
Num colégio de 290 mil eleitores,
ganhou um mísero voto, o dele
próprio. Nem amigos, nem parentes, nem conhecidos de tapinha nas costas. Ninguém lhe deu
crédito.
E os pais do escrivão? Certamente não vivem em Macapá.
"Vivem, claro, e votaram aqui. Só
que não em mim. Tentei convencê-los. Usei um punhado de argumentos verbais e nada. Acredita?"
Como Denis, mais 48 brasileiros
amargaram a solidão eleitoral no
último domingo. A maioria (43)
candidatou-se a deputado estadual. Dos seis restantes, metade
desejava chegar à Câmara, em
Brasília, e outra metade pretendia
virar deputado distrital.
Dezessete Estados abrigam os
donos dos votos únicos. Roraima
lidera a lista, com 11 solitários. O
Amapá surge logo depois, com 6.
Pernambuco e Rondônia dividem
o terceiro lugar: cada um aninha 4.
O escrivão de polícia conta que
a bancarrota nas eleições custou-lhe "uns R$ 1.000". Foi o que desembolsou para confeccionar o
material de campanha. Já o alagoano Sebastião Malta, 54, jura
que gastou, no máximo, R$ 0,20.
Ex-vereador em Maceió, o advogado saiu candidato à Assembléia pelo PT do B. E, jura de novo, não votou nele mesmo.
"Votei em meu filho, Daniel
Malta, do PMN, que também concorria à Assembléia." O motivo:
logo após se inscrever no TRE, Sebastião percebeu que não tinha
chance de se eleger. Resolveu, então, apoiar o filho e abandonou a
própria candidatura.
"Não subi em palanque, não
preparei faixas nem cartazes. Pus
a mão no bolso apenas para pagar
o xérox dos documentos exigidos
pelo TRE. Coisa de R$ 0,20." Imaginou que não receberia nenhum
voto e surpreendeu-se quando a
Folha o procurou.
- Jornalista de São Paulo me
telefonando? É gozação. Trote.
- Não, aqui é realmente da Folha. O senhor conseguiu um voto.
- Consegui nada. Conheço
meu povo, rapaz. Trote dos bons.
Tem gente rindo aí do lado.
Só sossegou depois que anotou
o telefone do jornal e ligou para o
repórter: "Você me desculpe...
Quer dizer que consegui um voto?
Danou-se... É um mistério, viu?".
Daniel Malta tampouco se elegeu. Mas, ao menos, abocanhou
855 votos.
Zezé di Camargo
O pernambucano Marco Maciel
-solitário que também largou a
campanha no meio- atribui a
desistência à "falta de grana".
"Sou homônimo do vice-presidente, sim. Guardo parentesco
longínquo com o homem. Ele é o
Maciel rico. Eu..."
Bancário desempregado e compositor de músicas sertanejas
("220, todas inéditas"), Marco, 34,
almejava se tornar deputado estadual pelo PPS da Paraíba. "Ocorre
que, sem dinheiro, o negócio não
anda. Notei que necessitaria de
muita propaganda. Como não fiz,
pulei do barco e acabei votando
em outro candidato. Não tenho
idéia de onde veio o meu voto."
Sobre o xará famoso, afirma:
"Aquele ali não puxou a mim. Já
nasci cabeludo, por exemplo. Uns
cabelos longos, castanhos, brilhosos. Cabelos de artista. Pareço demais com o Zezé di Camargo. Os
caracteres genéticos dos nossos
rostos são quase os mesmos."
"Candidatura útil. Ouviu falar?"
O engenheiro civil Valter Cunha,
38, lascou a pergunta assim que
atendeu a ligação da reportagem.
Ele buscava uma vaga na Assembléia da Bahia pelo PTC.
"Buscava, não. Só me candidatei porque o partido pediu. Para
causar boa impressão, compreende? Pega mal um partido enfrentar as urnas com número pequeno de candidatos. Denuncia fraqueza." Valter, portanto, concorreu sem concorrer. "Levei um
susto quando descobri que me
deram um voto. Agradeço."
O pecuarista Francisco das Chagas Pereira, 73, ex-prefeito de Alto
Alegre (RR), agradece igualmente. "Mando um muito obrigado
para o João Silva."
Militante do PTC, Francisco abdicou de disputar um posto na
Assembléia de Roraima há poucos dias das eleições. "Avisei os
eleitores e recomendei que mudassem o voto." O lavrador João
Silva, porém, retrucou. "É meu
protegido de anos. Garantiu que
votaria em mim ou em ninguém.
Honrou a palavra, o caboclo."
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