São Paulo, terça-feira, 13 de janeiro de 2009

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JANIO DE FREITAS

Quem está em dívida


Nenhuma razão justificaria a atribulada e ofensiva convocação do embaixador brasileiro no Equador de volta a Brasília

O GOVERNO e, mais ainda, a imprensa, a TV e o rádio brasileiros erraram gravemente em relação ao Equador. O primeiro, por um misto de presunção e incompetência; os outros, por numerosos possíveis motivos que não incluem o equívoco com boa-fé.
O Brasil está entre os quatro países que mais têm questões, como queixoso e como acusado, na Corte de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, sem haver chamado embaixador de volta a Brasília como represália a uma queixa contra ato brasileiro ou como complemento de queixa brasileira. O Equador, convicto de impropriedades diversas em obra e financiamento contratados aqui, não fez mais do que adotar o recurso legal de que o Brasil é praticante emitente, atrás de Estados Unidos, Canadá e Itália entre cerca de 200 países. Nenhuma razão comercial, diplomática, legal ou política justificaria a atribulada e ofensiva convocação, com permanência até agora, do embaixador brasileiro de volta a Brasília.
A reação do governo foi ditada por dois impulsos descontrolados. Um, a pretensa superioridade, que se sentiu desrespeitada pelo pequeno vizinho, sobre o qual, como se dá em relação a Paraguai e Bolívia, em mistura com a solidariedade o Brasil lança olhares de paternalismo neófito. O segundo impulso é ainda mais deplorável: uma satisfação, temerosa e mal pensada, ao aproveitamento da providência equatoriana pelos meios de comunicação brasileiros, contra o "esquerdista" presidente Rafael Correa e contra a aproximação entre ele e Lula, este logo apresentado como o traído. Calote e golpe foram as palavras que caracterizaram a atitude do Equador, e o fazem ainda.
O Equador não sustou o pagamento, em dia, da parcela vencida em setembro de sua dívida no BNDES. Nem dissera que não a pagaria, mas tão só que questiona o valor da dívida e deseja vê-lo reconsiderado na Corte de Arbitragem. Nos três meses seguintes, com o embaixador brasileiro retirado em represália a exatamente nada de ilegítimo ou agressivo, não ficaram "parcelas atrasadas", como diz agora parte do noticiário sobre o pagamento recente pelo Equador. Não poderia haver tais atrasos porque as parcelas são trimestrais, o que fez dos US$ 28 milhões vencidos em dezembro, e quitados, a primeira parcela seguinte aos US$ 15 milhões vencidos e quitados em setembro.
O governo comunica a volta do embaixador brasileiro ao Equador, uma vez que "o Brasil recebeu do Equador as parcelas de dezembro do financiamento do BNDES". Aguardemos que o governo, e em especial o Ministério das Relações Exteriores, demonstre as mesmas disposições em relação a um dos países graúdos, e admirados pelos meios de comunicação, com que o Brasil tem disputa na Câmara de Comércio Internacional.

Prosperidades
A contestação de Lula à previsão das tais consultorias econômicas, que reduzem a 2% o crescimento brasileiro neste ano, talvez erre quanto ao seu próprio otimismo, mas não quanto à direção da crítica. A consultoria mais louvada por comentaristas de economia é a Tendência, de Mailson da Nóbrega, Gustavo Loyola e muitos outros prósperos egressos de governos passados, ouvidos por jornalistas como oráculos.
As comparações das estimativas de várias instituições e consultorias, feitas no início de 2008, com os resultados do ano só revelam catástrofes. E não por causa da crise internacional. A Tendência não se contentou em ser expoente na quantidade de erros em itens pesquisados: todos. Foi exemplar também na dimensão dos erros individualizados.
Se isso não ajudar a entender o que houve com a economia brasileira, ajuda a explicar vasta parte do rebocado jornalismo de economia.


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