São Paulo, quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

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Entidades criticam revisão de trecho que defende aborto

Com fim de apoio à descriminalização, o Brasil vai descumprir compromissos internacionais, dizem ONGs de direitos da mulher

Após pressão da igreja, Lula deverá fazer um documento com a defesa genérica do assunto apenas dentro do contexto de saúde pública


JOHANNA NUBLAT
MARIA CLARA CABRAL

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA Entidades que defendem os direitos da mulher classificaram ontem como "grave retrocesso" a revisão do terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos no trecho de defesa do aborto. De acordo com os grupos, o Brasil vai descumprir compromissos internacionais.
O texto original do decreto dizia que o governo apoiaria "projeto de lei que descriminaliza o aborto, considerando a autonomia das mulheres para decidir sobre seus corpos".
Após pressão da Igreja Católica, o presidente Lula recuou e deverá fazer um documento com uma defesa genérica do assunto apenas dentro do contexto de saúde pública. Pela nova redação que o governo estuda fazer será retirada a parte que fala da autonomia da mulher.
"O governo dá um passo atrás, não se posiciona e deixa de cumprir compromissos internacionais em termos de direitos humanos [Convenção do Cairo e Pequim]", disse Beatriz Galli, assessora de direitos humanos do Ipas Brasil (ONG que promove os direitos reprodutivos da mulher).
Télia Negrão, secretária-executiva da Rede Nacional Feminista de Saúde, disse acreditar que o recuo tem o objetivo de diminuir a pressão de grupos organizados sobre outros pontos polêmicos do decreto, como a comissão da verdade e a união entre pessoas do mesmo sexo.
A ministra Nilcéa Freire (Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres) afirmou, via assessoria, que defende o programa, cuja elaboração acompanhou. Ela coordenou, em 2005, terceiro ano do governo Lula, a instituição de uma comissão para revisar a legislação punitiva que trata do aborto.
Como resultado, um anteprojeto de lei foi encaminhado à Câmara, tornando legal a interrupção da gravidez feita em gestações de até 12 semanas. O texto também permitia o aborto nos casos de fetos com malformação incompatível com a vida e mantinha os casos atualmente previstos na lei -risco de morte da mãe e estupro.
A proposta foi anexada a um dos projetos que tramitam no Congresso sobre o assunto e está parada na Câmara.
"Consideramos o anteprojeto uma proposta ideal", afirmou Kauara Rodrigues, assessora do Cfemea (Centro Feminista de Estudos e Assessoria). "Como está hoje não dá, tem que ter avanços", disse Paula Viana, coordenadora do programa de política das Jornadas pelo Aborto Legal e Seguro.
Diferentemente das entidades, a secretaria especial do governo não vê a revisão do decreto como um recuo.
Segundo Sônia Malheiros Miguel, subsecretária de articulação institucional da secretaria, o governo já se posicionou de maneira favorável à ampliação da possibilidade do aborto, por exemplo, no caso de fetos anencéfalos.
A ampliação do aborto legal também foi aprovada pelo terceiro Congresso do PT, em 2007. Por defenderem posição radicalmente contrária, dois deputados foram pressionados a se retirarem do partido.


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