São Paulo, domingo, 13 de fevereiro de 2005

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BRASIL PROFUNDO

Irmã Dorothy Stang era natural dos EUA e atuava com sem-terra; governo federal aponta ação de fazendeiro

Missionária é morta com 3 tiros no Pará

FÁBIO AMATO
THIAGO REIS
DA AGÊNCIA FOLHA

A missionária norte-americana Dorothy Stang, 73, foi assassinada ontem com três tiros em uma provável emboscada ocorrida numa estrada de terra, localizada no município de Anapu, no Pará, próximo a Altamira (a 777 km de Belém).
A irmã Dorothy, como era conhecida, possuía cidadania brasileira e atuava na região como agente da CPT (Comissão Pastoral da Terra), o braço agrário da Igreja Católica que age em conjunto com trabalhadores rurais em defesa da reforma agrária.
Até o final da tarde de ontem a polícia local tinha poucos detalhes do crime. Segundo informações preliminares, o assassinato teria ocorrido por volta das 13h.
Irmã Dorothy viajava por uma estrada de terra na companhia de dois trabalhadores rurais quando foi atingida pelos tiros, supostamente disparados por pistoleiros. As duas testemunhas não foram feridas e estariam agora sob proteção da polícia.
"As informações que temos até agora nos levam a crer que a morte foi encomendada", disse o comandante da Polícia Militar na região de Altamira, tenente-coronel Waldimilson Godinho.
O local do crime, informou ele, fica em um ponto isolado, em meio a propriedades rurais, a cerca de 30 km do centro de Anapu. A forte chuva que atingiu a região na tarde de ontem teria atrasado ainda mais o trabalho da polícia.
Segundo o comandante, a região há vários anos é foco de um conflito que envolve fazendeiros e grileiros, de um lado, e trabalhadores rurais, do outro. Anapu também é ponto de intensa atuação de madeireiras.
"A irmã Dorothy era uma pessoa muito visada devido à ligação dela com os trabalhadores rurais. Por diversas vezes oferecemos proteção policial a ela, mas ela nunca aceitou", afirmou Godinho. A CPT diz que a religiosa recusou a oferta porque viajava muito e porque não gostava de policiais ao redor dela.
O comandante disse ainda que na semana passada recebeu da Associação Rural de Anapu, que reúne fazendeiros do município, um manifesto contra a atuação da freira na região.
A missionária era acusada de ter financiado a compra de armas para quatro trabalhadores rurais denunciados pelo assassinato do segurança de um fazendeiro no final de 2003. Eles estão presos desde fevereiro do ano passado. Stang respondia a processo por co-autoria no crime.
Segundo a advogada da CPT, Rosilene do Socorro Conceição da Silva, não havia provas contra a missionária. "Era mais uma armação política. Aqui no Estado do Pará, o primeiro processo é criminalizar as lideranças, vinculá-las a um fato criminoso, para que elas perdam a credibilidade diante da comunidade", afirma.

Encontro
Na semana passada, a missionária teve uma audiência com o ministro Nilmário Miranda, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Teria identificado, no encontro, o nome de pessoas que estariam recebendo ameaça de morte na região. Segundo Nilmário disse ontem à Folha, os suspeitos pelo assassinato são conhecidos como Fogoió e Eduardo, e teriam agido a mando de um homem chamado Dinair.
Em nota divulgada ontem, a CPT, por sua vez, afirma que irmã Dorothy foi assassinada por pistoleiros e acusa -baseando-se em dados de "informantes" não identificados- o fazendeiro Dinair Freijó da Cunha, de Anapu, de ser o mandante do crime. A polícia não confirma a suspeita. O fazendeiro não foi localizado pela reportagem no dia de ontem.
Segundo a CPT, irmã Dorothy vinha sendo ameaçada desde que iniciou o trabalho na cidade, em 1997. A missionária pertencia à ordem das Irmãs de Notre Dame de Namur e estava no Brasil desde a década de 1960.


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