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NO PLANALTO
Aos 25, ex-PT redescobre a alegria de viver
JOSIAS DE SOUZA
COLUNISTA DA FOLHA
A idade mexeu com os hormônios do ex-PT. Ele vive,
aos 25, a crise etária dos 40. Traz
na cara aquele jeitão ávido de
quem perdeu muito tempo na vida. Daí ter aceito sem hesitações o
convite do poder para viver novas
aventuras.
Já vão longe os dias em que a esquerda comia criancinhas. O ex-PT prefere agora ser consumido
por velhacos. Reage com naturalidade singular às relações plurais.
Os contatos grupais parecem proporcionar-lhe enorme prazer.
Mesmo quando praticado com
parceiros detestáveis.
Menos enrustido, mais assumido, o ex-PT faz questão de experimentar novas posições. Sobretudo
as posições ideológicas mais exóticas. Entrega-se a elas sem medo
do ridículo. E sem limites à perversão.
Entre estupefacto e extasiado, o
eleitorado de Lula faz fila para espiar através das seteiras. Mas é do
telhado de vidro que se tem o melhor ângulo. Dali, a visão do strip-tease é irrestrita. A parte da anatomia do ex-PT que se revela mais
sedutora é o calcanhar-de-aquiles, assediado por múltiplos e contraditórios interesses.
A atmosfera de volúpia assanhou a indústria da maledicência, único empreendimento a progredir em Brasília. O ex-PT teve
problemas em casa. Superou-os a
muque. Hoje, as discussões entre
petistas diminuíram muito. Na
verdade, mal se falam.
Para preservar a harmonia partidária, evitando novos problemas de relacionamento, o ex-PT
aproveita o jubileu de prata para
organizar uma enquete interna.
Algo que permita ajustar a maleabilidade dos quadris do partido à vontade coletiva de seus filiados.
O questionário está praticamente pronto. O penúltimo esboço,
que ainda precisa ser aprovado
por Duda Mendonça, está assim:
1) O PT fez bem em livrar-se da
esquerda porque:
a) ela não saberia manejar os
talheres em jantares de cerimônia;
b) ela não distingue um bom
borgonha de uma pinga ordinária;
c) na primeira reunião com os
partidos aliados, ela chamaria a
polícia.
2) Do ponto de vista ideológico, o
governo Lula é:
a) não me venha com patrulha
ideológica;
b) não me aborreça com detalhes;
c) melhor submeter a questão a
um grupo de trabalho.
3) A expulsão de petistas rebeldes
é auto-explicável porque:
a) caçadores de bruxas não dão
explicações, só apontam o dedo;
b) qualquer um pode virar bruxa, desde que o caçador aponte;
c) todos -das crianças aos idiotas- entendem de bruxas e caçadores.
4) Os insurretos podem ser reintegrados ao partido desde que:
a) provem que são capazes de
engolir sapos sem sofrer indigestão;
b) prometam não fazer mais
manifestações públicas, a não ser
de apoio;
c) jurem que irão do Congresso
direto para a cama, depois de rezar um Pai Nosso.
5) As barganhas com o PMDB são
necessárias porque:
a) alguém precisa fazer o trabalho sujo;
b) nenhuma outra legenda faz o
mal tão bem;
c) uma mão suja a outra.
6) Os juros não podem cair porque:
a) os banqueiros pegariam em
armas;
b) os bancos não saberiam como
lidar com lucros apenas fabulosos;
c) na era da espoliação sem remorso, usura não é mais pecado.
7) Para mostrar que não é Pedro
Malan, Antonio Palocci deve:
a) entregar tudo ao FMI antes
que ele se atreva a exigir qualquer
coisa;
b) impor aos inspetores do Fundo luz vermelha na alfândega;
c) trocar as fechaduras do Ministério da Fazenda.
8) Lula é claramente melhor do
que o FHC porque:
a) come buchada de bode sem
fazer cara de nojo;
b) cumpriu só dois anos de mandato;
c) lê "Reinações de Narizinho"
no original.
9) O desempenho do governo Lula
é:
a) excelente;
b) excelente;
c) todas as anteriores.
10) Parte da imprensa teima em
criticar o governo porque:
a) é cega;
b) está insatisfeita com o toma-lá-dá-cá, embora o fisiologismo
não tenha aumentado. Continua
nos mesmos 100%;
c) o mau humor do Clóvis Rossi
é incurável.
11) Quando for -obviamente,
sem nenhuma dúvida- reeleito,
Lula deve:
a) comprar um AeroLula reserva;
b) nomear uma equipe de resgate para tentar localizar o PT,
desaparecido desde janeiro de
2003;
c) aproveitar o tempo extra de
ócio para assistir aos discursos de
um velho sindicalista chamado
Luiz Inácio Lula da Silva.
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