São Paulo, segunda-feira, 13 de fevereiro de 2006

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JUDICIÁRIO

Obra é para resgatar projeto de Niemeyer; Procuradoria tenta cobrar R$ 71 mi que teriam sido superfaturados há 15 anos

Alvo de críticas, STJ anuncia 2 novos prédios

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O STJ (Superior Tribunal de Justiça) anuncia a construção de dois novos prédios, a título de "resgatar" o projeto original de Oscar Niemeyer, enquanto o Ministério Público Federal tenta obter na Justiça outro resgate: quer a restituição aos cofres públicos, pela empreiteira OAS, de R$ 71 milhões, o superfaturamento apontado nas obras da monumental sede, entre 1989 e 1991.
Em janeiro de 2005, a Folha revelou que o projeto foi alterado durante a construção, erguendo-se um bloco adicional, sob a alegação de que a nova sede abrigaria até 60 ministros. O tribunal opera até hoje com 33 ministros e, apesar da suntuosidade, tem problemas de espaço interno.
Depois de aditivos nos contratos, pagamentos excessivos e aquisições que violaram a legislação, a sede foi inaugurada em 1995, ao custo de R$ 730 milhões.
Em julho de 2005, uma perícia realizada pela área de engenharia da Procuradoria confirmou "indícios e evidências de práticas ilícitas" apontadas em inspeções feitas pela área técnica do Tribunal de Contas da União em 1993 e 1994. A auditoria levantou a suspeita de um superfaturamento de cerca de US$ 20 milhões.
Aquela auditoria havia sido desprezada pelo plenário do TCU em controvertido julgamento, em 1996, que considerou regulares a licitação e a execução da obra.
A decisão dos ministros do TCU "teve a finalidade de evitar grande constrangimento ao Judiciário", dizem os procuradores da República José Alfredo de Paula Silva e Raquel Branquinho, na ação civil pública para ressarcimento, ajuizada no mês passado. Como os fatos ocorreram há 14 anos, não é mais possível aplicar a Lei de Improbidade Administrativa.
Nessa peça, os procuradores dizem que "os fatos são extremamente graves, sobretudo em se tratando de ilicitudes ocorridas na construção da sede do STJ, cujos integrantes e servidores deveriam pautar-se pela mais rigorosa atuação na gestão da obra".
No julgamento realizado no TCU, em 1996, o Ministério Público que funciona no órgão "reviu drasticamente sua posição". Retificou recomendação que fizera, quando propôs medidas judiciais para a devolução do que foi pago, "com fundamento no enriquecimento sem causa da empreiteira".

As ilicitudes
A inspeção do TCU identificara direcionamento de licitação, preços abusivos e pagamentos duplicados. Sem licitação, a OAS foi contratada para comprar e instalar elevadores, passarelas, sistemas de exaustão de cozinha, conjuntos de poltronas e decoração.
O TCU aceitou um laudo técnico, produzido por uma consultoria contratada pela OAS, baseado em planilha fornecida pela empreiteira. Voto divergente, vencido, propunha perícia pelo TCU.
A OAS ofereceu parecer do advogado Adilson de Abreu Dallari, para justificar a ausência de um projeto básico, como prevê a lei. Dallari sustentou que não se tratava de "simplicidade franciscana", mas de obra cuja licitação foi feita "a partir de um esboço, sobre o qual foram feitos os cálculos estimativos, pois é assim que o renomado artista [Niemeyer] trabalha, detalhando o projeto ao longo da execução". O projeto "arrojado e majestático", como definido na época, não foi localizado nos autos pela Procuradoria. As obras vêm sendo retocadas até hoje.
No início deste mês, o presidente do STJ, ministro Edson Vidigal, disse que as reformas em sua gestão "resgataram" o projeto de Niemeyer e "melhoraram a qualidade do ambiente de trabalho".
"O grande resgate da obra de Niemeyer ainda está por vir", disse o STJ, em nota, ao anunciar a construção de um restaurante, de mil m2 de área construída, e um prédio de cinco pavimentos.
O prédio -que vai abrigar a sede da Escola Nacional de Magistratura e parte do Conselho da Justiça Federal- foi alvo de controvérsia entre ministros do STJ.
Alegando que a obra seria ilegal, o coordenador-geral do CJF, Ari Pargendler, também do STJ, protocolou em março passado representação no TCU, acusando Vidigal de desperdício de dinheiro público. Em nova decisão controvertida, o TCU entendeu que não havia risco de "grave lesão ao erário", porque os recursos sairiam do CJF. O STJ, por sua vez, disse que não se trata de edificação, mas de reforma de imóvel. A representação foi arquivada.


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