São Paulo, terça-feira, 13 de junho de 2006

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Contador diz ter discutido pagamento com ministro

Polícia não investigou declarações sobre envio do dinheiro a um paraíso fiscal

Ministro da Justiça volta a negar ter recebido recursos no exterior em 93 e afirma que somente fez remessas para a Suíça a partir de 1994


RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL

O contador Carlos Roberto Alves, ex-diretor financeiro da agropecuária Ermovale, de Ibaté (SP), afirmou à Polícia Federal em 2003 que tratou com o então advogado dos donos da empresa, Márcio Thomaz Bastos, hoje ministro da Justiça, o pagamento de US$ 4 milhões como honorários advocatícios.
A conversa teria ocorrido em meados de 1993 no escritório do advogado na avenida Liberdade, no centro de São Paulo. Dias depois do suposto encontro, a agropecuária tomou um empréstimo de US$ 4 milhões no banco Excel, em São Paulo, e remeteu o dinheiro ao paraíso fiscal de Liechtenstein, na Europa, onde foram adquiridas ações da empresa offshore Piermont Corporation, cujos donos são desconhecidos.
O depoimento integra o inquérito aberto pela Polícia Federal em 2003 e arquivado no STF (Supremo Tribunal Federal) em 2004. Em cinco entrevistas à Folha na semana passada, o dono da agropecuária, Ivo Morganti Júnior, e sua mãe, Maria Dirce Morganti, revelaram que a remessa ao exterior destinou-se ao pagamento dos honorários de Bastos.
O advogado defendeu ambos da acusação de terem participado do homicídio do pai de Júnior, Ivo Morganti, em fevereiro de 1982. O filho foi absolvido, e a viúva, indultada.
Thomaz Bastos também atuou, segundo o contador, nos processos judiciais que buscaram reintegrar à família o patrimônio bloqueado à época pela Justiça, avaliado em US$ 150 milhões, segundo ele.
Segundo Ivo Morganti Jr., a conta bancária que recebeu o dinheiro foi indicada por Bastos e a operação foi realizada pelo Excel. No inquérito, ele não havia declarado que o destino final do dinheiro era Bastos: dissera que a remessa ao exterior foi uma forma de investimento para proteção do patrimônio da empresa.
Segundo o delegado da PF que conduziu o inquérito, Moacir Moliterno, hoje chefe da Interpol, as declarações de Morganti são "um fato novo", que poderiam levar a Procuradoria da República a pedir um novo interrogatório de Morganti e uma reabertura das investigações. O ministro voltou a negar ontem, por meio de sua assessoria, ter recebido recursos no ano de 1993. Reconhece apenas remessas para a Suíça a partir de novembro de 1994.
No depoimento à PF, o contador Carlos Roberto Alves afirmou que "comentava-se" na empresa, à época da operação financeira, que o total dos honorários de Bastos correspondiam a 20% do total do patrimônio recuperado, ou aproximadamente US$ 30 milhões.
Num primeiro momento, segundo Alves, o advogado recebeu como pagamento dos honorários parte da fazenda Tamanduá, pertencente à agropecuária. Segundo o contador, a escritura da propriedade registrava US$ 3 milhões, mas o preço real era de US$ 12 milhões. Morganti Jr. apontou o mesmo valor ao depor à PF: "Essa fazenda valeria aproximadamente US$ 12 milhões da época".
Segundo o contador, Morganti Jr. decidiu então recomprar a parte da fazenda entregue ao advogado. Segundo o contador, seu encontro no escritório de Bastos serviu para discutir os detalhes do pagamento. "O advogado Márcio aceitava esse pagamento em parcelas, com valor inicial de US$ 4 milhões e o restante em parcelas", disse ele à PF.
Alves disse ter comentado detalhes da operação com seu amigo, o vendedor de imóveis Carlos Umberto Pereira. Em depoimento, o vendedor disse ter ouvido de Alves que o destino real do dinheiro foi registrado num cartório do Uruguai, numa declaração assinada pelo contador. A PF não pediu ao Uruguai nenhuma busca oficial para localizar o documento.


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