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Lei de país civilizado não serve ao Brasil, afirma juiz
Ao se corrigir, De Sanctis declara que "quis dizer que não somos país de Primeiro Mundo"
Na CPI dos Grampos, juiz
da Operação Satiagraha
diz que medo de grampo é "folclórico" e defende escuta por tempo indeterminado
MARIA CLARA CABRAL
HUDSON CORRÊA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Em depoimento ontem à CPI
dos Grampos da Câmara, o juiz
Fausto Martin De Sanctis, responsável por autorizar as prisões da Operação Satiagraha,
afirmou que não adianta aprovar no Brasil lei de país civilizado porque esse "país não é".
"Temos que fazer uma lei
adequada ao nosso país. Não
adianta querer fazer lei de país
civilizado porque esse país não
é." De Sanctis, que deu a declaração ao defender realização de
interceptações telefônicas por
tempo indeterminado, tentou
se corrigir em seguida: "Quis
dizer que não somos um país de
Primeiro Mundo".
Para o juiz, o limite para escutas previsto em projeto do
governo pode dificultar investigações que requerem mais
tempo. A proposta, enviada em
abril ao Congresso, prevê que o
prazo de duração da quebra do
sigilo não exceda 60 dias, prorrogáveis por iguais e sucessivos
períodos, por, no máximo, 360
dias. O presidente Luiz Inácio
Lula da Silva já determinou que
ministros viabilizem a votação
do projeto no Congresso. A lei
atual não prevê tempo máximo
para a duração dos grampos.
Segundo De Sanctis, o medo
de interceptações é "folclórico"
e favorece a impunidade. "Todo
mundo acha que está sendo
monitorado, o que é isso? É
uma síndrome do pânico, vamos parar com isso! Isso é folclórico, é uma tentativa de acabar com o que está funcionando, isso é um factóide", disse.
O juiz defendeu a independência da Polícia Federal ao comentar o afastamento do delegado Protógenes Queiroz da
Operação Satiagraha. "Acho
que a PF precisaria ser independente. Às vezes, delegados
são afastados sem muito questionamento", afirmou De Sanctis, que rejeitou proposta do
presidente da CPI, Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), para que a
sessão de ontem fosse fechada.
Ele jogou a responsabilidade
sobre o vazamento de informações para as operadoras de telefonia. "É sobre elas [teles] que
deviam cuidar para termos um
controle mais rígido, porque o
vazamento está acontecendo
por meio delas. Se querem aprimorar a legislação, não é limitando [o grampo] a 360 dias."
De Sanctis também negou
que haja um exagero nas autorizações de escutas. Segundo
dados levantados por ele, dos
842 inquéritos em andamento
na 6ª Vara Criminal Federal de
São Paulo, da qual ele é titular,
apenas 21 foram contemplados
com interceptações telefônicas, o que representa 2,43%.
Ainda durante depoimento à
CPI, o juiz negou que tenha autorizado a instalação de qualquer tipo de escuta no STF (Supremo Tribunal Federal) para
monitorar o presidente Gilmar
Mendes. Em meio à Operação
Satiagraha, Mendes recebeu
denúncia de que seu gabinete
teria sido monitorado pela PF a
pedido do juiz. "Em nenhuma
hipótese, cogitei ou admiti monitorar qualquer pessoa com
prerrogativa de foro, leia-se:
desembargador do tribunal ou
ministro do STF. Nunca fiz isso
e nunca farei. Essa é a verdade,
acreditem ou não", afirmou.
De Sanctis disse que recebeu,
após decretar pela segunda vez
a prisão do empresário Daniel
Dantas, uma telefonema da vice-presidente do TRF (Tribunal Regional Federal) da 3ª Região em São Paulo, Suzana de
Camargo Gomes. "Ela tomou
conhecimento por parte do ministro [Mendes,] de que, segundo versão dela, estava realmente irado. Ele tomou isso como
um ato pessoal, o que não foi."
Depois da decisão, Mendes
mandou soltar Dantas pela segunda vez. "Ligações de desembargadores para saber sobre
um caso concreto não têm
ocorrido", disse o juiz afirmando que não aceita tentativa de
interferência. Ele, porém, não
acusou a desembargadora de
interferir na operação.
Perante os deputados, o juiz
defendeu o uso de senhas pelas
autoridades policiais, que dão
acesso aos dados cadastrais e
também ao histórico de ligações dos clientes de telefonia.
"A polícia precisa saber quem
está ligando e, por isso, ela pede
senhas para saber o histórico e
quem está ligando. Se houver
reiteradas ligações para o suspeito, a polícia pode fazer novo
pedido de interceptação dessa
nova linha", declarou.
De Sanctis disse que os deputados não "podem e não devem
alicerçar seus pensamentos em
matérias jornalísticas alarmistas que fazem propiciar a todos
um sentimento equivocado de
instabilidade e terror".
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