São Paulo, quinta-feira, 13 de agosto de 2009

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JANIO DE FREITAS

A pretexto da fumaça


Não há motivo nenhum para substituir a restrição ao fumo por formas de repressão, em determinações legais e ações

A ASSEMBLEIA DE Minas segue a Assembleia do Estado do Rio que seguiu a decisão de São Paulo, e este encadeamento rápido sugere que a proibição de fumar excita muitos ânimos, como toda repressão mínima ou grossa, mas as diferenças entre as medidas não atenuam as evidências de que contêm mais volúpia autoritária do que critérios apropriados.
Fumar não é, em si mesmo, atitude antidemocrática. Suas inconveniências sociais são considerações recentes e não incorporadas ainda aos costumes, ou ainda são menos, digamos, naturais do que o longevo fumo. Por fim, fumar não é ato de má-fé ou de hostilidade ao vizinho, é uma sujeição do viciado à sua necessidade. Não há motivo algum, portanto, para substituir a restrição, atenta e inflexível que seja, por formas de repressão, nas determinações legais e nas ações.
As notícias dão conta de que donos de lugares públicos são visitados e fumantes são caçados em São Paulo como não se invadem prostíbulos de exploração de mulheres, nem se caçam os exploradores; ou em casas de jogo, ou em pontos de venda e consumo de crack pela gurizada e de outras drogas por toda parte. Os envolvidos nesses atos serão menos perniciosos à vida social do que os fumantes? O dono de um bar paulistano que não consiga impedir um freguês de fumar, a não ser por tentativa que termine em caso policial, será ele o transgressor da lei. Sempre o dono ou responsável pelo local, não o fumante. Que ponderação há nisso?
A Assembleia do Estado do Rio quis corrigir o desequilíbrio e distribuiu a responsabilidade com punição financeira para os dois lados. Mas só os muito bem assalariados têm condições de pagar as multas fixadas. Aos demais fumantes punidos ficará a inscrição na dívida ativa, com todos os aborrecimentos que daí podem decorrer.
São poucos mas, suponho, suficientes exemplos do espírito aplicado ao que seria a saudável extinção progressiva do fumo. São os métodos deste país tão dado a violências e desatinos, onde o usuário de drogas é reconhecido como vítima de vício, e não punido; o de cigarro fica ameaçado até de perder o emprego "por justa causa".

Sequestros
Por falar em repressão, as consequências policiais/judiciais de um protesto em frente à casa da governadora Yeda Crusius, em Porto Alegre, foram trazidas da ditadura, sem retoque. Além da violência sempre preferida pela polícia gaúcha, os manifestantes presos estão submetidos a inquérito até por formação de quadrilha e por sequestro.
O pretexto é que, durante a manifestação, o neto da encrencada governadora não pôde sair para a escola. Yeda Crusius considerou o impedimento, por ela deduzido e não declarado pelos manifestantes, semelhante ao de certas quantidades de dinheiro que a tornam denunciada e objeto de manifestações.

Pelo lucro
Enquanto se avoluma nova fase de denúncias contra a Igreja Universal do "bispo" Macedo -o que, na televisão e suas adjacências, se deve à subida da TV Record- a Net e a Sky impingem a seus assinantes, sem pedido nem a consulta prevista no Código de Defesa do Consumidor, mais e mais "pastores" e "igrejas". Na hora do alto lucro, com o aluguel de longos horários, o conflito é esquecido.
Um dos "pastores" impingidos pela Net e a Sky agora vende passagens aéreas em meio às orações e "milagres com a visita de Jesus Cristo", para que os fiéis tenham mais esse meio de "ajudar a igreja" com as comissões. É um modo, afinal, de fazer o céu entrar de fato nos negócios da fé.


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