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São Paulo, segunda-feira, 13 de outubro de 2003

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OBRAS PÚBLICAS

Verbas públicas eram repassadas a empresas vencedoras de licitações irregulares feitas no início dos anos 90

Justiça suspende contratos de prefeituras

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Licitações irregulares abertas durante o governo de Fernando Collor de Mello (1990-1992) foram usadas por várias prefeituras durante o governo Fernando Henrique Cardoso para dar aparência legal a contratos de obras públicas sem licitação, o que é vedado pela legislação.
Os efeitos dessa promiscuidade entre empreiteiras e prefeituras se estenderam ao governo Lula e ainda não foram inibidos porque a CEF (Caixa Econômica Federal) alega não poder sustar o repasse de recursos em convênios entre municípios e órgãos federais.
Na última sexta-feira, a Justiça Federal determinou à Caixa Econômica, em liminar, o bloqueio de repasses em contratos firmados com órgãos federais pelo atual prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena (PSDB), no total de R$ 34,3 milhões.
Ex-secretário de Políticas Regionais do governo FHC, Lucena aproveitou uma licitação ganha em 1991 pela construtora Coesa -empresa do grupo OAS- para firmar, a partir de 1998, doze convênios sem abertura de licitação.
Segundo o MPF (Ministério Público Federal), "tal procedimento engenhoso importa clara violação da ordem jurídica e dos princípios constitucionais da administração pública, notadamente os da legalidade, moralidade, igualdade e do dever de licitar".
Os contratos e convênios envolviam, entre outros órgãos, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano da Presidência da República (atual Ministério das Cidades), o Ministério do Esporte e Turismo, a Embratur e a própria CEF.
No início de setembro, o procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, solicitou ao controlador-geral da União, ministro Waldir Pires, uma auditoria nos contratos e convênios firmados pela Prefeitura de João Pessoa.
"Aguardo a auditoria com tranquilidade", diz o prefeito Lucena (ver entrevista). A OAS e a Coesa não quiseram se manifestar.
Levantamento realizado pela Folha na Justiça Federal e no TCU (Tribunal de Contas da União) identificou irregularidades semelhantes em 12 contratos firmados pela Coesa nos municípios de Várzea Grande e Rondonópolis (ambos em MT), Bauru (SP), Granja e Cedro (CE), Lagarto e Tobias Barreto (SE), Camaçari (BA) e São Mateus (MA).
Entre os vícios localizados pelo MPF e pelo TCU, foram revelados superfaturamento, conluio entre prefeitos e empresários, obras contratadas sem publicação de edital, desvio de recursos, pagamentos antecipados, depósitos feitos a empresas não contratadas e pagamentos de obras não previstas.
O bloqueio dos repasses ao município de João Pessoa foi pedido pelos procuradores da República Antônio Elídio Teixeira, Fábio Nóbrega, Werton Costa e Duciran Farena. No ofício a Fonteles, eles revelam que o contrato ganho pela Coesa não tinha objetivo definido. Previa apenas a execução de "obras de infra-estrutura urbana em diversos bairros de João Pessoa", no prazo de 300 dias a partir da primeira ordem de serviço.
Ou seja, não eram especificados os serviços nem definidos os locais das obras -não havia projeto básico, uma exigência legal.
Por meio de alterações nos contratos, foram prorrogados os prazos, ampliados os serviços e elevados os valores pactuados. Com apenas um pequeno escritório em João Pessoa, a Coesa, na prática, ainda tem a exclusividade para executar qualquer obra de infra-estrutura no município.
Posteriormente, a partir de instrumentos particulares permitidos pela prefeitura, a Coesa fez cessões parciais de serviços às construtoras Cojuda, Plena, Conort e Link.

Situação irregular
Segundo o MPF, a Coesa e as quatro outras empresas não podem contratar com o poder público, porque estão em situação irregular perante o fisco. A Cojuda e Conort, principais beneficiadas, têm uma mesma pessoa como gestor, conforme procurações públicas juntadas aos autos.
Foram encontradas outras situações de dispensa de licitação, com base naquela licitação de 1991, envolvendo verbas federais, estaduais e municipais.
No último dia 22 de setembro, Lucena assinou decreto vedando "terminantemente" a realização de aditivos "com o escopo de elastecer ou majorar o prazo de validade de qualquer dos contratos de cessão ou aditivos anteriormente firmados e decorrentes do contrato nš 03/92 [com base na licitação de 1991]".
Segundo o MPF, com esse decreto, o município "reconhece a ilegalidade do procedimento utilizado por vários anos". Mas a medida foi considerada insuficiente, "porque permitiu a continuidade dos contratos ilegais".



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